Editorial - Respeito às opiniões alheias: quando o contrário desagrada

Por Arlaine Castro

"Posso não concordar com o que diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo". Esta frase, atribuída em grande parte das vezes ao filósofo e escritor francês Voltaire (alguns dizem que a frase foi criação de uma biógrafa em uma obra relacionada ao filósofo no início do século 20), é uma das mais citadas, mas mais difíceis de seguir. O respeito às opiniões alheias 'cai por terra' quando a pessoa pensa ter mais certeza sobre todos os assuntos. Assim, se torna mais intolerante com quem pensa da mesma forma. Uma pesquisa feita pelo Instituto Avon e divulgada em abril, indicou que 32% dos brasileiros acreditam que não vale a pena conversar com quem tem visões políticas diferentes. Só na Índia e na África do Sul as pessoas estão ainda mais fechadas do que os brasileiros. Em outros países pesquisados, incluindo Argentina, Chile, México, Estados Unidos, Reino Unido, Japão, as pessoas estão mais dispostas a conversar com quem tem visões diferentes. Mas, mesmo que não tenha sido Voltaire, o sentido da frase é profundo e descreve nas entrelinhas um sentimento que deveria caminhar intrinsecamente e diariamente com a humanidade. O que está escrito diz muito sobre o ser humano e o que mais temos visto hoje pelo mundo: a falta de compaixão e entendimento com uma opinião contrária. Como veículo de comunicação, temos o dever de informar toda e qualquer notícia. Sejam elas tristes ou alegres. Tiroteio, morte na fronteira, afogamento infantil, morte de crianças presas dentro de carros, imigrantes que perdem a vida tentando entrar ilegalmente pela fronteira com o México - estas estão longe de ser as notícias que "ficamos felizes" em dar, mas faz parte do nosso dever de informar fatos reais. Dessa forma, assim como acontece com todos os outros meios de comunicação que operam na internet, as visões contrárias ao que é noticiado, sejam notícias factuais (que acontecem no dia)ou trabalhadas em fatos e dados reais - mas que não caracterizam a opinião do jornal - (para isso existem editorias de opinião ), resultam em críticas grosseiras. A facilidade de dizer que é Fake News Quantas vezes ouvimos ou lemos essa expressão atualmente? Milhares. É muito fácil comentar em uma matéria citando-a como 'fake news', mas sem abrir e ler seu conteúdo, sem ao menos checar sua veracidade e sua fonte. Isso não contribui em nada, pelo contrário, prejudica a sociedade. Milhares de notícias falsas são criadas diariamente, mas mesmo assim, isso não pode ser usado como desculpa quando uma notícia está em desacordo com a sua opinião pessoal. Discordar, mas com argumentos que refute a ideia central, é a melhor saída. Não é xingar a mãe do vizinho ou da pessoa do comentário acima que vai mudar o mundo e muito menos melhorar a realidade. A evolução só acontece quando há ideias e opiniões contrárias e uma discussão sadia sobre o assunto que leve a alguma mudança. Entre 27 países, o Brasil é o sétimo em ranking de intolerância. Essa outra estatística é de uma pesquisa de 2018 onde o Brasil aparece empatado com Estados Unidos, Polônia e Espanha. 84% dos brasileiros veem uma divisão no país. No geral, a percepção é que o mundo está mais dividido do que dez anos atrás; 62% dos brasileiros pensam assim do país. Por isso, prevalece a recomendação para um mundo menos chato e violento: menos intolerância e mais respeito com a opinião contrária. Para a antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, até há alguns anos, o brasileiro zelava por uma imagem "de muito receptivo, muito aberto" que servia de verniz para uma intolerância e um autoritarismo que ficavam escondidos e que estavam enraizados na própria história do país - a característica mais marcante do "homem cordial" descrito em 1936 pelo historiador Sérgio Buarque de Holanda.