EUA deportaram 30 crianças brasileiras para o Haiti, diz organização

Por Arlaine Castro

Haitianos deportados dos Estados Unidos desembarcam no Aeroporto Internacional Toussaint Louverture em Port-au-Prince, Haiti, em 26 de maio de 2020.

Trinta crianças brasileiras já foram deportadas pelos Estados Unidos para o Haiti em meio à grave crise de migração que levou cerca de 15 mil haitianos à cidade texana de Del Rio, na fronteira com o México, nos últimos dias.

A informação foi dada à BBC News Brasil pela Organização Internacional para as Migrações (OIM), braço da Organização das Nações Unidas (ONU) dedicada ao monitoramento do fluxo migratório ao redor do mundo.

As crianças brasileiras têm, em sua maioria, até três anos de idade e estavam acompanhadas pelos pais haitianos, com quem fizeram a jornada para sair do Brasil e atravessar as Américas do Sul e Central até chegar à divisa entre México e EUA há pouco mais de uma semana.

Desde que a crise estourou, cerca de 3,5 mil pessoas já foram embarcadas em voos americanos para Porto Príncipe, a capital haitiana. Ao descobrir para onde tinham sido levados, alguns haitianos reagiram com indignação e revolta e tentaram voltar à aeronave dos EUA.

Além dos 30 menores de idade brasileiros deportados, 182 crianças chilenas estão na mesma condição.

"As crianças brasileiras não apresentavam qualquer problema maior. Caso contrário, seriam encaminhadas para assistência específica", afirmou à BBC News Brasil Giuseppe Loprete, chefe da missão da OIM em território haitiano, que acompanha a situação dos deportados.

Segundo Loprete, por terem pais haitianos, as crianças são também consideradas haitianas segundo as leis do país caribenho, embora não tivessem documentos para comprovar essa nacionalidade.

"Eles podem obter documentos haitianos aqui, certidão de nascimento e carteira de identidade. As autoridades locais já informaram que irão facilitar isso. Mas enquanto eles estão fora do país, é difícil que consigam essa documentação", explicou Loprete.

Segundo a Constituição Federal, por terem nascido em território do Brasil, mesmo que de pais estrangeiros, os filhos dos haitianos são também considerados brasileiros natos. E por isso eles detinham apenas documentação brasileira ao serem encontrados e deportados pelos americanos.

Questionado sobre o que aconteceria com essas crianças, o chanceler haitiano Claude Joseph disse à CNN: "Estamos pedindo solidariedade na região. Falei com minha embaixadora no Brasil e ela disse que os brasileiros estão dispostos a aceitá-los de volta com suas famílias."

Ele acrescentou que pretende falar com outros governos regionais cujos cidadãos estão entre os deportados.

O Itamaraty disse que "não foi notificado, até agora, sobre o assunto relatado", mas que será prestada assistência consular aos cidadãos brasileiros.

Haitianos do BR para os EUA

A partir de 2010, quando um terremoto devastou o Haiti e matou centenas de milhares de pessoas, o Brasil passou a ser destino de migração de haitianos.

O enviado especial dos EUA para o Haiti, Daniel Foote, renunciou ao cargo em protesto contra o tratamento dispensado aos haitianos. Em uma carta pública à Casa Branca, ele disse que "não se associaria à decisão desumana e contraproducente dos Estados Unidos de deportar milhares de refugiados haitianos", citando as sucessivas crises humanitárias no país caribenho.

Nos últimos anos, porém, a recessão brasileira e a desvalorização do câmbio, que achatou a renda remetida pelos haitianos aos familiares no país de origem, levaram muitos a migrarem para o Chile ou outros países da região.

No ano passado, em um novo capítulo nessa jornada migratória, muitos grupos passaram a se destinar aos EUA, onde tentavam chegar atravessando mais de uma dezena de países a pé.