Adriana Nogueira: Amor "in progress"

Por Adriana Tanese Nogueira

Vejo casais em busca de si mesmos: temerosos de estragar uma amizade ao começar a relação que, entretanto, está já evidente entre eles. Vejo maridos traindo suas mulheres ciberneticamente por tédio e por vazio existencial, não por falta de amor por elas. Vejo homens deixando as mulheres que amam profundamente por não aguentarem o desafio e preferirem se envolver em relações mornas e superficiais. Vejo casais se separando após 30 anos de casamento porque, afinal, não havia intimidade, mas o “tem que ser”. Vejo mulheres histéricas deixando seus homens loucos e estes baixando a cabeça e aguentando... nem eles sabem o porquê. Vejo mulheres encontrando o homem perfeito e convencerem-se na marra que não o amam. (De Khalil Gibran, Sobre o Amor)

Mas, se no vosso medo, buscais apenas a paz do amor, o prazer do amor, então mais vale cobrir a nudez e sair do campo do amor, a caminho do mundo sem estações, onde podereis rir, mas nunca todos os vossos risos, e chorar, mas nunca todas as vossas lágrimas.

Amar é difícil. Conectar-se ao outro é um desafio. Uma relação é um projeto, não um dado que se conquista uma vez por toda e pronto. É cuidar do jardim, dia após dia. Vincular-se é assumir o fardo, transformá-lo juntos, vencer juntos.

Quando o amor vos fizer sinal, segui-o; ainda que os seus caminhos sejam duros e difíceis. E quando as suas asas vos envolverem, entregai-vos; ainda que a espada escondida na sua plumagem vos possa ferir.

Amar é o oposto do que aparece nos comerciais: não é um produto que vai te fazer feliz, é um processo que pode te dar muitos momentos de felicidades na medida em que você está disposto a se engajar em um work in progress que vai durar a vida toda, e que começa por e com você. E quando vos falar, acreditai nele; apesar de a sua voz poder quebrar os vossos sonhos como o vento norte ao sacudir os jardins. Porque assim como o vosso amor vos engrandece, também deve crucificar-vos E assim como se eleva à vossa altura e acaricia os ramos mais frágeis que tremem ao sol, também penetrará até às raízes sacudindo o seu apego à terra. Como braçadas de trigo vos leva. Malha-vos até ficardes nus. Passa-vos pelo crivo para vos livrar do joio. Mói-vos até à brancura. Amassa-vos até ficardes maleáveis. A saúde de um casamento se mede pela saúde individual dos dois, ao quadrado. Quanto mais resolvido internamente cada um está, melhor será o resultado, ou seja, mais cumplicidade, intimidade, paz, harmonia e alegria. Quando um ou ambos se recusam a serem transformados pela relação, o resultado é negativo, ao quadrado. Então entrega-vos ao seu fogo, para poderdes ser o pão sagrado no festim de Deus.

Transmutação e revelação, revirar-se como uma luva, do avesso – ou talvez para o lado certo? Sempre, em todas as relações estamos em processo de aprendizado e autodescoberta em primeiro lugar. Abraçar o processo permitirá que a relação se desenvolva tanto para terminar logo, se assim for o caso, como para desabrochar se este for seu desígnio.

Tudo isto vos fará o amor, para poderdes conhecer os segredos do vosso coração, e por este conhecimento vos tornardes o coração da Vida.

Aceitar nosso sentimento é sempre um ato de humildade. Humildade do ego, da “razão” que precisa aceitar que o “coração tem razões que a razão não compreende.” (Blaise Pascal)

E não penseis que podeis guiar o curso do amor; porque o amor, se vos escolher, marcará ele o vosso curso.