Com alta do dólar, empresas locais sentem queda nas vendas para brasileiros

Por Marisa Arruda Barbosa

marcos de paula - manchete

Enquanto por um lado se fala que turistas brasileiros ainda estão atingindo recordes  de gastos no exterior (que em julho chegou a $2,214 bilhões de dólares em relação a $2,010 bilhões de dólares em julho de 2012), companhias locais que têm lucrado com as compras dos brasileiros não podem dizer o mesmo. Com o dólar no Brasil beirando os R$2,35 no fim da tarde do dia 28 (tendo chegado a R$ 2,45 dias atrás), algumas companhias locais têm sentido a queda nos gastos dos brasileiros ao longo dos últimos dois meses. Enquanto para alguns a queda é natural com a chegada da baixa temporada, outros veem a alta do dólar no Brasil como sinal de maus tempos para os negócios.

Marcos De Paula, dono da locadora de carros em Miami, Arrow Rent a Car, tem sentido com o cancelamento “monstruoso” de reservas. Esta semana, ele foi ao Brasil para abrir uma empresa e poder parcelar as reservas no cartão de crédito. Assim, seus clientes fecham os alugueis em reais, sem precisar pagar o IOF (Imposto Sobre Operações Financeiras aplicado pelo governo brasileiro em operações de câmbio). Agora, Marcos abriu uma empresa e uma conta no Banco do Brasil e pode financiar em até 10 vezes, como fazem outras empresas de turismo. “Esta foi a forma que encontramos para poder aquecer as vendas nesta época de dólar nas alturas”, diz ele.

A empresa de Marcos teve aproximadamente 60% das reservas canceladas. “O motivo alegado é a alta do dólar, instabilidade e a cobrança de IOF na conta de cartão de credito”, disse ele. “O único turismo que, em minha opinião, não foi afetado, foi o de negócios e os que vêm para os EUA para comprar e abastecer pequenos comerciantes com roupas e eletrônicos, coisas baratas. Este turista aluga carros em três ou quatro pessoas, sempre um modelo barato e passa geralmente quatro dias para compensar o valor de bilhete aéreo”. Supérfluos O gerente Robert Nunes, da Sunglass USA, disse que em julho a expectativa era de que as vendas fossem excelentes, tanto no atacado como no varejo, mas não foi. Segundo ele, houve uma queda de 15% nas vendas para brasileiros em julho deste ano em relação a julho do ano passado.

“Óculos e relógios são produtos de luxo e são os primeiros a serem cortados se a pessoa está com um orçamento mais apertado para a viagem”, disse Robert, que é gerente das lojas Sunglass USA em Miami e da Optimystik, em Miami e no outlet Sawgrass Mills. “Quem comprou pacotes e passagens continua vindo, mas todos estão vindo com um orçamento mais apertado. Minha irmã, por exemplo, vem todo o ano mais ou menos em outubro. Este ano eles estão pensando em não vir por causa do preço do dólar”.

Gustavo, da loja que opera pelo Facebook “A Lojinha Miami”, que comprava encomendas em  Miami para revender no Brasil, disse que agora as viagens não estão compensando. “Há dois anos, gastava R$ 18 mil para comprar $10 mil dólares e, hoje, me custa R$ 25,5 mil para comprar os mesmos $10 mil dólares, mais 6,38% que pagamos de IOF sobre as compras no cartão de crédito”, disse ele.

“Onde um produto ‘x’ me custava R$ 15, hoje custa R$ 25, sendo que vendo pelo mesmo preço que antes”.

Companhias de turismo

As companhias de turismo local ainda não estão se sentindo tão afetadas pela alta do dólar no Brasil. Almir Couto, dono da agência New Lake Tours, em Orlando, diz que ainda não sentiu muito com a alta do dólar, já que muitos turistas brasileiros já pagaram com antecedência. “Quem vem, vê os gastos daqui quando chegar, mas o hotel, carro e ingressos para os parques já estão pagos”, disse Almir. “Esta semana, inclusive, já fechamos serviços para novembro, dezembro e janeiro e os brasileiros estão correndo para fechar pacotes com nossos orçamentos anteriores. Mas é claro que dá medo, pois se, por acaso, o dólar continuar aumentando, haverá uma queda no movimento”.

Já Mário Magalhães, da Mariana Tours, em Miami, acha que a baixa no turismo desse momento não tem nada a ver com o aumento do dólar, e sim com a baixa temporada. “Todo ano é assim e ocorre uma queda natural no número de viagens”, disse ele.

Realmente, os brasileiros não estão cancelando viagens, mas evitando despesas extras. O carioca Flávio Melo, da empresa Connection Services, em Orlando, pensa que o movimento em julho deste ano foi como um mês qualquer. “Julho é geralmente um mês que deve valer por três”, disse ele, que trabalha com serviços a turistas há nove anos, incluindo transporte, aluguel de casas de temporada e transportes de grupos. “Claro que quem comprou ingressos para parques, alugou casa ou reservou hotel, já tinha isso pago, mas o brasileiro está evitando os gastos extras, idas aos shoppings que não tenham sido planejadas, etc”.

Um grupo com o qual Flávio trabalha há algum tempo é de adolescentes em excursões. “Eu sempre os levara ao shopping, lojas de instrumentos, etc, mas esse ano, tive uma queda nesse serviço de 75%. Os adolescentes estão vindo com o dinheiro contado para comprar algo planejado, como um eletrônico, algo assim”, disse Flávio. “A queda em geral para serviços extras como esses, de outros grupos de brasileiros, foi de 50% em relação ao ano passado”.

Queda na procura por pacotes internacionais no Brasil

As viagens de brasileiros para o exterior correspondem, em média, a 30% das vendas das operadoras brasileiras, e a metade do faturamento. Segundo as entidades do setor, ainda não há números que mostrem o comportamento da indústria de viagens desde que o dólar começou a subir mais expressivamente, em meados de maio.

A agência Tour House, que comercializa em maior volume pacotes para o exterior, já está sentindo o baque. “Normalmente temos 20 cotações diárias. Nesses últimos dias, esse número caiu para umas quatro. Minha leitura é que com a subida do dólar e, principalmente, enquanto houver essa instabilidade, vai diminuir o número de viajantes para o exterior”, disse ao “G1” essa semana o presidente da empresa, Carlos Prado.

Ele afirma que está negociando com fornecedores um acordo para diminuição da margem de lucro, para reverter parte da retração.

De acordo com outra empresa, houve uma diminuição de 10% na procura para pacotes internacionais, principalmente para os EUA, e um aumento de 20% na procura de pacotes domésticos. Em julho, a venda de destinos dentro do país teve um aumento de 68% em comparação a julho de 2012, continuou o “G1”.

Outras empresas dizem que a procura não foi afetada. É o caso da CVC, que afirma que as variações “não chegam a interferir nas vendas de pacotes, visto que os consumidores costumam planejar a viagem ao exterior com antecedência e preferem absorver essas diferenças no parcelamento”. Segundo a operadora, nas férias de julho Miami e Orlando, por exemplo, tiveram crescimento de 26% na procura em comparação com o mesmo período de 2012.

Para Leonel Rossi Jr., da Abav, o que mais assusta os consumidores é o dólar instável, e não a alta em si. “As pessoas não fecham negócio no momento, mas quando a moeda estabiliza, mesmo que num patamar maior do que era, elas se acostumam e vão viajar”.