Em declaração logo depois que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, decidiu autorizar a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, ela logo de pronunciou em declaração oficial. “Recebi com indignação a decisão do senhor presidente da Câmara de abrir o processo de pedido de impeachment. São inconsistentes e improcedentes as razões que fundamentam esse pedido”, disse Dilma. “Tenho a convicção e absoluta tranquilidade quanto à improcedência desse pedido, bem como o seu justo arquivamento. Não podemos deixar que as conveniências indefensáveis e os interesses abalarem a democracia e a estabilidade de nosso país. Devemos ter tranquilidade e confiar nas nossas instituições e no Estado democrático de direito. Não existe nenhum ato ilícito praticado por mim. Não paira contra mim nenhuma suspeita de desvio de dinheiro público. Não possuo conta no exterior”.
A base jurídica do pedido de impeachment é motivo de debate entre alguns dos juristas mais respeitados do país.Veja a opinião de dois deles:
Dalmo Dallari: ‘Não há consistência jurídica’
O jurista Dalmo Dallari, um dos nomes mais respeitados do meio jurídico brasileiro, disse que o está surpreso.Dallari, que meses atrás emitiu um parecer jurídico a pedido do advogado de defesa da presidente Dilma Rousseff avaliando suas chances de se defender de um potencial pedido de impeachment, diz que continua “absolutamente convencido de que não existe fundamento legal para a propositura do impeachment” e de que o pedido “não tem a mínima chance de levar ao impedimento da presidente”.
“De fato não há consistência jurídica. Eu examinei todas as hipóteses, todos os pareceres e argumentos do pedido de impeachment. Estou absolutamente convencido de que não existe nada de consistente neste pedido”, afirma. Questionado especificamente sobre as chamadas pedaladas fiscais do governo para fechar suas contas, principal argumento do pedido de impeachment formulado pelos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr e aceito no dia 2, Dallari diz não ter identificado crime de responsabilidade fiscal.
“As pedaladas não caracterizam o crime de responsabilidade fiscal porque não houve qualquer prejuízo para o erário. As pedaladas configuram um artifício contábil, mas o dinheiro não sai dos cofres públicos, então não ficam caracterizados os crimes de apropriação indébita ou desvio de recursos”, diz.
“Não há nada nas pedaladas ou no pedido de impeachment que identifique uma responsabilidade da figura da presidente da República”, complementa o jurista.
Para Dallari, aceitar o pedido de impeachment era “a única e a última carta na manga” do presidente da Câmara dos Deputados.
“Ele está muito pressionado pelo risco de perda de seu próprio mandato, porque há muitos elementos contra ele. Com este artifício ele vai tentar coagir o PT e outros partidos que apoiam a presidente para que deem apoio a ele”, diz.
Ives Gandra Martins: ‘Evidências são inúmeras, a base jurídica é ainda maior’
Autor do primeiro parecer jurídico favorável ao impeachment, o jurista e professor emérito da Universidade Mackenzie Ives Gandra Martins acredita que, agora, dez meses depois de ter escrito o documento, a base jurídica para depor a presidente é ainda mais concreta.
“De lá para cá, as evidências que apareceram são inúmeras. Quando dei o parecer sobre a culpa da presidente nos escândalos da Petrobras, o ex-tesoureiro do PT (João Vaccari Neto) ainda não tinha sido preso, Delcídio Amaral (senador e então líder do governo no Senado) também não”, disse. “Hoje a situação é muito mais complicada. A base jurídica é muito maior”. Segundo Martins, outros prefeitos já foram afastados por crimes de culpa – sem comprovação de dolo, ou seja, de participação direta no crime – e, portanto, a “negligência e a imprudência” da presidente ao cometer as chamadas pedaladas fiscais já são o suficiente como argumentos jurídicos para tirá-la do cargo.
“Pedaladas fiscais são gravíssimas e tiveram consequências no segundo mandato. Elas foram julgadas no segundo mandato. E toda hora aparecem escândalos”.
“Não estou dizendo que a presidente Dilma é responsável dolosamente por esses crimes, mas culposamente, por negligência, imprudência”, completou. Fonte: BBC Brasil.