“Band-Aid” ou Oportunismo? -Editorial

Por Carlos Borges

Barack Obama

O que uma eleição não é capaz de fazer? Passaram-se três anos em que o assunto “reforma imigratória” foi tratado ora com total descaso, ora com a leviandade e hipocrisia que caracteriza o “pragmatismo oportunista” do Estado norte-americano com relação aos imigrantres indocumentados.

Tem sido anos em que, por cima da crise econômica, desemprego e perseguições diversas, o “sonho americano” tão propalado, se tornou de fato um pesadelo para milhões de ilegais, entre os quais, dezenas de milhares de brasileiros. Na esteira da campanha de pré-candidatura dos republicanos, já houve até quem acenasse com um formato “band-aid” para a questão imigratória, como forma de atrair o voto dos latinos em favor do eventual candidato republicano a enfrentar Obama.

Como tem acontecido em diversas áreas, desde novembro de 2011, a administração voltou a falar do tema, e Obama acaba de propor uma mudança na legislação atual que pode resultar em uma redução do tempo de espera dos imigrantes pela aprovação de um perdão federal.

A ideia, segundo os porta-vozes da Casa Branca, é “evitar que imigrantes ilegais saiam do país e fiquem separados de seus cônjuges americanos e de suas crianças, enquanto tentam ganhar status legal nos Estados Unidos”.

A preocupação é justa e bem-vinda. Só que chega atrasadíssima, quando milhares de crianças, cidadãos norte-americanos legais, já foram forçados a deixar o país, junto com seus pais. A “ esperança” de que seus casos fossem resolvidos em semanas ou poucos meses, se transformou em permanente exílio. A histórica premissa da “unificação das famílias” valia apenas como discurso, e ponto final.

Atualmente, muitos imigrantes ilegais continuam sendo obrigados a deixar o país diante da possibilidade de uma deportação - caso não cumpram a ordem de sair a espera da aprovação do perdão – e, assim, ficam impedidos de entrar nos Estados Unidos legalmente por até 10 anos. A duração da interdição depende de quanto tempo eles viveram nos EUA sem permissão.

A proposta feita por Obama visa, segundo ele, “impedir que a burocracia deixe famílias separadas por muito tempo”. Iria deixar filhos e cônjuges de cidadãos próximos e a resposta poderia ser esperada em solo americano. Apenas quando aprovado o perdão, o imigrante iria a seu país de origem para o processo de visto. O que demoraria alguns dias contra a longa espera atual. Em tempo: o processo atual dura em média 12 meses. Mas frequentemente vai muito além disso.

O governo recebe cerca de 23 mil aplicações deste tipo e em 2011 uma grande parcela foi reprovada. Com a nova proposta do governo, o processo levaria, em média, seis meses e, neste período, o imigrante permaneceria legalmente em solo americano.

Desde o ano passado, o governo vem tentando reverter casos de imigração que eram considerados politicamente graves. Para isso, a secretária de Segurança Interna, Janet Napolitano, admitiu que cerca de 300 mil casos pendentes de deportação seriam revistos.

Um programa piloto para analisar cerca de 12 mil casos pendentes foi lançado em novembro, em Baltimore e Denver, e termina na próxima semana. A revisão deverá se expandir para outras jurisdições ainda este ano.

Sem querer tirar o mérito da proposta do presidente, é entretanto, impossível não relacionar esta e outras iniciativas ao fato de estarmos já em plena e efervescente campanha eleitoral presidencial, onde todas as energias conservadoras dos Estados Unidos parecem marchar para “derrotar Obama a qualquer preço”. E o voto dos latinos (mais de 25 milhões de eleitores) é uma das “moedas” mais valiosas no atual mercado eleitoral norte-americano.

Se, oficialmente, a proposta do presidente Barack Obama é sua primeira tentativa real de reverter a política imigratória do país, fica pairando no ar se tal iniciativa, cercada pelo oportunismo político, teria alguma chance de ser aprovada em um Congresso de oposição hostil a qualquer coisa que o presidente democrata se proponha a fazer. A lógica dos republicanos é não dar nenhum “trunfo” político a Obama.

O presidente , ninguém nega, tem comandado o país em um dos mais difíceis momentos das últimas décadas. Mas seu silêncio na questão imigratória deixou uma mácula de frustração e inconformidade. Nos palanques de 2008, quando fez do slogan “Change” o mote de sua avassaladora vitória, Obama listava a reforma imigratória como uma de suas prioridades de governo.

A medida já provocou a ira de alguns republicanos. O deputado Lamar Smith, do Texas, acusou o presidente de “colocar os imigrantes ilegais à frente dos americanos”. Imigrantes que não têm antecedentes criminais e apenas violaram as leis de imigração podem ser beneficiados, caso a medida seja aprovada.

É o caso de se dizer “antes tarde do que nunca” , mas não há que se esquecer de que a seriedade de um político se mede (ainda que sejam raros os que assim se comportem) pelo cumprimento da palavra e dos compromissos. Não se esperava que Obama aprovasse por conta própria a reforma imigratória. A ele não é dado esse poder.

Mas teria que agir com os imigrantes, como agiu com os gays, quando forçou a barra e conseguiu extinguir a abominável política do “Don’t ask, don’t tell”.