Doula: uma opção para o parto humanizado - Viver Bem

Por Adriana Tanese Nogueira

images (3)

Nos últimos 10 anos, surgiu no Brasil (e no mundo há mais tempo) uma nova “profissão”, a da doula. Legalmente esta é uma “ocupação”, não uma profissão. A palavra é estrangeira e vem da Grécia antiga e quer dizer “mulher que serve”: as doulas teriam sido as escravas da casa que durante os partos de suas patroas prestavam assistência (desde auxiliar a parteira a lavar o chão). Há quem não se identifique com esta palavra e prefere se chamar de acompanhante. Não há regulamentação da “profissão” da doula porque, na realidade, trata-se de uma função que pertence ao mundo pré-moderno. De fato, ser doula é uma sabedoria.

Hoje em dia, se formar numa profissão significa fazer um curso e sair de lá com um diploma na mão, prontos para trabalhar. No caso da doula não é tão simples assim, porque infelizmente a maioria dos cursos foca o cognitivo e a dimensão do trabalho da doula inclui o emocional, o afetivo e o espiritual. Para ser doula não basta o conhecimento mental, é preciso de autoconhecimento, de inteligência emocional, sensibilidade espiritual e sabedoria instintiva. Ou você encontra um bom curso (www.cursosamigasdoparto.com) que tenha essa visão e prática holística ou você sai dele com uma bagagem para o trabalho que é incompleta e precária, exatamente como é incompleta e precária a abordagem à gravidez e ao parto da nossa sociedade e do sistema obstétrico atual.

O que queremos de uma doula? Queremos acrescentar o que falta, preencher o vazio que o sistema deixa na alma, na mente e no emocional da mulher parturiente. A obstetrícia está atualmente preocupada em tratar de corpos, não de pessoas. A simpatia com que uma mulher pode ser tratada num hospital (particular!) não deve ser confundida com verdadeiro respeito. Os sorrisos que ela recebe servem para olear a máquina e fazê-la funcionar conforme as regras do sistema. Sorriem para você para te amansar. Querem-te mansa para te conduzir. Ficou claro?

E aqui está o problema: o parto deixou de ser das mulheres há muito tempo. O parto é dos médicos, dos hospitais. O parto é de quem ganha dinheiro com ele e usa de subterfúgios para conseguir o que quer. Parece feio, mas é infelizmente a realidade. Num mundo guiado e norteado pelo dinheiro, quem poderia ser tão ingenuo de acreditar que a esfera médica estaria isenta desse feitiço quando é nela que se produz mais lucro?

Assim, cesáreas são convenientes, médicos no controle são convenientes, hospitais também. Se o parto fosse das mulheres, todos ganhariam menos dinheiro – mas ela e seu filho ganhariam dignidade, respeito e autoestima. Começar a vida em liberdade e respeito só pode levar a um aumento de poder pessoal. Dignidade. A doula serve para ajudar a mulher a conseguir isso. Não só a doula, como a educadora perinatal também. A diferença entre uma e outra é que esta última começa o trabalho desde antes, ainda durante a gravidez e não necessariamente acompanha o parto, enquanto que a doula parto está dedicada ao acompanhamento do trabalho de parto e parto. (E há a doula pós-parto para o depois do nascimento.)

A doula, portanto, preenche lacunas cognitivas ao dar à mulher as informações sobre o mecanismo e a fisiologia do parto que ela, muitas vezes, não obtém no consultório médico. Explicar-lhe e, na hora do parto, ajudá-a a adotar as posições que facilitam o trabalho de parto e diminuem a dor. Preenche as lacunas afetivas e emocionais quando incentiva a mulher a ter confiança em si mesma e em seu corpo, a acreditar em si. Lhe dá suporte físico quando oferece o apoio que o corpo da parturiente precisa, quando lhe dá a massagem e a mão na hora da necessidade. Finalmente, respeita a espiritualidade do momento, valorizando o parto como um momento de grande intensidade existencial na vida daquela mulher e daquela família, sabendo ela própria se conectar com algo maior e mais profundo do que os olhos físicos podem ver.

Possuir a sabedoria para se tornar invisíveis quando necessário e presente quando preciso faz parte do arsenal da doula. Em sua bolsa, além de frascos de aromaterapia, cadernos com mantras, toalhas e óleos essenciais para massagens, haveria de ter sua própria capacidade de autoconhecimento e sutileza. Parto é algo místico, profundo, transcendente – tanto quanto ele é carnal, sensorial e físico. Eis que a doula se configura como uma ponte que se for preciso possibilita a transição entre o prosaico do mundo e o sagrado do além – de onde o bebezinho vem.

*Adriana Tanese Nogueira é psicanalista e life coach www.ATNHumanize.com