Churrasquinho de Imigrante - Editorial

Por Carlos Borges

Desculpem a barbárica ironia do título. Mas o jeito como o nível das propostas republicanas com relação aos imigrantes indocumentados, às vezes é melhor fazer piada. Porque não podem mesmo ser levadas a sério.

O debate promovido pela rede de televisão CNN na última terça-feira, revelou ainda com mais intensidade, o altíssimo grau de crueldade e falta de bom senso que ronda os senhores e senhora que estão pretendendo dirigir o país mais rico e mais influente do mundo.

Amarrados de corda a uma “aparência de ideologia” que está se tornando religião fanática entre os republicanos ultraconservadores, os postulantes Rick Perry, Mitt Romney, Michelle Bachmann e Herman Cain desfilaram propostas no mínimo bizarras – para não dizer, algumas delas de inspiração nazista – para enfrentar a imigração ilegal.

O “muro da vergonha” que vinha sendo erigido na fronteira entre México e Estados Unidos, passaria a ser uma prioridade para todos os candidatos. Michelle Bachmann garante que fará um “muro duplo”. Rick Perry investiria 30 bilhões de dólares nele. Romney, querendo parecer menos radical, “apenas” reforçaria o quadro atual, que já é dos mais degradantes.

Mas a pérola da noite foi mesmo o “Obama da direita”. Herman Cain, que havia dado um entrevista anteriormente ao jornalista John King (da própria CNN) defendendo a colocação de uma cerca eletrificada no topo de um muro que separaria definitivamente o México, dos Estados Unidos.

No debate, Cain ao tentar “consertar” a infeliz declaração, ele piorou o quadro ao definer sua resposta como “uma piada”. O recado está mandado: para ele, a questão dos imigrantes ilegais se enquadra em dois extremos.

Absoluta crueldade, propondo “eletrocutar” os eventuais transgressores, ou simplesmente fazer piada de uma trágica condição de milhões de famílias.

O delírio pelo poder, o vale-tudo eleitoral, repleto de mentiras, falsas promessas, frases de efeito, gestos teatrais e um enorme vazio de inteligência e dignididade, parece ser atualmente a única “cara” da política norte - americana.

Como uma criança mimada que, da noite para o dia, está tendo que enfrentar uma crise, os norte-americanos se deparam com uma das faces mais cruéis do capitalismo selvagem: a própria selvageria política, refletida na classe política, nos postulantes a presidente de um país que ainda dita as regras e molda os conceitos no planeta.

Os Estados Unidos que poderiam construir cercas eletrificadas para evitar a passage dos imigrantes ilegais, é a mesma nação que levou a farsa comunista à derrocada? O mesmo país que fez da queda do muro de Berlim um símbolo de um novo tempo para o mundo?

Os Estados Unidos que negam sistematicamente uma solução humana, digna e racional a 12 milhões de imigrantes indocumentados, é o mesmo país que fica policiando as nações que julga serem infratoras dos direitos humanos?

Houve um tempo em que nenhum político norte-americano, mesmo aquele de visão mais curta e retrograde, teria pelo menos vergonha em propor a “fritura em massa” de quem quer que seja.

Será mesmo que temos que encarar o fim da ideia de que a Democracia e o senso ético desta nação deram lugar a um ridículo “reality show” de políticos-vedetes que se preocupam apenas em alimentar o circo dos horrores de uma opinião pública manipulada pela imprensa-tabloide?

Assistir ao debate de terça-feira entre os postulantes à candidatura republicana na corrida para suceder Obama, me deixou a impressão cada vez mais clara que, se houver um mínimo de melhora que seja na economia do país, Obama será reeleito.

Sim, reeleito nem tanto pelos próprios méritos, porque Obama é, em muitos aspectos, uma proposta frustrada pela realidade de um convulsionado contexto mundial.

Mas reeleito pela absoluta idiotice e falta de bom senso, falta de conteúdo e legitimidade, dos que ambicionam seu lugar.

O Partido de Ronald Reagan, que, com sua extraordinária visão, libertou milhões de imigrantes ilegais, uparece mesmo ter se transformado em um circo patético de ideias esdrúxulas, propostas-impacto e nenhuma seriedade.

Ator por ator, pelo menos Obama não é canastrão. Mesmo sendo o presidente que, em 3 anos de mandato, deportou 400 mil ilegais, ainda é alguém que se distancia ao máximo da horrenda ideia de resolver o problema dos imigrantes através do hediondo espetáculo do “churrasquinho de ilegais”.