Uma paralisação de 48 horas nos dias 13 e 14, em 17 consulados brasileiros pelo mundo, teve repercussão mundial, mas poucos resultados favorecendo os funcionários locais, que reivindicam por aumentos no salário e direitos ao Ministério das Relações Exteriores (MRE).
Em Miami, segundo um funcionário, não houve unanimidade e por isso os funcionários não aderiram à greve. Mas em apoio, tiraram uma foto na qual funcionárias vestiam-se de preto com expressão séria, publicada no site da AFLEX (Associação Internacional dos Funcionários Servidores Locais do MRE no Mundo), www.aflex-noticias.blogspot.com, no dia 14, assim como funcionários de todo mundo.
Depois da publicação da foto, um funcionário de Miami, que não quis se identificar, disse que as 14 funcionárias na foto foram chamadas e precisaram assinar uma advertência. A explicação dada pelo Consulado foi que é proibido tirar foto dentro das instalações do Consulado.
“Mas tenho certeza que se a foto tivesse sido tirada fora do Consulado encontrariam alguma forma de represália”, disse J.S.*, acrescentando que, nos dias da greve, um cônsul foi de mesa em mesa para ver quem estava vestido de preto.
Depois da advertência, uma funcionária temporária que estava com contrato de três meses foi mandada embora na metade do segundo mês. Outra entregou sua carta de demissão no início da semana, disse J.S.
No site da AFLEX aparecem fotos de funcionários de vários consulados do mundo, vestidos de preto e sérios, como os de Roma, Londres, Milão, Missão do Brasil na ONU (Nova York) – na qual os funcionários também parecem estar dentro do consulado; Los Angeles, Miami, Embaixada do Brasil em Caracas, Washington (Consulado Geral), Montreal (Canadá), Boston, Toronto (Canadá), Lisboa, Atlanta, Houston Hartford, Nova York, Bruxelas e Paris. “Creio não ter acontecido nada com os funcionários dos outros consulados que paralisaram ou tiveram suas fotos publicadas”, disse J.S.
Pressão Por causa do alto volume de trabalho nos últimos meses, devido tanto à alta temporada das férias de verão que se aproxima, quanto à Copa e a emissão de vistos especiais para estrangeiros, o volume de trabalho quadriplicou. “A pressão é muito grande”, disse J.S, que informou que funcionários de Miami não têm aumento desde março de 2009. “Mas quanto mais nos manifestamos e pedimos, mais vivemos pressionados”, avalia J.S.
Cláudia Rajecki, presidente da AFLEX e funcionária do consulado de Atlanta desde 2008, confirma que a pressão sobre os funcionários locais é muito alta. “As metas são impossíveis de serem cumpridas”, disse. Ela diz que, em Atlanta, funcionários não têm aumento e reajuste pela inflação há 5 ou 6 anos. Ela recebe $2.200 dólares por mês, trabalhando 40 horas semanais. “O pessoal fica insatisfeito e a pressão fica lá em cima”.
Cláudia relata que a pressão é tão alta, que ela passou mal depois de voltar da greve na última semana. “Por motivos médicos, esta semana acabei tirando as férias que já havia pedido antes. O ambiente já não é como antes, quando tínhamos dias harmoniosos e tranquilos de trabalho. Hoje, todos estão tensos e o ar está pesado”.
Sem resposta do MRE Cláudia Rajecki, presidente da AFLEX e funcionária do consulado de Atlanta desde 2008, disse que, até o momento, o MRE não deu nenhuma resposta aos funcionários locais, desde a greve. “Faremos uma assembleia geral para decidirmos se haverá outra paralização e por quanto tempo”, disse Cláudia. “É decepcionante um ministério de diplomacia não ter diálogo com seus funcionários. Eles jogam um mundo de responsabilidades do governo nas nossas costas”.
Reivindicações dos funcionários do Consulado
Em um vídeo, Cláudia Rajecki diz que há três anos a AFLEX vem mostrando preocupação com a situação precária dos funcionários locais. “Com a proximidade da Copa do Mundo, tentamos sensibilizar o MRE e outras instâncias governamentais sobre o ambiente desgastado, mas sem sucesso. A situação é crítica: salários congelados há quase 8 anos e muito abaixo do mercado; ausência de política salarial ou de reposição por perda inflacionária. Chega-se ao extremo de alguns trabalhadores terem que recorrer a auxílios sociais, como a ajuda para trabalhadores pobres na Europa, ou ainda ao ‘Food Stamp’, equivalente ao ‘bolsa-família’ nos Estados Unidos, ambos justificados porque os salários estão na linha de pobreza”. Nos EUA, continua o vídeo, funcionários não podem contribuir para o Social Security, mas contribuem para a previdência brasileira pela alíquota máxima, “entretanto não temos o benefício integral. Podemos gozar apenas de aposentadoria. Não temos direito ao FGTS no Brasil e tampouco ao 401K, que é o equivalente aqui nos EUA. Não recebemos seguro desemprego no Brasil e nem nos Estados Unidos”. (O vídeo na íntegra pode ser visto no Youtube.com, intitulado “Comunicado da AFLEX #1 – 15 de maio de 2014”). No Congresso, o grupo é ajudado pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que tenta aprovar um projeto de lei no Senado para tornar obrigatório que representações diplomáticas do Brasil no exterior contratem funcionários com base nas Consolidação das Leis do Trabalho.
Salários
Segundo a AFLEX, os funcionários locais em Miami recebem de $2.230 a $3.000, dependendo da área de atuação e tempo de trabalho.Em março de 2013, o Itamaraty disponibilizou consulta dos diplomatas que estão no exterior. As informações podem ser acessadas no Portal da Transparência do Governo Federal (www.portaldatransparencia.gov.br).
Segundo o site, o cônsul-geral Hélio Vitor Ramos Filho, recebe mensalmente $8.783.24 dólares, mais a ajuda de custo de $9.116,63 dólares mensais.
O salário de um cônsul-adjunto, o que é o caso dos secretários Bruno Abreu, Fernando Arruda, Bruno Rodrigues, Alexandre Scudiere e Luiz Koury, varia entre $5.500 e $6 mil dólares, com ajuda de custos variando de $2.500 a $3.800 dólares.
*As iniciais são fictícias para proteger a identidade do funcionário.
Jornal local expõe problemas enfrentados para
tirar o visto para a Copa do Mundo
Em matéria do dia 16, o jornal “Miami Herald” expôs os problemas enfrentados por torcedores que têm lotado o Consulado de Miami diariamente, com longas filas e burocracia para tirar o visto para a Copa do Mundo no Brasil.
A matéria disse que a espera chega a ser de cinco horas para apenas três janelas prestando serviços. Depois disso, quando finalmente são atendidas, as pessoas descobrem que não têm algum documento obrigatório para retirar o visto especial da Copa (válido por três meses e gratuito) ou que o “Money Order” levado para o visto de 10 anos não pode ser aceito. O consulado aceita somente “Money Order” do US Postal Service, nenhuma outra forma de pagamento e não tem mais os caixas eletrônicos do Banco do Brasil.
Dois americanos residentes em Orlando tiraram folga no dia 15 para resolver a questão do visto em Miami. Eles ficaram decepcionados quando descobriram que não são aceitos nem e-mails de confirmação da compra de ingressos, ou qualquer outra prova que não fossem documentos originais.
Randy Jonda, que também veio de Orlando até o Consulado de Miami, disse que pensou que o processo seria mais fácil. “Me incomoda porque não há uma política uniforme para os vistos. Tenho um amigo em Boston que tirou o visto em 30 minutos, sem nenhum problema. Ele não precisou de um certificado, somente um recibo. Para mim, seria mais fácil voar para Atlanta ou Boston e tirar meu visto por lá”.
J.S. disse que depois de a matéria ser publicada, houve uma mudança nas exigências de documentos para entrar com pedido para o visto especial da Copa. Agora, em vez de documento, como o próprio ingresso ou certificado da FIFA, o Consulado aceita documento que tenha número de confirmação da compra do ingresso (a informação não foi comprovada). Além disso, em vez de três janelas, foram abertas cinco para o atendimento, o que agilizou o procedimento.