A fronteira México-EUA e o pesadelo da travessia

Por Arlaine Castro

“Passar pelo México” é a única alternativa que resta àqueles que querem vir aos EUA e não conseguem o visto para entrar no país. Dessa forma, muitos recorrem à estratégia de atravessar a fronteira pagando a um “coiote”. Os “coiotes” são, em geral, mexicanos que cobram muito caro para atravessar imigrantes clandestinamente do México para os Estados Unidos através da fronteira - num tráfico de migrantes que aumenta à medida que crescem as restrições à migração. Aproximadamente 409 mil imigrantes foram pegos tentando cruzar ilegalmente a fronteira sul dos EUA durante o ano fiscal de 2016, o que representa um aumento de 23% com relação ao ano anterior, segundo estatísticas do governo.

A principal rota ilegal dos brasileiros continua sendo a fronteira mexicana: 3.118 (96%). O número de brasileiros detidos tentando migrar para os EUA cresceu 142% em 2016, em relação a 2015. Ao todo, 3.252 brasileiros foram pegos cruzando ilegalmente a fronteira em 2016, uma média de nove casos por dia. É o contingente mais elevado dos últimos cinco anos. Em 2015, foram detidos 1.344 brasileiros.

São viajantes clandestinos que, com a ajuda dos coiotes, tentam entrar na “América” - muitos acabam sendo abandonados no deserto pelos mesmos. Dezenas deles, exaustos e desidratados, acabam morrendo na vastidão inóspita da fronteira, onde as temperaturas ultrapassam os 40ºC no verão. Com sorte, os corpos – ou o que resta deles – são encontrados semanas ou meses depois por fazendeiros da região ou agentes da fronteira.

De novembro de 2016 até a última semana, foram relatados pelo menos quatro brasileiros que morreram tentando a travessia. Jefferson Eduardo de Oliveira, 20, de Sardoá, morreu afogado no Rio Grande, no estado de Tamaulipas, México, em novembro. Júlio Barcellos, 35 anos, de Rondônia, morreu afogado em fevereiro ao atravessar o Rio Grande, na cidade de Nuevo Laredo, no México. No início de abril, Fabrício Silva Santos, 31, de Guanhães, morreu no mesmo rio, tentando fazer a mesma travessia. E no dia 20 de maio, Sidney da Silva, 39, de Conselheiro Pena, foi encontrado morto do lado americano, no Texas.

De qualquer maneira, a maioria deles jamais será identificada, e os parentes dos mortos nunca vão saber que fim levaram. No condado de Brooks, no Texas, os corpos encontrados no deserto são levados ao Instituto Médico Legal do condado vizinho, Webb, onde são realizadas autópsias e colhidas amostras de DNA. As análises são feitas pela Universidade do Texas, onde os resultados são armazenados à espera de identificação.

A maior parte dos presos brasileiros por cruzar a fronteira é constituída por homens, mas os perigos da travessia pelo deserto - o calor, o risco de ataque de cobras e escorpiões – também são enfrentados por mulheres e crianças. Embora em pequeno número, cresce o contingente de mulheres que se arrisca nessa empreitada.

Muitas vezes, os relatos de quem passou e deu certo, ou de quem ficou no Brasil, mas tem parentes e amigos que tiveram êxito com a travessia, modifica a ideia de que se trata de tráfico de pessoas e minimiza o perigo e as mortes do trajeto.

Referências: Department of Homeland Security / Gláucia de Oliveira Assis, Doutora em Ciências Sociais pela Unicamp, no estudo “A fronteira México-Estados Unidos: entre o sonho e o pesadelo - as experiências de e/imigrantes em viagens não-autorizadas no mundo global” / e Jornal Folha de S. Paulo.