Como garantir a aposentadoria no Brasil e nos Estados Unidos?

Por Marisa Arruda Barbosa

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Embora os Estados Unidos seja o país onde vive a maioria dos brasileiros no exterior, o Acordo Bilateral de Previdência Social assinado entre o país e o Brasil, em junho de 2015, ainda não entrou em vigor, dificultando o acesso à aposentadoria para aproximadamente 1,4 milhão de brasileiros (44,5% dos residentes no exterior, de acordo com o Ministério das Relações Exteriores).

No acordo, que se encontra em trâmite no Congresso Nacional, brasileiros poderão juntar o tempo de contribuição nos dois países e receber em um só, caso tenha contribuído em ambos. Isso beneficiaria muitos imigrantes brasileiros que não possuem período de cobertura suficiente para atender aos critérios de aposentadoria nos EUA, mas que já tenham tempo de contribuição no Brasil.

“Na maioria das vezes, brasileiros não recebem aposentadoria nem em um país nem em outro, somente se completam o tempo de contribuição separadamente em algum dos dois países, sem utilizar qualquer tipo de acordo”, explica Eduardo Koetz, advogado especialista em direito previdenciário. “A não ratificação do acordo é um grave impedimento para a concretização de direitos sociais dos brasileiros que vivem nos EUA. Praticamente a América Latina e Europa inteiras possuem acordos com o Brasil, enquanto nós estamos esperando. Os EUA já têm acordos com a maioria dos países da América Latina também, mas o brasileiro está esperando. Por quê?”, indaga.

Em seu livro, "Direito Internacional Previdenciário na Era Pós Globalização”, Koets defende que a legislação brasileira não difere o trabalho prestado no Brasil e no exterior em nenhum momento, “e por isso o trabalhador brasileiro, mesmo vivendo e trabalhando ilegalmente no exterior, deve ter cobertura pela previdência social brasileira”, explicou o advogado, que já conseguiu vitória em alguns casos para que brasileiros que trabalharam ilegalmente no exterior conseguissem a aposentadoria. “Conseguimos alguns casos que pagaram facultativo na época, enviando o dinheiro para o Brasil e pagando com ajuda de um parente. Quanto aos autônomos em atraso, que voltaram para o Brasil depois, estamos com algumas decisões favoráveis, mas os processos não chegaram ainda ao final. Acreditamos que será bem possível que se aceite essa tese”.

Outros acordos

No momento, o Brasil tem acordo com o bloco Iberoamericano, Mercosul, e acordos bilaterais, ou seja, feitos com apenas um país, como: Alemanha, Bélgica, Cabo Verde, Canadá, Chile, Coreia, Espanha, França, Grécia, Itália, Japão, Luxemburgo e Portugal. Além dos EUA, o Brasil tem acordos pendentes com a Suíça e com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

A incerteza da imigração

Um caso muito comum que acontece entre os brasileiros no exterior e que afeta sua aposentadoria é o período de incerteza que passam ao chegar aos EUA. Muitas vezes, a demora com o visto, ou mesmo para que um negócio prospere, acaba afetando o planejamento a longo prazo da aposentadoria.

Esse foi o caso de R.M., que preferiu não ter seu nome divulgado por questões de privacidade. Assim que chegou a Sarasota, em 1999, logo começou a trabalhar em um posto de gasolina, no qual ganhava por volta de $7 dólares por hora. Embora tenha contribuído desde o início para o Social Security, o valor sempre foi baixo. Ao longo dos anos, R.M. mudou de emprego várias vezes, entregou pizza, foi gerente de restaurante, tentou abrir o próprio negócio e sempre contribuiu, com exceção de alguns anos.

“Quando completei 62 anos, em outubro de 2008, recebi uma carta do Social Security dizendo que eu já poderia me aposentar, pois já havia atingido a idade mínima de 62 e o tempo de contribuição mínimo de 10 anos. O valor da aposentadoria era assustador (algo em torno de $280 dólares mensais). Então, fui conversar com a minha contadora, que me perguntou se eu declarava as gorjetas que recebia entregando pizza, o que não fazia. Ela me sugeriu declarar as gorjetas, o que diminuiria um pouco o meu “pay check” quinzenal, mas valeria a pena, pois o sistema te permite ‘fazer pontuação’ até os 70 anos de idade, mas depois disso o valor da aposentadoria se congela. Feita uma projeção, concluímos que se eu aguentasse trabalhar até os 70, poderia me aposentar com uns $900 dólares”.

R.M. trabalhou até os 68 anos e hoje recebe $786 dólares por mês. Já no Brasil, ele não teve a mesma sorte. Dos 23 anos de contribuição ao INPS, ele tem 9 registrados em sua carteira de trabalho. Os outros 14 foram feitos através de carnês na época. No entanto, os carnês foram destruídos pelo tempo, e R.M. não conseguiu provar o mínimo de 15 anos para receber a aposentadoria no Brasil. Caso o Acordo Previdenciário já tivesse entrado em vigor, ele poderia adicionar esses 9 anos ao tempo de serviço nos EUA.

“O importante é a pessoa definir logo se pretende ter a vida aqui ou no Brasil e, a partir daí, procurar um conselheiro financeiro para fazer um planejamento. O tempo de contribuição é algo que você não pode mudar, mas o quanto você contribui todo mês e o tipo de previdência que você escolhe pode fazer uma grande diferença”, destaca a conselheira financeira Claudia Fehribach, que atua na Five Rings Financial, também colunista do GAZETA.

Autônomos

Em geral, as empresas deduzem um valor de cada pagamento do empregado, que é destinado ao Social Security e Medicare. Mas quem é autônomo deve se informar se, ao pagar o imposto de renda anualmente, está pagando pela aposentadoria também. O site do Social Security (ssa.gov) dá a possibilidade para que qualquer pessoa crie uma conta online para controlar o próprio futuro e checar o quanto já contribuiu até hoje.

Aposentadoria aqui e lá

Ao contrário de R.M., Elizabeth Mangabeira, de 71 anos, tinha a documentação do Brasil em dia e não teve grandes dificuldades de conseguir o benefício lá. Hoje, ela recebe aposentadoria nos dois países.

“Quando completei 62 anos, queria me aposentar aqui nos EUA, mas descobri que somente com 65 poderia ter o Medicare”, disse ela, que vive nos EUA desde os 35 anos e é uma das sócias da importadora All Brazilians.

Já no Brasil, onde trabalhou no Banco Itaú, ela pediu sua aposentadoria aos 60 anos, mas raramente traz o benefício para os EUA e acaba usando quando visita o país.

“Aqui nos EUA, vejo que tudo custa caro ao longo da vida até você começar a ser beneficiado pelo Medicare – e no meu caso também o Medicaid (os sistemas de saúde do governo). Parece que realmente é uma recompensa”.

Assim como Elizabeth, V.S. recebe aposentadoria nos dois países.

“No Brasil, trabalhei com carteira assinada por cerca de 25 anos e aqui por 15 anos, aproximadamente”, relata ela, que preferiu não ser identificada .

Além do Social Security, V.S. reinvestiu o que conseguiu acumular de seu 401K (um plano oferecido por empresas no qual eles cobrem até um certo percentual o valor que o empregado decide poupar). Hoje, ela vive desse investimento mais a aposentadoria do Social Security.

“Eu recebo um pouco mais de 40% do meu último salário, mas em compensação o seguro saúde complementar que é descontado da minha aposentadoria é excelente e cobre basicamente todos os exames rotineiros e até casos mais complicados que tive de saúde”, relata V.S. “O Medicare cobre 80% do tratamento. O plano complementar, que o Medicare não cobre, mas deduz do meu cheque do Social Security, é o CarePlus. Uma benção!”.

Atestado de vida pode ser feito no Consulado

Na última semana V.S. precisou ir até o Consulado-Geral do Brasil em Miami para fazer o atestado de vida, provando assim que está viva para continuar recebendo o benefício no Brasil. Quem recebe aposentadoria no Brasil e tem residência no exterior, precisa comparecer todo o ano ao Consulado. (http://miami.itamaraty.gov.br/pt-br/atestado_de_vida.xml)

previdencia.gov.br.