Há joelhos sobre os pescoços de muitos

Por Arlaine Castro

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Os Estados Unidos vivem a mais grave onda de manifestações desde 1968, após o assassinato do líder de direitos civis Martin Luther King Jr. Desta vez, o estopim dos protestos foi a morte de George Floyd, um americano negro de 46 anos, que foi sufocado por um policial branco, que se ajoelhara sobre seu pescoço por mais de 8 minutos. Na verdade, não só nos EUA, mas pelo mundo todo pessoas protestam contra a violência policial principalmente contra negros. Mas por que a Morte de George Floyd gerou uma onda tão grande de protestos? A imagem capturada em vídeo por uma testemunha, mostrou o policial com o joelho sobre o pescoço de Floyd, que, deitado na rua e imobilizado, dizia "não consigo respirar". Pessoas que pararam para ver o que estava acontecendo mal sabiam que estavam testemunhando mais um ato de brutalidade que culminaria numa onda de protestos mundo afora. "O que pôs tudo isso em marcha foi o brutal assassinato de George Floyd na semana passada. Foi o catalisador, o que levou as pessoas às ruas", disse Ashley Howard, professora assistente de História e Estudos Afro-americanos da Universidade de Iowa à BBC Mundo. Ainda há joelhos sob o pescoço de muitos. O que não faltam nas redes sociais são casos semelhantes. Negros dizendo que são detidos pela polícia pelo simples fato de serem negros. E como cita a análise da BBC na matéria intitulada "Morte de George Floyd: 4 fatores que explicam por que o caso gerou uma onda tão grande de protestos nos EUA", dados indicam que isso não é apenas uma percepção. "Um artigo de Rashawn Ray, do centro de pesquisas Brookings Institution, afirma que pessoas negras têm 3,5 vezes mais chances de serem mortas por policiais do que brancas em situações em que não existe ataque ao policial ou porte de armas. Entre adolescentes, a probabilidade é 21 vezes maior. A polícia americana mata uma pessoa negra a cada 40 horas", informa a matéria. O movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam) ganhou ainda mais vida em várias cidades do mundo em praticamente todos os continentes. Manifestantes pacíficos destacaram acusações de abuso a presidiários negros em cadeias, desigualdades sociais e econômicas, e o racismo institucional persistente no passado colonial de países como a Holanda, Reino Unido e a França. O racismo estrutural mais do que nunca vem à tona para mostrar que a sociedade ainda precisa evoluir no quesito justiça social e igualdade. E isso não é demagogia. A população negra tem 2,7 mais chances de ser vítima de assassinato do que os brancos no Brasil, aponta o informativo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil, divulgado em novembro de 2019 no Rio de Janeiro, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De acordo com dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, no Brasil, foram registradas 255 mil mortes de pessoas negras por assassinato de 2012 a 2017. Um outro exemplo é a explosão de casos de negros que são hospitalizados ou morrem por Covid-19 que tem escancarado as desigualdades raciais no Brasil: entre negros, há uma morte a cada três hospitalizados por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARG) causada pelo coronavírus; já entre brancos, há uma morte a cada 4,4 hospitalizações. Os dados são resultado de uma análise feita pela Agência Pública com base nos boletins epidemiológicos do Ministério da Saúde que possuem informações de raça e cor de internações e mortes por coronavírus. Há que se entender que, quando se fala em "vidas negras importam", é porque elas precisam ser ditas em alto som porque, se houvesse igualdade perante as raças, nada disso seria necessário. Já ouviu ou presenciou uma manifestação "vidas brancas importam"? Claro que não, pois isso seria um desrespeito e deboche tendo em vista que brancos jamais precisaram provar nada para ninguém por causa da cor de sua pele.