Adriana Nogueira: Somos o que nossas relações fizeram de nós

Por Adriana Tanese Nogueira

tulip-1320559_1280 - Copy

Nossa identidade é a consequência de uma série de relações, começando pelas mais importantes, a com a mãe e, logo em seguida, a com o pai. A forma como nossa personalidade, tendências e atitudes inatas são moldadas, encontrando desenvolvimento ou frustração, depende exclusivamente das relações nas quais crescemos. Nós somos relação.

Desde recém-nascidos vivemos inseridos numa teia de vínculos. As pessoas a nossa volta se relacionam conosco num determinado modo e este modo se torna o modelo para nos relacionarmos com os outros e, sobretudo, com nós mesmos, porque a forma como lidamos com nosso mundo interior (pensamentos, sentimentos e emoções) é o reflexo de como os adultos lidaram com o que pensamos e sentimos. A forma como interpretamos o que acontece com a gente e os papéis que exercemos são o resultado de como fomos “educados”, ou seja, das interpretações e dos papéis que os outros nos deram.

É verdade que cada um nasce com sua individualidade única. Entretanto, como essa realidade interior irá se manifestar depende diretamente das relações nas quais crescemos e das quais nos nutrimos.

Vejamos um exemplo: quando o adulto não dá importância ao que a criança sente, esta criança aprendará a desconsiderar o que ela sente e a se sentir “errada” e “culpada” por sentir o que sente. E vice-versa. Quando o adulto dá importância ao que a criança manifesta, esta aprendará a entender-se e não se sentirá “deficiente” por ter algo dentro “que não vale”, porque estará vivenciando seu pai ou mãe valorizando o que ela sente.

O padrão das primeiras relações da nossa vida é geralmente repetido na vida adulta, isso porque ele representa a única referência que possuímos. Com o tempo, a racionalidade se sobrepõe e mascara a realidade interior dos sentimentos. Assim, se chega a acreditar que “somos diferentes”, “fazemos certo” e etc. Até o momento em que entramos numa relação e após os primeiros tempos descobrimos que estamos no mesmo padrão antigo, repetindo os mesmos papéis e nos sentindo da mesma forma... Descobrimos que há como uma marca d’água interna que nos molda nos relacionamentos.

O que fazer? Em primeiro lugar, desisitir de fingir. Já é um bom começo. Cair na (nossa) real e começar a encararmos o que de fato sentimos, queremos, pensamos abaixo da camada plastificada que mostramos ao mundo e ao nosso espelho todas as manhãs. Significa aceitar-se e começar a cuidar de nós. Sem dramas e desesperos, simplesmente cuidar e conhecer. Entender o que está acontecendo com nós. Como poderíamos, sem um trabalho de auto-conhecimento, “desmanchar” a marca d’água interna e mudar de modelo de relação? As relações que temos fazem o que somos, mudanças reais em nós se refletem nelas, os outros são atingidos e criamos um ambiente melhor ou pior conforme o que projetamos nele. Enfim, temos poder de transformação, é só sabê-lo enxergar.

Através dos relacionamentos podemos construir grandes coisas ou destruir coisas preciosas, cabe a nós. Mas, como nós somos tanto os idealizadores quanto os fazedores, é preciso que não só saibamos ter boas ideias (e pensamentos corretos) como que tenhamos também os instrumentos para a realização da tarefa. De nada adiante ter o projeto sem mãos para realizá-lo ou pior tendo mãos que seguem outra agenda.