Que coisa sem jeito

Por Por Roberta Dalbuquerque

Smiley face

É impossível sair de casa de pijamas e não encontrar um conhecido. Pode ser um sábado de inverno - 13 graus - 9h45 da manhã, pode até estar chuviscando, não importa, sempre haverá alguém para sorrir e abanar a mão contente como quem diz, eu te vi.

Já testei várias vezes.

Ocorre que a minha filha mais nova frequenta um coral a exatos mil metros de casa nas manhãs de sábado. O combinado é acordar cedo, passar o café, tomar banho e levá-la com calma. Mas café da manhã de sábado não é tarefa a se fazer com pressa.

E no mais, São Paulo anda tão gelada que a ideia de vestir um jeans por cima da calça do pijama e um casaco por cima da blusa, parece sempre mais acertada do que a do banho. A de pôr o cabelo amassado para desfilar, avenida quase completa, versus molhá-lo na água praticamente em estado sólido, ganha de disparada.

Pois foi neste sábado mesmo. Tudo se deu como se dá semanalmente.

Corremos atrasadas e mal acordadas para o coral, já a pouquíssimos minutos dos quinze de tolerância combinados com a professora. Eu voltava no sossego de quem já entregou a criança cantante, quando vi um ovo caindo na calçada.

Isso. Um-ovo-caindo-na-calçada.

Esquisitíssimo.

Atravessei a rua e, de novo, mais um ovo quebrou diante dos meus olhos. Outra esquina, outro ovo.

Esse chegou a respingar na minha calça. Tu acredita?

A primeira suspeita de que crianças de zoeira, nossa como eu odeio essa palavra, atiravam de alguma varanda a munição improvável, caiu por terra. Não dá para alcançar três esquinas de uma varanda só.

Apressei o passo para repercutir o ocorrido com uma senhora que andava um pouco à minha frente. Indignação digna de compartilhamento. A senhora viu isso? Que coisa sem jeito! Ela fez que sim com a cabeça e seguiu a passos mais rápidos.

Parei no farol vermelho, esquina com a rua Piauí, já do lado de casa.

A vida me pôs de camarote para assistir o espetáculo encenado bem no meio da faixa de pedestres. Ela, atravessando como se nada fosse, põe a mão na bolsa, tira um ovo laranjadinho - de capoeira, como se diz em Recife -, dá um beijo de despedida, quase irônico, e faz o arremesso com força.

Clara e gema pra tudo que foi lado.

Nunca, na minha vida, vi uma cena tão sem propósito.

E eu que achava o pijama uma excentricidade daquelas. Era só isso mesmo.

Boa semana queridos.