Como se não bastasse o estresse sob o qual vivem milhares de famílias de indocumentados brasileiros no Sul da Flórida, ainda na expectativa de uma solução jurídica definitiva para suas vidas na América, surgem, eventualmente, situações que, apesar de amparadas na Lei, são reflexos da intolerância e do sentimento anti-imigrante que existe em setores da sociedade norte-americana.
Estamos convivendo, desde o final da semana passada, com o “Episódio Brookfield Gardens”, um conhecido condomínio misto de unidades para compra e para aluguel, e que, como quase todos os condomínios em Deerfield Beach, abriga muitas famílias de imigrantes, entre os quais, brasileiros.
A “carta-bomba” enviada aos inquilinos pede que eles deixem seus imóveis o mais rapidamente possível, caso não possam comprovar seus status imigratório. A carta, de forma inédita e inusitada, acena com a possibilidade de denúncia à Imigração para que esta venha, de porta em porta, checar a documentação dos residentes.
Abuso
Abuso de poder? Talvez. Recomendo a leitura da matéria publicada pelo Gazeta nesta edição, página 15.
O fato é que, segundo depoimentos de experts, o Condomínio teria direito de cobrar a apresentação dos documentos, casos estes sejam especificamente exigidos nos contratos de locação ou compra & venda. Mas esses mesmos experts alertam para o fato de que os inquilinos, sejam residentes legais ou não, têm amplo direito de defesa e de questionar a cobrança e as ameaças feitas através da infame “carta-bomba”.
Por trás desse espisódio que, aos olhos do leitor que não reside no Brookfield Gardens, pode parecer um fato isolado, há a verdadeira “ponta do iceberg”.
Legalização
Parece que, a cada dia, fica mais evidente para a sociedade norte-americana que não haverá solução e nem paz dentro do país se não for feita uma ampla, geral e quase irrestrita legalização dos, hoje assumidos, 16 milhões de indocumentados no país.
Essa constatação, que começa a ser refletida nos discursos dos candidatos à sucessão de Bush, em 2008, se, por um lado, agrada aos que são favoráveis à legalização, irrita profundamente os que desejariam ver os imigrantes deportados ou “despejados” fora da América.
Toda conquista, seja de direitos, territórios ou emancipações vem, via de regra, através de luta. Obstinação e firmeza é o mínimo que se exige de quem deseja, de fato, transformar em direito legal o que vem sendo conquistado com sangue, suor e lágrimas no dia-a-dia da vida nos Estados Unidos.
Em vez de criticar a condenável reação revanchista e cruel de quem não se importa em desabrigar famílias, a título de “cumprir a lei”, que tal termos a coragem de enfrentar esse sentimento anti-imigrante com o próprio remédio usado por eles? A Lei.
Sim, a Lei é o que faz os Estados Unidos serem o país que (ainda) são. Apesar dos O.J. Simpson da vida (desculpem leitores, mas a simples menção do nome desse cidadão, me enoja), o “saldo” da Justiça norte-americana é dos melhores.
Via de regra, se ouve as partes e se decide pelo que manda não apenas a letra fria da Lei, mas o bom senso de quem adapta a Lei à realidade dos fatos e à evolução dos cosutumes e sistemas.
É buscando na Lei a sua própria defesa que os imigrantes, indocumentados ou não, irão dar a resposta da forma plena e adequada aos que fazem do sentimento anti-imigrante um lenitivo perverso de suas frustrações.
É recorrendo ao que a Democracia norte-americana representa e tipifica, que todos os que aqui estão colaboram, não apenas para resolver seus proble-mas pessoais mas sim, pela afirmação do ideal que, na maioria dos casos, foi o que motivou cada um de nós a estar aqui.

