Ignorância

Por Gazeta Admininstrator

Houve dois espetáculos, na noite do último sábado, em Miami, quando da histórica apresentação de Roberto Carlos na American Airlines Arena.

O primeiro espetáculo, e mais importante, sob todos os pontos de vista, foi a extraordinária apresentação do “Rei”, sem dúvida, o artista brasileiro mais popular e admirado em todo o mundo.

Um show impecável, produção do mais alto nível e Roberto Carlos, se aproximando dos 70 anos, como os melhores vinhos, cada vez melhor intérprete, cada vez mais senhor absoluto de sua majestade artística. Um ídolo em sua plenitude.

O segundo espetáculo não teve nada de brilhante. Nada mesmo. Foi o “show” da falta de educação e ignorância dado por alguns brasileiros que, refletindo total incapacidade de conviver com qualquer outra cultura que não a sua, vaiou o “Rei” toda vez que ele cantava uma canção em Espanhol. Isso mesmo. Pelo simples fato de Roberto Carlos estar cantando num outro idioma, a platéia se comportou como se estivesse num circo, ou numa arena de luta livre.

Infelizmente, esse comportamento bizarro de parte da platéia brasileira foi uma desencantadora repetição do que já havia ocorrido nos shows em Boston e New York.

Não há qualquer explicação possível para entender porque alguns brasileiros se sentem “agredidos” quando assistem nossos artistas cantando em outros idiomas. Caetano Veloso sofre o mesmo tipo de agressão toda vez que canta canções em inglês ou espanhol em suas turnês norte-americanas.

Com o tempo, Caetano vem sendo menos “alvejado”, até porque sua platéia nos Estados Unidos é cada vez mais plural.

No caso de Roberto, a “mensagem” enviada por um pequeno – mas muito barulhento – grupo de brasileiros, foi uma mensagem de intolerância, agressividade e burrice.

O cantor ficou tão constrangido que passou a iniciar as canções originalmente previstas para serem interpretadas em espanhol, com versos em Português. Mas nem isso acalmou a “sanha” dos malcriados.

Cerca de 70% da platéia do show de sábado em Miami era composta por hispânicos, que idolatram Roberto, e que aplaudiam suas interpretações em Português com o mesmo respeito e carinho que aplaudiam as interpretações em Espanhol. Esse número em New York também foi de 70% e, em Boston, superior a 60%. Também nesses dois eventos a gritaria, algazarra e vaias ao cantor brasileiro ecoa-
ram todas as vezes que ele cantou algo em Espanhol. Uma vergonha !

Não é de hoje que se sabe que o comportamento de parte de nossa comunidade em eventos públicos não é exemplar. A falta de educação doméstica viaja junto nos aviões que trazem muitos imigrantes brasileiros aos Estados Unidos.

Não é exatamente uma surpresa essas demons-trações de falta de civilidade e respeito. O que iuntriga é o fato dos brasileiros que vivem nos Estados Unidos, um país de clara pluralidade étnico-cultural, se coloquem no papel de avacalhar uma comunidade (a Hispânica) que sempre tratou nossos artistas com o máximo de respeito, carinho e dignidade. Há quatro décadas, Roberto Carlos não é apenas patrimônio do Brasil.

É um dos maiores artistas do mundo, com público cativo em mais de 40 países e vendendo muito mais discos fora do que dentro do Brasil, por razões óbvias.

Só mesmo brasileiros que estão aqui para “passar uma chuva” e “anarquizar” podem se prestar ao papel que se prestaram nesses shows. Agredir os hispânicos é agredir a própria essência do que é mais importante na vida nos EUA: a convivência harmônica (pelo menos na aparência, politicamente correta) entre as diferentes comunidades. Enfim, esse episódio, que não tem nada de inédito, foi uma lástima. Só que em proporções maiores, já que o show de RC na American Airlines Arena foi o maior show de um artista brasileiro já realizado na Flórida.

O espetáculo impecável ficou manchado pela ignorância de pessoas que não estão preparadas para viver numa comunidade internacional.

Têm dinheiro para pagar um ingresso caro para ver um dos maiores artistas do mundo, que orgulhosamente é brasileiro, mas é só o que têm, o dinheiro. Não tem o nível de educação, cultura e respeito para que possam merecer o talento do Rei.