Escritório acusa Consulado do Brasil em Miami de supostas irregularidades

Por Simone Raguzo

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Não é de hoje que o brasileiro enfrenta dificuldades e burocracia na hora em que precisa de um serviço efetuado por órgãos públicos, o que inclui os Consulados Brasileiros.

É comum a reclamação de brasileiros e estrangeiros que precisam de serviços do órgão em todo o mundo. Isso inclui o Consulado-Geral do Brasil em Miami – que atende a Flórida, Porto Rico ou Ilhas Virgens Americanas, tendo como cônsul-geral Hélio Vitor Ramos Filho -, com breve horário de atendimento, que funciona das 10 às 14 horas, de segunda a sexta-feira, para serviços relacionados a documentos brasileiros, autenticação e reconhecimento de assinaturas. Já o setor de vistos, para pessoas que vão visitar o Brasil, oferece atendimento somente das 10 às 12 horas para quem for apresentar um pedido, e das 15 às 16 horas para a retirada.

Reclamações variam desde os horários de funcionamento acima citados a longas filas, e mesmo chegando a críticas pela contratação de seguranças que falam somente espanhol.

Fora as reclamações comuns, visitantes alegam que ,na falta de algum serviço que deve ser feito fora do consulado, são encaminhados diretamente para a sala 22, no mesmo prédio, onde está localizado o escritório do "G3 Visas & Passports".

Já quem decide ir ao escritório do advogado brasileiro Jamil Hellu, que também é notário público nos Estados Unidos, e mantém um escritório também no mesmo prédio do Consulado, perderá tempo e dinheiro, pois o consulado se recusa a receber documentos, de qualquer natureza, encaminhados por ele.

Diante da denúncia de Hellu, o GAZETA foi ao Consulado Brasileiro em Miami averiguar a procedência da mesma. Com dois documentos em mãos a serem autenticados pelo consulado, após passarem pelo escritório de Hellu e levarem a assinatura do mesmo, a resposta dada por dois funcionários de distintos departamentos foi negativa.

Primeiramente, na checagem dos documentos, onde se determina o valor a ser pago pelo serviço, o senhor responsável pelo atendimento, ao perceber o carimbo de Jamil Hellu, logo mostrou uma feição de reprovação, acrescentando: "Eles não vão aceitar esses papéis com a assinatura desse notário". Indagado sobre o porquê, respondeu: "Problema entre eles, do consulado e dele. Estou avisando que é para você não perder o seu tempo". O atendente completou, dizendo para que fosse diretamente ao guichê dois ou três e confirmasse essa informação.

Ao ver os documentos apresentados, a atendente do guichê dois prontamente respondeu que não poderia aceitar documentos daquele notário, pois o mesmo não era válido no consulado. Também indagada sobre o motivo, ela respondeu: "Temos ordem para não aceitar, mas vou verificar lá dentro se nada mudou". Ao retornar, informou que os documentos realmente não seriam aceitos, que poderiam ser autenticados diretamente no consulado, ou deveriam ter a assinatura de um outro notário.

 Serviços negados

"Diariamente, centenas de pessoas, na maioria brasileiros, procuram os serviços prestados pelo Consulado-Geral do Brasil em Miami e, muitas delas, dirigem-se ao meu escritório em busca de assistência e serviços, que incluem diversos serviços junto ao judiciário brasileiro, especialmente homologações de sentenças estrangeiras, como divórcios, adoções, pensões alimentícias, etc, junto ao STJ em Brasília. Mas tenho sido impedido do exercício profissional, levando prejuízos materiais e morais", desabafa Hellu.

Conforme o profissional, todo  documento  público, emitido por autoridade estrangeira com fins legais no Brasil, bem como, assinaturas de estrangeiros, ‘notarizadas’, devem ser legalizados (consularizados) pela autoridade consular da respectiva jurisdição, entretanto, os processos têm ficado parados e seus clientes prejudicados, já que o consulado tem se negado a recebê-los.

 Busca por explicações

"Desde o início das minhas atividades profissionais no prédio do consulado (há dois anos), minhas solicitações para que os documentos recebam as chancelas consulares necessárias, tais como legalização de certidões, de sentenças judiciais, assim como a simples lavratura de uma procuração pública, ou mesmo os documentos por mim ‘notarizados’ ou autenticados, são recebidos sempre com discriminação", conta.

Segundo Hellu, essa dicriminação iniciou justamente com seus questionamentos sobre possíveis irregularidades dentro da administração do consulado. O advogado brasileiro não se absteve a permanecer calado, inclusive, encaminhando formalmente ao órgão um pedido de informações, amparado pela Lei de Acesso à Informação.

Além de questionar os encaminhamentos à "G3 Visa & Passports", anteriormente citada, Hellu também questionou o uso de um cartão de visitas pelo advogado americano Joel Stewart (que trabalha dentro do centro administrativo do consulado), tendo na frente sua identificação, junto ao brasão brasileiro, como consultor jurídico, e no verso os dados do seu escritório particular.

Hellu ainda questionou a existência de uma fotocopiadora instalada dentro das dependências do consulado, mas que seria de propriedade particular, cuja funcionária encaminharia pessoas que necessitam de assistência para a empresa, localizada próxima ao consulado.

Tudo isso foi levado por Hellu a conhecimento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e do Itamaraty, o que o faz acreditar que seja o motivo de represálias. "Devido as minhas sucessivas denúncias das diversas arbitrariedades e irregularidades praticadas por quem coordena as atividades daquele consulado, tenho sido impedido do exercício de minha profissão. Entretanto, a OAB, através de seu Conselho Federal, está inteirada e preparando as providências legais em defesa de minhas prerrogativas profissionais, que estão sendo arbitrária e ilegalmente violadas", observa.

Licenças

Jamil Hellu é licenciado pelo Florida Department of State Division of Corporations como notary public ativo, com validade até 10 de agosto de 2016 (Identificação 1236736), e é advogado no Brasil  e licenciado pelo Florida Bar Association (espécie de Ordem dos Advogados na Flórida) como Foreign Legal Consultant, podendo assim oferecer consultas enquanto advogado brasileiro na Flórida. Hellu tem um certificado emitido recentemente pela OAB, declarando sua inscrição no órgão, há 34 anos, não tendo recebido nenhuma advertência ao longo desse período. Todos os certificados do profissional foram checados e tiveram sua autenticidade comprovada pelo GAZETA.

Vale ressaltar que não há  impedimento legal algum do exercício simultâneo de ambas suas funções. Inclusive, conforme informa o site oficial do Departamento de Estado da Florida (http://notaries.dos.state.fl.us), na Flórida,  Carolina do Sul e Maine, as atribuições de um "notary public" são mais abrangentes, podendo até oficializar casamentos.

Resposta do Consulado

O Consulado-Geral do Brasil em Miami atende a imprensa apenas via email, endereçado ao departamento de imprensa do órgão, pelo qual o GAZETA entrou em contato para buscar explicações sobre as denúncias feitas por Jamil Hellu. A resposta foi a seguinte: "O Consulado-Geral esclarece que atende aos despachantes que atuam em sua jurisdição estritamente em conformidade com as legislações brasileira e estadunidense pertinentes. O atendimento a determinada empresa de despachante é suspenso apenas em raras ocasiões, e, em última instância, quando os pedidos protocolados apresentem evidências claras de má-fé, com a intenção patente de burlar a legislação, lesar o Poder Público ou aproveitar-se da vulnerabilidade dos brasileiros expatriados para promover interesses exclusivamente privados. No que se refere à empresa em questão, o Consulado-Geral sempre concedeu a seus representantes atendimento solícito e condigno, a exemplo do oferecido a demais agentes do mesmo ramo. Quaisquer documentos que tenham sido recusados o foram justamente em função de seu desacordo com as normas vigentes ou em razão de eventuais irregularidades", respondeu o órgão, alertando aos usuários que se informem sobre à utilização de serviços de despachantes no site: http://miami.itamaraty.gov.br/pt-br/alerta_aos_residentes_na_fl,_porto_rico_e_us_virgin_islands.xml.

Questionado novamente sobre o fato da reclamação não se restringir somente a serviços de cartório, mas sim a todo e qualquer tipo de documento que necessite legalização do Consulado Brasileiro, enviado pelo escritório do doutor Jamil Hellu, e sobre a que a consulado se referia ao informar que "quaisquer documentos que tenham sido recusados o foram justamente em função de seu desacordo com as normas vigentes ou em razão de eventuais irregularidades", nenhuma outra resposta foi enviada ao GAZETA até o fechamento da edição.