Com imagem desgastada, CRBE será reavaliado em 2013

Por Marisa Arruda Barbosa

Representantes do CRBE na América do Norte: Ronney Roger Oliveira, Ester Sanchez-Naek, Silair Almeida e Fausto Rocha.

Terminou, no dia 24 de novembro, o mandato de dois anos do primeiro grupo do CRBE (Conselho de Representantes de Brasileiros no Exterior). Porém, seu futuro, em vez de ter renovação automática, conforme previsto, deve ser reavaliado pelo governo brasileiro. O GAZETA ouviu os quatro representantes da América do Norte (Região II): Fausto Rocha (de Massachusetts), Silair Almeida (Pompano Beach, FL), Ester Sanchez-Naek (Connecticut) e Ronney Roger Oliveira (Orlando, FL).  Enquanto um fala que o projeto foi um “sucesso total” na medida do possível, outro vê o CRBE como “um erro”. Um deles, ainda, teme sua interrupção.

Desde o início, quando representantes foram eleitos, em novembro de 2010, o CRBE nunca teve sua identidade e seu real papel definidos, conforme poderá ser visto nas considerações de cada um dos representantes.

Ao longo desses dois anos, muitos passos foram dados, como avaliam os conselheiros, mas também as disputas internas dentro do Conselho em todo o mundo foram motivos de desgaste não só dos conselheiros, como da imagem do CRBE perante o governo brasileiro.

Como o próprio Itamaraty avaliou, em comunicado enviado por e-mail ao GAZETA, a criação do Conselho, bem como a experiência acumulada no período, “foram importantes passos no processo de consolidação do diálogo com a sociedade civil e de formulação de políticas públicas para a diáspora brasileira”.

De fato, segundo a prestação de contas publicada no site do Itamaraty, intitulado “Brasileiros do Mundo”, muitos resultados foram alcançados até o momento, como uma maior quantidade de Consulados Itinerantes, a liberação do recebimento do FGTS fora do país, projetos educacionais, como a difusão da importância do ensino de português no mundo e a validação e reconhecimento de diplomas brasileiros no exterior, entre outros. O Itamaraty disse que irá estimular, ao longo do primeiro semestre de 2013, uma reflexão, visando o aperfeiçoamento e ajustes necessários para a definição do segundo mandato.

Até o dia 1º de março de 2013, o Itamaraty informou que Embaixadas e Consulados do Brasil no exterior realizarão reuniões públicas para avaliar o Conselho. Depois disso, até o final do primeiro semestre de 2013, serão realizadas novas eleições, informou o Itamaraty.

O que dizem os membros do CRBE da América do Norte

“Não vejo um futuro para o Conselho se o governo continuar agindo de cima para baixo”, Fausto Rocha (Massachusetts) Fausto diz que esse primeiro mandato do CRBE foi um aprendizado, no qual muitas metas foram cumpridas. “Mas poderia ter sido melhor se o governo brasileiro tivesse feito a sua parte”, disse ele, por telefone ao GAZETA.

De acordo com Fausto, a exigência de uma reunião a cada seis meses estava no decreto, e na verdade só teve uma reunião inicial. “Eu não sei por que não foi dado continuidade a isso e o governo acabou nos cozinhando em ‘banho Maria’”, disse.

Quanto à identidade do CRBE, Fausto explica que o papel do Conselho é consultivo e não executivo, algo que nem todos entenderam até o momento. “Muitos ficaram esperando que executássemos algo que na verdade cabe ao governo brasileiro”, disse ele.

Fora isso, Fausto avalia que houve falta de coesão e desentendimentos dentro do próprio grupo, o que serviu de obstáculo para uma melhor aproximação do grupo com o governo brasileiro. “Tinha gente que queria que fosse criada uma secretaria, um ministério, mas ainda é cedo se nem definimos o nosso papel”, disse. “Esse seria um passo a ser dado mais para frente”. Fausto diz que essa decisão de reavaliar o CRBE mostra bem como o grupo não se aproximou do governo, que decidiu de cima para baixo, sem nenhum diálogo. “Se eu fosse dar uma nota de 1 a 10, eu daria 7”, conclui.

“Não podemos perder o CRBE, que é uma conquista dos brasileiros após anos de luta”, Silair Almeida (Pompano Beach, Flórida)

Para Silair, o risco de extinção do CRBE é um retrocesso. “Não podemos perder o CRBE, que foi uma conquista dos brasileiros e é um veículo muito importante de comunicação entre as comunidades e o governo”, disse.

O conselheiro Silair faz questão de deixar claro que a falência do CRBE se deve somente à inadequação dos conselheiros e que o governo brasileiro, em todos os momentos, cumpriu com a sua parte. “Vários projetos, demandados pela própria comunidade e que constavam no plano de ação do CRBE, foram financiados pelo governo brasileiro e devidamente executados pelos Consulados brasileiros ou outras entidades. O governo cumpriu a sua parte. Quem errou foram os próprios membros do Conselho, que nunca souberam de fato a sua função”, destaca.

Silair também vê a confusão de alguns líderes de achar que o Conselho tem função executiva. “Nosso dever era intermediar o diálogo do governo com as comunidades. Num primeiro momento isso foi realizado, mas, nos meses seguintes, as ‘agendas pessoais’ de alguns membros do CRBE foram mais importantes do que a agenda comunitária. Não houve mais diálogo com a comunidade. Depois de estabelecido o conselho, os membros do CRBE não mais interagiram com as comunidades. O conselho só brigou!”, critica. Ele destaca que a falta de verba para a locomoção dos membros e, com isso, a falta de reuniões, foi um impedimento na proximidade do conselho.

Silair destaca as metas alcançadas, mas lembra que há uma grande lista que ainda não foi cumprida, motivo pelo qual a comunidade brasileira deveria continuar lutando por sua continuidade.

“Não há necessidade para outro CRBE”, Ester Sanchez-Naek (Connecticut)

Para Ester, o que faltou desde o início foi uma orientação dos conselheiros, logo depois das eleições.

“Depois que fomos eleitos, perguntei ao Eduardo Gradilone (sub-secretário das comunidades brasileiras no exterior): ‘o que fazemos agora?’ E ele respondeu: ‘faça o que você sempre fez”, disse ela.

Além de não direcionar os membros, o Itamaraty passou a ser um “concorrente” do CRBE, avalia Ester. “Os diplomatas passaram a usar o que fazíamos como prestação de contas do que os consulados faziam”, disse. “Eles não valorizaram quem faz para dizer que foram eles que fizeram”.

Ester acha que não há necessidade de outro CRBE, mas sim das Conferências Brasileiros no Mundo, realizadas pelo Itamaraty, quando líderes comunitários do mundo todo se encontram para trocar experiências. Mas, segundo ela, houve somente três até o momento, sendo que a última foi logo depois das eleições do CRBE. “Ou seja, desde que o CRBE começou, não temos mais a Conferência. Já era para estarmos na quinta”, disse.

Segundo Ester, a conferência tem que ser uma iniciativa do Itamaraty e não de eventos privados, com fins lucrativos. “E tem que ser realizada no Brasil”, acrescenta. “Eu acho que o CRBE só serviu para nos desgastarmos e para a troca de insultos, por isso foi um erro”.

“O CRBE foi sucesso total”, Ronney Roger Oliveira (Orlando)

Eu vejo o CRBE como um sucesso total”, disse Ronney Oliveira ao GAZETA. “Não tivemos ajuda de custo, passamos pela mudança para o governo Dilma e conseguimos alcançar muitas metas mesmo assim”.

Ronney avalia como um grande ganho aos brasileiros de Orlando a realização com mais frequência de Consulado Itinerantes. “Cada um fez um trabalho bonito nas bases, e mais, um trabalho voluntário”, disse Ronney. “É claro que sempre esperamos mais, mas olhando antes e depois, foram muitas as mudanças. Os primeiros dão as cabeçadas e abrem as portas”.

O maior problema, segundo Ronney, foi um dos representantes na Europa, Ruy Martins, que era suplente e acabou assumindo como titular. “Ele tentou derrubar o CRBE e isso acabou desanimando o governo brasileiro”.