A volta dos que não foram

Por Gazeta Admininstrator

Esta, com certeza, não é a primeira fase de dificuldades econômicas por que passam os Estados Unidos. Por consequência, está longe de ser a primeira ou última crise enfrentada pelos imigrantes , incluindo, a comunidade brasileira.

Com a mesma certeza, sabemos que a fase vai passar. Não tão rápida quanto os menos informados esperam, não tão demorada quanto os pessimistas apregoam.
O que irrita mais do que a própria “fase” ou “crise”, como os fatalistas adoram rotular, é o culto à depressão, a religião do derrotismo e sua irmã mais feia, a mentira que é repetida à exaustão, na esperança que se torne “verdade”.

Na semana passada tive chance de falar com uma querida amiga e figura histórica de nossa sociadade brasileira nos Estados Unidos, sobre um desses fenômenos “fofoqueiros” que assolam a nossa comunidade neste momento de algumas justificadas incertezas.
Dizia-me Beth Mangabeira que corre à boca miúda, de Port Saint Lucy a Key West, de Doral a Miami Beach, de Sunny Isles a Weston e Coral Springs, que haveria uma “onda” de retorno em massa de brasileiros para o Brasil.

Não foi a primeira vez que, nas últimas semanas, essa conjectura chegou até meus ouvidos. Não há, absolutamente, qualquer “tendência” ou “êxodo inverso” que caracterize “retorno em massa” de brasileiros à terra natal.
Essa vontade persiste e persistirá, é claro, no coração da maioria dos brasileiros. A nossa ligação afetiva com o Brasil é enorme e indestrutível. Mas, com o passar dos anos, e com o crescimento e amadurecimento da comunidade brasileira, essa “saudade instalada” passou a ser administrada de uma forma mais lógica. Ou seja. Ama-se o Brasil, sempre. Vive-se na América, cada vez mais.

Da mesma forma que se diz que tem “um monte de gente voltando”, se fala em “surpreendente aumento de incidentes criminais” ou “notícias de falecimentos” em nossa comunidade. E certamente a tal da “crise” tem muito pouco a ver com isso.
Como é natural em nós, seres humanos, não prestamos atenção a fatos simples, óbvios e que explicam com muito mais lógica e naturalidade o que acontece com a nossa comunidade em terras norte-americanas.
De 1987 para 2007 a comunidade brasileira nos Estados Unidos saltou de pouco mais de 50 mil pessoas para mais de 2 milhões de residentes (não importa qual seja a cor dos seus Cards).

Nestes 20 anos, a troca de informações dentro da própria comunidade brasileira evoluiu de 4 incipientes jornais, um em New York, um em Miami, um em Boston e um em San Francisco, para quase 160 mídias impressas em 26 cidades de 14 estados.
A informação da comunidade para a comunidade, que era feita de forma heroicamente amadora, indisciplinada e imprecisa, se profissionalizou, tornando-se um importantíssimo elemento de integração e representatividade da própria comunidade.

Nada mais lógico portanto do que encarar dois fatos:
1 - Numa população 20 vezes maior é lógico que sejam registrados 20 ou mais vezes o número de incidentes, crimes, mortes e também....mudanças. Mudanças que posso assegurar pelo acesso que tenho às empresas especializadas no ramo, ocorrem muito mais de um estado para outro dentro dos Estados Unidos do que de volta para o Brasil.
2 – Com a multiplicação de veículos de comunicação e aumento extraordinário do alcance desses veículos, a notícia isolada se propaga geometricamente, gerando uma idéia, muitas vezes, desproporcionalmente maior do que a realidade. Coloque aí, como “tempero”, essa extraordinária capacidade que temos em “contar um conto e aumentar um milhão de pontos”. Faz parte do folclore.

Mais do que nunca, grandes corporações do Brasil desembarcam aqui, após longas e caras pesquisas que apontam para essa permanência do imigrante, para servir à nossa comunidade, apostando num mercado que, em 1987 era literalmente “zero” e, hoje, tem como indicador reluzente o envio de mais de $8 bilhões anuais em remessas para o Brasil.

Essa “volta” de brasileiros para o Brasil sempre existiu. Há uma pequena parcela dos que não se adaptam. Aí incluídos os que não conseguem nem passar da primeira fase de rejeição absoluta a um país onde as leis funcionam. Há uma parcela estatísticamente insignificante, mas que gera bochicho, de profissionais e estudantes que já vieram para cá com data marcada para voltar. E há os que desistiram, por razões diversas, de morar nos Estados Unidos, um grupo estatisticamente insignificante para ser apontado como “tendência”.

Quem vive na comunidade brasileira nos Estados Unidos como nós vivemos, sabe que a consolidação de nossa presença neste país já passou da fases iniciais. Pelo contrário. Estamos na fase das associações de classe, da busca pela representatividade política e pela demarcação de nosso espaço cultural na “Salada Yankee”.

Portanto, os alarmistas e boateiros que mudem de discurso.

Volta mesmo, só dos que não foram.