Filhos de pais que bebem demais

Por Adriana Tanese Nogueira

alcool

É fácil apontar o dedo para as drogas, porque logo se pensam nas que são ilícitas. Mas, e o que dizer de uma droga perigosíssima que tem o uso legalizado: o álcool? A droga mais comum, mais usada, a que causa mais mortes no trânsito, a que é promovida por outdoors e comerciais na TV.

O alcoolismo é uma doença séria que engloba aspectos físicos, emocionais, cognitivos e espirituais. Não só, o alcoolismo é uma doença supercontagiosa, sobre a qual a omissão coletiva é quase total. Cabe a cada um de nós tomar consciência da brutalidade do alcoolismo e pararmos de ser cúmplices de seu uso indiscriminado.

Na Finlândia, uma organização sem fins lucrativos que combate o alcoolismo criou uma campanha impactante. Eles conseguiram chamar a atenção para o problema com essse vídeo, que se chama “Fragile Childhood – Monsters”:

O alcoolismo marca a vida das crianças para sempre. Ter um pai ou uma mãe alcoólatra (ou ambos!) acarreta consequências terríveis que esses mesmos pais evitam enxergar porque a dor da culpa seria insuportável. E essa fuga da própria responsabilidade só promove o próprio alcoolismo. Bebe-se para esquecer, para não pensar, para amenizar a vida.

E o que significa para uma criança? Significa que ela é órfã todas as vezes em que seus pais estão sob o efeito do álcool. Não só órfã como também está em perigo. E quando seus pais não estão alterados, mesmo assim ela não pode estar tranquila porque um alcoólico não é “normal” nunca. O vídeo acima ilustra muito bem essa realidade. Não são necessárias as palavras, basta as expressões perplexas, assustadas e confusas das crianças.

É preciso se colocar no lugar delas. Nascem e não sabem o que é alcoolismo. Só sabem que seus pais são, de vez em quando ou frequentemente, estranhos e assustadores. Mesmo quando um pai quer se mostrar “calmo” para o filho, sua energia, seus gestos, seu jeito, é esquisito, é altamente perturbado e pertubador.

Uma criança sabe o que é isso, não entende. Por isso fica confusa. Sente o amor dos pais e os ama muito. Mas... como funciona esse “amor”? É normal ter medo de quem se ama? A mesma pessoa que sabemos que nos ama nos faz também sentir apavorados e em perigo; berra, fala coisas horrendas, quebra objetos e agride nossa mãe (se o pai for o alcoólatra da família).

Os filhos crescem confusos e tristes. Estão amarrados a um sentimento de culpa que não compreendem e sua autoestima é esmagada. A culpa é um dos traços mais comuns dos codependentes, que são os que convivem com os alcoólicos. Culpa por existir, culpa por ter sentimentos contraditórios pela figura dos pais, culpa por querer sumir e ter outra vida em outro lugar. Culpa por não conseguir aguentar... Culpa que bloqueia os movimentos e atrasa suas vidas.

Essas crianças acabam ou por se afastar de casa ou por assumir a responsabilidade por “resolver”, ajudar, cuidar, curar seus pais. Protegê-los de si próprios. Pegam sobre si um fardo gigantesco. Missão impossível, pois não podemos ajudar quem não quer ser ajudado. E enquanto isso, sua vida passa. Enquanto isso são sugadas para dentro do abismo do alcoolismo que é feito de medo, dúvida, insegurança, ceticismo, solidão, fraqueza, tristeza...

O que fazer? O que parece mais difícil: cuidar de si em primeiro lugar. Reconhecer o problema, mas salvar-se sendo mais fortes da derrota que o alcoolismo semeia em volta. Estudando mais, trabalhando mais, sendo mais honestos, mais alegres, mais fortes, mais confiantes. Sem culpa e sem culpar. Ser um sol no meio da noite escura.