Apenas 16% das denúncias de abuso sexual infantil são investigadas no Brasil

Por Gazeta News

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[caption id="attachment_161614" align="alignleft" width="332"] Não há política eficiente que proteja as crianças. Imagem ilustrativa: pixabay.[/caption] A falta de controle consistente e padronizado em nível federal, estadual ou municipal no Brasil que acompanhe quantas denúncias sobre abuso sexual infantil são procedentes, quantas se tornam inquéritos policiais, quantas chegam à Justiça ou o que aconteceu posteriormente com as crianças. Atualmente, somente 16% das denúncias são investigadas, segundo levantamento divulgado pela BBC Brasil. Ao buscar o percentual de denúncias de violência sexual contra crianças que resultavam em abertura de inquérito e possível punição de culpados e também informações centrais sobre crianças reportadas como vítimas em denúncias, para saber se estão em segurança, foi constatado um verdadeiro buraco negro de informações e descontrole estatístico por parte das autoridades, afirma a reportagem. A falta de uma entidade específica que reúna todas essas informações de denúncia e posterior investigação e conclusão do caso. Como no Brasil, as suspeitas são passadas individualmente para serem investigadas pelas polícias estaduais ou por outras autoridades, os casos são repassados e, em tese, investigados. Só há retorno sobre o andamento da apuração em 16% dos encaminhamentos na média, segundo o Ministério dos Direitos Humanos. Não há uma regra que obrigue quem recebeu as denúncias a dar retorno. A falta de dados centralizados prejudica o combate - já que o primeiro passo para criação de políticas públicas contra o crime é saber o tamanho do problema, como ele costuma acontecer, se há maior ocorrência em determinados Estados e que questões, em alguns casos culturais, precisam ser combatidas em busca de uma solução. No Brasil, a primeira pergunta sem resposta diz respeito ao total de denúncias de violência sexual contra crianças que chegam a diferentes autoridades. Elas podem chegar a delegacias de polícia (especializadas ou não), ir direto ao Ministério Público, a conselhos tutelares ou a Varas de Infância e da Juventude. Casos envolvendo crimes virtuais são investigados pela Polícia Federal. Não há números consolidados de número de denúncias feitas no país todo por nenhum desses caminhos. As suspeitas também podem chegar pelo Disque-Denúncia e serem encaminhadas a algum desses outros canais. Só por este caminho chegaram cerca de 9 mil denúncias no primeiro semestre de 2017. Em 2016, foram 15.707. Os dados são do Ministério dos Direitos Humanos, que mantém o serviço do Disque 100. "É muito difícil pensar políticas públicas sem ter dados e estatísticas", afirma o pesquisador Herbert Rodrigues, que foi associado ao Núcleo de Violência da USP e é autor do livroPedofilia e suas Narrativas. "Os dados sobre o assunto são um caos. Os órgãos não estão preparados para lidar com o problema", afirma ele, que fez uma extensa pesquisa em diversos bancos de dados para sua tese de doutorado. Rodrigues defende que o poder público tenha um sistema exclusivo para monitoramento de abuso sexual infantil a exemplo do que ocorre em países como os Estados Unidos e o Reino Unido. Nos EUA, diversas entidades reúnem esse tipo de informação. O Departamento de Saúde federal tem um escritório específico de cuidado às crianças que publica relatórios periódicos. O Crimes Against Children Research Center (Centro de pesquisa sobre crimes contra crianças) também reúne dados nacionais - e o acompanhamento das denúncias é feito pelo FBI, a polícia federal americana. Dados Em 2016, o sistema de saúde registrou 22,9 mil atendimentos a vítimas de estupro no Brasil. Em mais de 13 mil deles - 57% dos casos - as vítimas tinham entre 0 e 14 anos. Dessas, cerca de 6 mil vítimas tinham menos de 9 anos. As estatísticas são do Sinan, o sistema de informações do Ministério da Saúde, que registra casos de atendimento de diferentes ocorrências médicas desde 2011. O sistema consolida dados tanto dos serviços de saúde pública quanto da rede privada. "Crianças e adolescentes de até 14 anos são mais vulneráveis à ocorrência de estupro principalmente na esfera doméstica. Os autores da violência, na maioria das vezes, são familiares e pessoas conhecidas", afirma a médica Fátima Marinho, da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. A definição de estupro utilizada pelo Ministério da Saúde é a mesma adotada no âmbito penal. São notificados como estupro, por exemplo, conjunção carnal, masturbação, toques íntimos, a introdução de dedos ou objetos na vagina, sexo oral e sexo anal. O levantamento apontou também a falha do sistema judiciário e executivo andarem juntos para julgar a denúncia e punir o agressor. Muitas vítimas adultas já não denunciam seus casos à polícia por medo de represálias ou de serem desacreditadas, as crianças estão ainda mais vulneráveis.