Entenda a polêmica Caetano Veloso x Gilberto Gil

Por Gazeta Admininstrator

O pano de fundo da polêmica que envolve artistas e intelectuais e põe em campos opostos os parceiros e amigos de mais de quatro décadas Gilberto Gil e Caetano Veloso é a distribuição de verbas oficiais para a cultura.

As críticas feitas pelo poeta Ferreira Gullar ao Ministério da cultura, durante uma entrevista na Folha de S. Paulo, provocaram uma resposta explosiva do secretário de Políticas Culturais do Minc, Sérgio Sá Leitão, que chamou o poeta de defensor do stalinismo. Intelectuais assinaram um manifesto em solidariedade ao poeta, entre eles, Fernanda Montenegro, Oscar Niemeyer, João Ubaldo Ribeiro. Caetano Veloso escreveu uma carta aberta publicada ontem na coluna Monica Bergamo da Folha de S. Paulo, também em apoio a Ferreira Gullar.

Os antecedentes
Em 2003, o cineasta Carlos Diegues chamou de tentativa de dirigismo cultural a política de patrocínio oficial de obras e eventos culturais do governo Lula. Na época, as regras - formuladas pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República, então ocupada pelo ministro Luiz Gushiken - exigiam dos candidatos a verbas públicas e das estatais o que o governo chamava de contrapartida social e adequação às políticas do governo.

Após contundentes ataques de cineastas e outros artistas a essa política da Secretaria de Comunicação, o ministro da Cultura, Gilberto Gil, foi incumbido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva de criar uma nova política de patrocínio do governo às atividades artísticas.

O Ministério da Cultura (MinC) criou, então, regras que estabelecem o que chama de descentralização dos patrocínios dados pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e estatais como a Petrobrás. Segundo o secretário de Políticas Culturais do MinC, Sérgio Sá Leitão, as novas regras acabam com o “balcão de atendimento especial” aos pedidos apresentados por artistas ou produtores consagrados.

21/12/2005: Poeta ataca o Ministério
Foi contra essas regras que se manifestou o poeta Ferreira Gullar, iniciando a atual polêmica. “Não me envolvo diretamente ou acompanho (as ações do MinC). Mas ouço reclamações de diferentes áreas de que não está cumprindo bem seu papel. Dizem que os projetos não andam. Nem solicitações de verbas. Houve centralização que não sei se continua.” As declarações do poeta foram feitas no dia 21 de dezembro passado, em evento do jornal Folha de S. Paulo.

24/12/2005: Secretário chama poeta de stalinista
O secretário de Políticas Culturais do MinC, Sérgio Sá Leitão, respondeu às críticas taxando o poeta Ferreira Gullar de stalinista. “Não deixa de ser curioso um comunista criticar algo ou alguém por uma suposta ‘centralização’. A ‘centralização’ não era a marca registrada dos finados regimes stalinistas dos quais Gullar foi e segue sendo um defensor?”

26/12/2005: Poeta contra-ataca
Em resposta, Ferreira Gullar disse que o texto do secretário do MinC parecia ter sido escrito pelo SNI, o Serviço Nacional de Informações da ditadura militar.

Última semana de 2005: Intelectuais fazem manifesto
Um abaixo-assinado contra o secretário do MinC e em defesa de Ferreira Gullar foi enviado ao Ministério, nos últimos dias de dezembro. “Nós abaixo-assinados vimos explicitar nosso repúdio pela forma como um funcionário do alto escalão do Ministério da Cultura trata um dos maiores intelectuais vivos deste país, o poeta Ferreira Gullar.” O texto, assinado pelos produtores de cinema Zelito Vianna, Luiz Carlos Barreto e outros artistas e profissionais da área cultural recebeu a adesão Oscar Niemeyer, Fernanda Montenegro e João Ubaldo.

4/1/2006: Caetano põe fogo na discussão
Caetano Veloso entrou na polêmica - do lado de Ferreira Gullar e contra o Ministério dirigido por Gilberto Gil - em carta aberta, publicada na Folha de S. Paulo no dia 5 de janeiro. “A crítica a Gullar partiu do poder público. (...) Ministérios são braços do executivo, suas aprovações ou desaprovações são oficiais. Um poeta não pode expurgar um governo. Governos totalitários são viciados em expurgar poetas. Se um ministério demonstra não aceitar críticas - pior: exige adesão total a suas decisões -, estamos sim a um passo do totalitarismo; se um poeta expõe de público discordância - ou simples desconfiança - dos rumos de um ministério, temos democracia.”

“Gullar pode ter sido comunista (não me consta que tenha sido stalinista), mas não há nada de totalitário em apoiar aqueles que, tendo contribuído decisivamente para a história do cinema e do teatro brasileiro, suspeitavam que, por trás das idéias igualitárias, queriam chamá-los de oportunistas.”

“Essa gente do governo anda para trás.”

5/1/2006: Ministro reage: “Peçam minha cabeça”
“Peçam minha cabeça ao presidente”. Assim reagiu o ministro Gilberto Gil, questionado sobre a polêmica na quinta-feira, dia 5 de janeiro, no Rio, quando participava, ao lado do secretário Sérgio Sá Leitão, do lançamento do projeto Copa da Cultura, que terá verba oficial de R$ 25 milhões para promover apresentações de mostras da cultura brasileira na Alemanha.

“Digam, apontem, o que é totalitarismo no Ministério?”, disse o ministro Gil ao Estado. “Totalitarismo? É vago, eu não sei o que é, me digam, eu também preciso saber.” O ministro disse não ver nenhuma razão para a saída do secretário do Ministério: “O que ele fez de errado? Por que não pedem a minha cabeça em vez de pedir a dele?" Na entrevista, o secretário Sá Leitão se disse vítima de uma campanha difamatória de um grupo liderado pelo cineasta Luiz Carlos Barreto: “Havia acesso privilegiado aos cofres públicos. Agora, a política é democrática.” Para ele, a discussão agora tem a ver com a campanha eleitoral: “Vai começar uma competição entre esses barões da cultura para vem quem é que vai bater mais no ministério. Para se colocar mais em oposição ao Lula.”