Comentando sobre a internet, a escrita e a fala

Por AOTP

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Fernanda Sevarolli Creston Faria*

Falar de internet nos remete necessariamente ao advento da globalização que permitiu que pessoas comuns ao redor do mundo pudessem se comunicar em uma velocidade impar e, na atualidade, os contatos rápidos e quase ilimitados têm causado mudanças reais nos relacionamentos, nas pessoas, na maneira de ser e de viver, etc. Não seria diferente com a fala e com a escrita, não é mesmo?!

Antes da internet e da globalização, a língua já sofria com os inúmeros fenômenos sociais que nos circundam, tais como comunidades de fala, gírias, conflitos sociais, juventude, revoltas, etc. Quando dizemos que a língua sofre certas alterações, nos relacionamos às mudanças não catalogadas em gramáticas ou dicionários, mas sim aquelas que são legitimadas pelas pessoas, pela fala.

Isso ocorre e ocorreu durante anos sem nenhum regulação ou registro. Com a curiosidade de alguns pesquisadores, com o passar dos anos, os registros começaram a ser feitos e algumas mudanças sazonais de fala integraram à escrita, posteriormente à gramática.

Quem não conhece o famigerado exemplo do pronome ‘você’, que de ‘vossa mercê’, passou a ‘vossemecê’, depois a ‘vosmecê’, depois ainda a ‘vosmincê’, ‘vassuncê’, ‘vancê’, ‘mecê’, ‘ocê’, ‘cê’ (Gonçalves p. 2537, 2015).

Ou seja, a língua muda, acompanha a evolução e sistema social vigente, bem como os poderes que se inserem neles, personalidades, grupos e etc.

Com a chegada da internet e a globalização se fixando com força total, a língua veio a sofrer ataques massivos e preocupantes para muitos estudiosos e gramáticos.

Aqueles que defendem a gramática tradicional tiveram verdadeiros surtos ao reconhecerem na internet e nos novos meios de comunicação, uma espécie de assassinato da língua portuguesa, como assim comentam.

Abreviações bizarras, quase um dialeto a ser traduzido ou mesmo decifrado. Os jovens se utilizam cada vez menos da norma culta e criam jargões e abreviaturas novas, uma economia de fala que assusta pesquisadores, muitos afirmam.

Acreditamos que alguns distúrbios tenham chegado junto com a internet sim, mas será que só surgiram problemas? Não houve nenhum ganho de fato?

Ao observar os jovens, mesmo que em momentos furtivos na net, como dizem, podemos afirmar, sem estudo científico que comprove, que nunca o jovem leu ou escreveu tanto. O que os falta é um direcionamento nesta leitura e no uso que fazem da escrita da net.

Agora, afirmar que a internet destruiu a língua ou a empobreceu, seria o mesmo que dizer que o fenômeno de mudança da língua com a passar do tempo e com as influências de cada época e lugar também o fizeram. Lembram-se do exemplo do você mais acima? Pois é, foi uma deturpação da língua? Falha irremediável? Ou uma adequação aquele momento e lugar?

Outro fator a se levar em conta e que utilizamos todo o tempo e há muito tempo é o reconhecimento da língua como mutacional a usos, pessoas e ambientes. Sabemos como nos portar em um ambiente formal, informal, parental, etc., ou seja, a língua segue o rumo que damos a ela e não o oposto, portanto, classificar a internet como vilã que destrói a língua seria o mesmo que negar a evolução em todos os sentidos, mudanças estas que, inevitavelmente, a língua também sofre.

*Graduada formada em Letras (UFJF), especialista em Práticas de Letramento e Alfabetização (UFSJ), especialista em Planejamento, Implementação e Gestão da EAD (UFF) e mestranda em Gestão e Avaliação da Educação Pública (CAED/UFJF). Professora do sistema de ensino do estado de Minas Gerais e do sistema privado de ensino, além de tutora EAD (Pedagogia/UAB/UFJF).