Contaminação dos riscos

Por Gazeta Admininstrator

Ninguém discute atualmente que o mundo globalizado tornou a interligação entre países e pessoas algo muito mais próximo. Hoje, em um simples clicar de botão, é possível saber o que ocorre do outro lado do planeta, como ocorreu recentemente com a divulgação da morte de Osama bin Laden, o terrorista mais procurado pelas forças de segurança dos Estados Unidos. As redes de TV americanas não se cansam de dar detalhes do que ocorreu na cidade do Paquistão onde o procurado número 1 do FBI (Polícia Federal dos EUA) foi cercado e morto por membros da SEAL, a tropa de elite de militares da Marinha americana.

O júbilo pela operação bem-sucedida tomou conta dos EUA e contaminou moradores de outros países que formam a OTAN (aliança entre países ocidentais do Atlântico Norte), sobretudo onde foram registradas ações terroristas como foi o caso da Inglaterra e da Espanha. Entretanto, a contaminação nem sempre é de felicidade ou de alegrias. Na maioria das vezes, aliás, a palavra contaminação está associada a efeitos negativos e a riscos.

Nas ciências econômicas, os riscos sistêmicos foram caracterizados como os riscos de colapso inesperado de um mercado ou de um sistema econômico inteiro, em decorrência da falha ou da instabilidade de um de seus componentes em particular. Esta instabilidade do sistema, ou seu colapso, constitui-se nesta visão como uma consequência catastrófica e rápida da profunda interconexão e interdependência dos seus componentes: efetivamente a alteração de um componente, em um sistema profundamente conectado, gera, por efeito cascata, uma alteração significativa de todo sistema, o qual poderíamos qualificar de nova ordem, ou de novo equilíbrio dinâmico.

Obviamente, a noção econômica de risco sistêmico pode ser expandida, à luz da teoria da complexidade, a todos os sistemas dinâmicos (físicos ou sociais) que demonstram características de hiperconectividade e extrema sensibilidade à alteração da dinâmica de suas partes: sistemas em equilíbrio dinâmico em relação à interdependência de suas partes. Entre tais sistemas, encontramos logicamente as cadeias ecossistêmicas (o meio ambiente, como um todo, é um equilíbrio dinâmico), e os sistemas sociais (nos quais a própria sociedade humana é, logicamente, uma instância particularmente relevante).

Não somente a natureza dos riscos maiores parece estar mudando como também o contexto no qual estes aparecem, e a capacidade da sociedade em gerenciá-los. As forças que provocam estas mudanças são muitas e diversas. Por exemplo, as condições climáticas aparecem como sendo cada vez mais extremas. A densidade populacional nos centros urbanos e a concentração da atividade econômica em certas regiões estão aumentando, tornando estas áreas mais vulneráveis. A globalização sob todos os aspectos – econômico, tecnológico, cultural, ambiental – está crescendo rapidamente e ampliando a interdependência, de tal modo que permite a vírus perigosos, poluentes e falhas técnicas mais facilidade em se espalhar. Recentemente, constatamos o efeito do tsunami na Usina Nuclear de Fukushima no Japão e as graves consequências na população, na economia e na cadeia de produção de alimentos japonesa.

Em uma sociedade cada vez mais descentralizada e baseada no mercado, a ampla promoção da tomada de consciência do risco e da capacidade de reação está tornando-se um pré-requisito, do mesmo modo que o vasto envolvimento na prevenção de risco.

Em seu recente livro intitulado Freefall, Joseph E. Stiglitz esclarece: "Durante a crise imobiliária americana de 2008, uma das razões pelas quais o sistema financeiro teve um desempenho tão ruim no gerenciamento de riscos está no erro cometido pelo mercado na precificação e no julgamento do risco. O ‘mercado’ errou grosseiramente na avaliação dos riscos de inadimplência nas hipotecas subprimes e cometeu um erro ainda maior ao confiar nas agências de classificação de risco e nos bancos de investimento, que reempacotaram suas hipotecas subprimes e deram cotação AAA aos novos produtos".

Isso, evidentemente, colocou em risco a credibilidade das agências classificadoras de riscos. Elas continuam a ser merecedoras de crédito, ou países, órgãos mundiais e empresas já questionam os critérios usados por estas agências para determinar os graus de riscos e de segurança? Evidentemente, por mais que preguem isenção em suas análises, as agências empregam pessoas e estas, por sua vez, carregam consigo suas idiossincrasias e suas maneiras de pensar. Isto acaba refletindo-se na determinação de grau de risco para as análises. O mesmo fenômeno se repete entre os analistas individuais, sem contar a possibilidade de haver algum tipo de "incentivo" para falar bem de um determinado país em detrimento de outros a fim de atrair investimentos que ajudam no desenvolvimento.

Diante disso, a conscientização do risco depende de um exercício constante para que as pessoas despertem para a necessidade de proteção. Ignorar o risco é o maior risco de todos. Normalmente, o problema não é o risco em si. Mas, sim, de quão preparado você está para enfrentá-lo. Quais são as consequências para os acontecimentos que podem vir a ocorrer e para aqueles outros que, com certeza, ocorrerão? O que está sob o seu controle e o que não está? Quem depende de você e de quem você depende?

Essas são perguntas que devem estar em sua mente sempre que você deparar com notícias sobre lucros mirabolantes ou de recuperações econômicas milagrosas. Desconfiar, precatando-se, sempre é a melhor maneira de manter os riscos controlados, para evitar que eles contaminem todo o sistema. Até porque remediar sempre é mais difícil (e custoso!) do que evitar.