Os números já contam por si só a história da imigração da carioca Luciana Sandins: 23 anos de Estados Unidos, cinco processos que já deu entrada na Imigração, dos quais somente um está em andamento; perdas de grandes quantias em dinheiro e todo esse tempo sem documentos e sem ver a família no Brasil.
No dia 20 de novembro à tarde, antes que o presidente Barack Obama anunciasse as Ordens Executivas, das quais Luciana finalmente deve se beneficiar, sua casa em Aventura fora invadida por ladrões.
“Eles levaram tudo: computador, TV, i-Pad, meu passaporte brasileiro... Por isso, nem pude ver o anúncio do presidente ao vivo”, disse Luciana. “Mas a única coisa que não levaram foi o dinheiro que tenho juntado há dois anos para quando chegasse a minha vez de dar entrada em um processo e os documentos de minha filha, que é cidadã americana”.
Luciana acredita viver uma das últimas provações para finalmente se legalizar. Ela conta que a gaveta onde estava o dinheiro era uma das mais óbvias, e que ladrões a abriram, mas algo os assustou na hora e não puderam vasculhar. “Foi realmente uma proteção divina”, reflete.
Luciana ficou feliz com o anúncio, pois sua filha, Luana, de 16 anos, é cidadã americana e, por isso, ela finalmente será beneficiada. “Mas eu só vou realmente acreditar quando chegar a hora de dar entrada e pedir o alívio e permissão de trabalho”, disse a carioca. Segundo a imigração, pessoas elegíveis ao alívio por terem filhos americanos ou residentes poderão dar entrada somente dentro de seis meses a partir do anúncio do presidente.
Cinco tentativas
Luciana vive nos Estados Unidos desde 1991. Ela passou por uma odisseia de tentativas de conseguir a residência através das empresas em que trabalhou. Em 2001, Luciana descobriu que seu caso se enquadraria na lei 245, que permitia que pessoas normalmente inelegíveis à residência entrassem com pedidos sob outras condições. A empresa na qual trabalhava, de importação e exportação, patrocinaria seu caso. “Assim que recebi a aprovação do Departamento do Trabalho, a empresa faliu por causa dos ataques terroristas de 11 de setembro”, conta.Luciana conseguiu outro emprego rapidamente e ficou insegura em falar de sua situação no início. Quando finalmente se sentiu à vontade para pedir que o novo empregador a patrocinasse, Luciana descobriu que já era tarde demais para continuar o processo antigo e teria que começar tudo de novo.
Em 2006, La brasileira teve uma nova oportunidade de pedir residência através de um novo emprego. Ela trabalhava na firma de exportação de um casal que conhecia há anos. Certo dia, em junho de 2006, um desentendimento fez com que seu patrão ficasse furioso e a mandasse embora. Luciana acabou cortando relações com o casal, arrumou um novo emprego dentro de dois dias, mudou de casa e precisou mudar o número do telefone.
Em dezembro do mesmo ano, ela encontrou o filho mais velho do casal. “Ele disse: ‘nossa, por onde você andou? Meu pai está atrás de você, pois sua carta chegou’. Eu perguntei: ‘que carta?’, e ele disse: ‘a carta aprovando a sua permissão de trabalho’”.
Conclusão, a carta havia sido entregue em setembro e, em dezembro, quando estava com ela em mãos, já não era válida. “Eu teria que começar tudo de novo, mais uma vez”, relata.
Na quarta tentativa, Luciana resolveu seguir o “caminho que muitos seguem: o do casamento”. Acontece que ela foi aconselhada a se casar com seu marido (com quem tinha união estável), mas que também era indocumentado. Ela seguiu a promessa de uma cubana, mas depois de três anos descobriu que se tratava de uma fraude. “Foram três anos perdidos esperando por esse suposto processo, até que ela disse que para dar certo um de nós dois teria que ter uma ordem de deportação. Ninguém entendeu nada”, disse Luciana. “Foram $4.500 dólares perdidos”.
Finalmente, em 2009, Luciana decidiu que a única chance que tinha em mãos era entrar com pedido de residência através de seu irmão cidadão americano. Esse processo está em andamento, mas demora em média 11 anos.
“Na última vez que fui ao advogado, saí chorando. Ele disse que meu processo ainda ficará aproximadamente seis anos na fila. Eu, agora, já estava sem esperança alguma de encontrar uma solução”, reflete Luciana. “Meu maior medo nunca foi da deportação, pois sempre fui uma imigrante exemplar, nunca cometi crime, sempre paguei minhas taxas. Meu maior medo era de perder minha mãe no Brasil e não poder me despedir. E isso aconteceu no último mês”.
Gaúcho ainda não sabe se dará entrada em pedido de alívio
Quando Adriano Santos chegou aos Estados Unidos, em 1990, como turista, era mais fácil conseguir uma carteira de motorista e o social security. Adriano trabalha em Nova York como motorista e conta que até hoje conseguiu renovar sua carteira de motorista, talvez por ter sorte.
Com o anúncio da Ordem Executiva da última semana, o gaúcho de Porto Alegre se beneficiaria por ter um filho cidadão americano de 16 anos. “Mas eu me pergunto: eu estou tranquilo, não tenho problema, trabalho há 14 anos na mesma empresa, pago impostos. Por que vou me entregar?”.
Adriano está questionando a provisoriedade da Ordem Executiva. “E daqui a três anos? Se tudo voltar a ser como era antes, eles terão todas as minhas informações na Imigração”, disse. “A única coisa que não tenho é o green card, algo que não será dado com esta medida”.
Embora seja improvável que 11 milhões ou mesmo os 5 milhões de beneficiados da Ordem Executiva sejam deportados, “sair das sombras” para alguns imigrantes não vale à pena em troca da incerteza do que irá acontecer nos próximos anos.
Para Adriano, a maior esperança é esperar que seu filho complete 21 anos para dar entrada no pedido de residência. “Ainda não sei o que irei fazer. Vou falar com o meu advogado. Meus amigos dizem que devo entrar para caso entre uma nova lei eu já estar dentro. Mas ainda não sei”, disse.