Emocionalmente solteira

Por Adriana Tanese Nogueira

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A solidão – escreveu Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço, colega de Sigmund Freud e criador da psicologia analítica – não deriva do fato de não ter ninguém perto, mas da incapacidade de comunicar aquilo que para nós é importante ou de dar valor a certos pensamentos que os outros julgam inadmissíveis. Jung (1875-1961) foi um dos maiores conhecedores e exploradores da alma humana, pioneiro na psicologia profunda. Seu ponto de vista é o de alguém que vê e se interessa pela essência das coisas e de nossas vivências. Assim, deste lugar, o que realmente conta para nos fazer felizes, inteiros e amados é poder partilhar com os outros, sobretudo com os mais próximos, as coisas que para nós são importantes. O que para nós conta e tem valor representa um pedaço de nossa identidade. Se pudermos expressar um aspecto de nosso verdadeiro Eu, iremos nos sentir aceitos e valorizados. Teremos a percepção de sermos parte de um grupo que tem significado para nós e nós para o grupo. Num casamento, essa partilha leva à intimidade emocional. Dormir juntos é o ritual mais comum para identificar um casal, mas esta atividade, mesmo quando inclui sexo, constitui uma intimidade de corpos, e é somente física se não for acompanhada pela possibilidade de troca profunda, de abertura de alma. Uma relação não se desenvolve sem esse nível de comunicação. Podemos dormir na mesma cama e ter sexo com a mesma pessoa a vida inteira, partilhar responsabilidades, criar filhos, ir de férias juntos e não ter intimidade emocional com esta pessoa, não saber o que realmente se passa dentro dela e termos medo ou nos sentirmos constrangidos e envergonhados pelos pensamentos que temos, desejos, vontades, objetivos. Uma mulher casada nessas condições é uma mulher emocionalmente solteira. Casamentos assim, infelizmente, são muito comuns. Casam-se os corpos, não as almas – mesmo quando o casamento é “diante de Deus”. À formalidade religiosa não corresponde a realidade concreta individual e subjetiva. Os homens, geralmente, se satisfazem com a intimidade física e cotidiana, as mulheres com os anos se sentem sempre mais sós, ou seja, emocionalmente solteiras. Estão só escondem sua verdadeira alma, atuam um personagem para “o bem da relação”, o que de fato significa que mantêm um papel que agrada a ele, permitindo que ele fique em sua zona de conforto. Com eles permanecendo confortáveis e sem ser muito “exigidos” as mulheres querem garantir a sobrevivência da relação. Mas por qual preço? Um dia elas finalmente se percebem sozinhas e sentem-se invisíveis. Têm depressões inexplicáveis, sintomas físicos “sem causa” e, no afã de estar bem, ainda sem questionar sua profunda solidão interior porque a consideram “normal”, buscam refúgio em cursos de autoajuda e igrejas, ou festas, amigas e bebedeiras. Fogem da sensação desagradável de estar profundamente só, de uma solidão dolorosa, com tanta coisa dentro que nem mais sabem o que é, de onde vem, e o que fazer com isso. Não lhes passa pela cabeça que estão sofrendo por todas as coisas que deixaram de falar, pelos desejos reprimidos, pelos anseios silenciados, pela comunhão que não aconteceu. Amor do século XXI não se satisfaz de intimidade de corpos, exige a alma. Almas que se abraçam, amam, compreendem, questionam, buscam e crescem juntas. Sem isso, um dia a tristeza vai tomar conta do relacionamento, apresentando-se como uma insatisfação muda e sem nome que não se sabe de onde vem, mas que tem causa e remédio.