A custosa saga de um casal gay para ficar legalmente junto

Por Marisa Arruda Barbosa

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Tudo pareceu fluir muito bem quando o brasileiro Robson Coccaro e o americano Sean Gibbons se conheceram online, em 2007. Sean foi até o Brasil, onde se conheceram pessoalmente e conforme as viagens entre Brasil e EUA se intensificaram, iniciou o drama do casal gay e binacional em relação à imigração americana. O passaporte italiano facilitou a vida de Robson para entrar nos EUA, mas não impediu que fosse questionado várias vezes pela Imigração ao entrar no país, dada a frequência que entrava e saía dos EUA.

Sean era vice-presidente de uma empresa de produção de eventos em Miami, e Robson, cantor e tinha uma banda no Rio. O carioca vivia da música, produção de eventos musicais e completava o orçamento com aulas de inglês, de canto e traduções. “Logo, começou a fazer mais sentido que eu me mudasse para os EUA pra que pudéssemos continuar juntos. Eu poderia seguir cantando, agenciando artistas e produzindo música, inclusive, para os clientes de Sean”, disse Robson. “Parecia que estávamos vivendo um sonho com tantas possibilidades e muita disposição pra realizarmos projetos em comum”.

Mas, na realidade, esse sonho não parecia tão fácil. “Nosso relacionamento não nos dava direito à nada, a pedir nada, a sonhar com nada”, disse Robson.

O casal não tinha muitas opções e precisou de muita criatividade para permanecer junto. A primeira ideia foi que Robson fizesse o que muitos fazem: casar-se com uma americana. “Mas nem Sean, nem eu nos sentíamos confortáveis com a farsa que teríamos que criar pra conseguir nosso objetivo”, analisa Robson.

Eles decidiram então abrir uma empresa em nome de Sean, na qual Robson seria contratado. Foi assim que criaram, então, a ACP Miami, que exportava material de toda a parte dos EUA para a Eletrobra?s, no Brasil. “Depois de alguns milhares de dólares gastos, muita ansiedade e burocracia, nosso processo foi indeferido e eu tive que ficar seis meses no Rio de Janeiro, longe de Sean. Esse golpe nos privou de muitas coisas. Nessa mesma época, a ma?e de Sean, que vivia conosco em Miami, foi diagnosticada com Alzheimer. Não poder estar presente ali, em um momento desses, foi muito ruim”, diz Robson.

Com o visto negado como funcionário da empresa, Robson precisou de mais um novo plano. O plano agora era de tornar-se estudante para conseguir o visto. “La? fui eu para o Miami Dade College estudar Music Production. A um custo anual de aproximadamente $10 mil dólares e atendendo aulas em período integral na faculdade, o tempo foi ficando apertado”, relata o carioca.

Embora fosse uma solução temporária, Robson foi se firmando em Miami, onde participou de bandas como o Clube do Choro de Miami, foi cantor do Batuke Samba Funk, e Rose Max e Ramatis. “Cheguei a abrir um show para Dionne Warwick, em evento beneficente em Miami, e cantei pra Quincy Jones e convidados no brunch de inauguração do MGM Grand, em Foxwoods (CT)”, conta.

Mas a crise econômica trouxe um novo obstáculo ao casal. Em 2010, Sean deixou a empresa para a qual tinha trabalhado por mais de 12 anos e os dois abriram juntos a TOCA Eventos, com base nos dois países. “Fechamos a ACP e investimos no negócio de design e produção de eventos corporativos com escritórios no Rio de Janeiro e em Miami”, relata Robson.

Com a Toca, Robson e Sean mudaram sua casa definitivamente para o Brasil, antes que a Suprema Corte Brasileira votasse sobre a Unia?o Civil Esta?vel entre casais do mesmo sexo. Quando isso aconteceu, Sean imediatamente ganhou status de estrangeiro requerente. “Desde então, nossa residência e? o Rio, cidade que nos acolhe e reconhece pelo que somos. Mas estamos constantemente nos EUA a trabalho”, disse Robson.

DOMA Com a notícia da semana passada, de que a Suprema Corte americana declarou o DOMA (Deffense of Marriage Act) inconstitucional, Robson e Sean veem o ciclo de “exílio” chegando ao fim. “Casais como nós não precisarão mais exilar-se dos EUA para manter a integridade de sua relação”, comemora Robson.

Mesmo assim, os dois ainda não deram entrada no processo da imigração nos EUA. “Primeiro vamos transformar, no Brasil, a nossa União Estável em Casamento, esta semana. Depois disso, entraremos com um pedido de green card para mim pelo Consulado Americano aqui no Rio de Janeiro, mesmo”, disse. “Mas estamos pensando em casar também nos EUA, talvez em Massachusetts. O primeiro casal beneficiado nos EUA depois da decisão da semana passada é um casal que vive na Flórida. Eles se casaram em outro estado e mesmo assim já conseguiram o green card do estrangeiro”.

“Saber que podemos escolher onde viver, se Brasil ou EUA com base em nossa união e? uma conquista civil de uma importância enorme, não apenas pra nós, mas pra toda a sociedade”, diz Robson. “A inclusão de casais gays a? instituição do casamento não vai enfraquecê-la como querem proclamar os conservadores. Ao contrário, vai fortalecê-la”.

Casal gay da Flórida é o primeiro a receber green card

Um casal gay de Fort Lauderdale foi o primeiro a receber o green card, poucos dias depois de a Corte Suprema outorgar reconhecimento aos casais do mesmo sexo já casados. O casal recebeu no dia 28 uma notificação das autoridades que comunicava a um deles, o búlgaro Traian Popov, casado com o americano Julian Marsh, a concessão do green card.

Dois dias antes de o casal receber a notícia, o Supremo havia se manifestado sobre o casamento homossexual com duas decisões judiciais históricas, nas quais outorgava o reconhecimento aos casais homossexuais que já estavam casados. Desta maneira, o Supremo invalidou a lei conhecida como DOMA, de 1996, que definia o casamento como “a união entre um homem e uma mulher”.

Obama O presidente Barack Obama anunciou, no dia 2, que os casais do mesmo sexo casados podem apresentar o pedido do green card, assim como os casais heterossexuais. A secretaria de Segurança Interna, Janet Napolitano, disse que o presidente Obama instruiu os organismos federais para que apliquem de forma flexível a decisão da Suprema Corte. Enquanto isso, restante dos imigrantes espera pela da reforma Embora a comunidade imigrante gay já tenha ganhado sua própria “reforma” e deve comemorar iniciando suas aplicações imediatamente, o resto da comunidade imigrante ainda tem uma espera, conforme o projeto de lei é encaminhado pela Câmara dos Deputados, diz a advogada Ingrid Domingues McConville.

“Atualmente, para uma proposta tornar-se lei na Câmara, precisamos de 218 votos dos 435, o que não é impossível”, disse a advogada. “Segundo a ‘gangue dos oito’, os senadores que escreveram a lei passada no Senado, a Câmara poderá demorar um pouco, mas tomará a decisão positiva quanto à reforma imigratória”.