Brasileiro que mentiu cidadania dos EUA por 20 anos se declara culpado e deve ser extraditado

Por Arlaine Castro

Ricardo César Guedes roubou a identidade de William Ericson Ladd, um americano nascido em 1974, em Atlanta.

O brasileiro Ricardo César Guedes, que mentiu ter a cidadania dos EUA por 20 anos se declarou culpado e deve ser extraditado para o Brasil após cumprir pena.

Guedes roubou a identidade de uma criança morta e viveu mais de duas décadas como se fosse um cidadão americano. Ele foi condenado a um ano de prisão, conforme decisão anunciada na quinta-feira, 21, pela Corte Distrital do Sul do Texas.

Ele se declarou culpado pelas acusações de falsificar a identidade de um cidadão americano e de dar informações falsas ao solicitar um passaporte americano, e se comprometeu a fazer um tratamento psicológico e poderá obter o direito à liberdade condicional. O tribunal o dispensou do pagamento de multa.

De acordo com o jornal Houston Chronicle, o brasileiro disse à Justiça que sente muito pelo crime que cometeu, e que ele sabia que o que ele fazia não era certo. Guedes afirmou também que não quis prejudicar ninguém, mas, sim, tentar um espaço no mercado de trabalho.

O juiz afirmou que acredita em Guedes, que teria mostrado um verdadeiro arrependimento. “Um bom homem que basicamente cometeu um erro muito trágico para perseguir seu sonho”, descreveu o magistrado George Hanks Jr..

Entenda o caso

Investigadores americanos descobriram que Guedes passou mais de duas décadas dizendo ser William Ericson Ladd, um americano nascido em 1974, em Atlanta.

O verdadeiro Eric Ladd morreu em 1979, aos cinco anos, mas foi com esse nome que Guedes fez carreira de comissário de bordo. Por quase 25 anos, trabalhou na United Airlines. Ele também era conhecido na comunidade da aviação brasileira e costumava participar de eventos e palestras, chegando a integrar voos humanitários em meio à retirada das tropas ocidentais do Afeganistão, em agosto de 2021.

Nascido em São Paulo, em 1972, segundo o governo americano, ele entrou duas vezes no país com o nome brasileiro e visto de turista, em 1994 e 1996.

No ano desta segunda viagem, ficou mais tempo do que a autorização permitia e começou a trabalhar em uma pizzaria. Nesse local, um supervisor ofereceu ajuda com os documentos. Foi então que ele começou a usar os documentos de William Ericson Ladd.

Como tinha o  curso de comissário de bordo, mas não conseguia emprego no Brasil, disse em sua defesa que buscou  o sonho nos EUA. Ele contou que nos EUA o setor aéreo aceita mais homens gays. Em 1997, foi contratado pela United.

Seu primeiro passaporte americano foi emitido em 14 de abril de 1998. Ele renovou ou pediu alterações (como mais páginas, já que pela profissão viajava muito) no documento outras seis vezes, sem levantar suspeitas.

A luz de alerta foi acesa em 2020, quando Ladd se casou com um brasileiro e pediu a alteração do passaporte, para incluir o sobrenome do marido. O Escritório de Assuntos Consulares do Departamento de Estado estranhou que o número de seguridade social tivesse sido emitido só quando ele tinha 22 anos –o documento muitas vezes é expedido para bebês, que precisam ser inscritos em planos de saúde dos pais ou em programas de benefícios do governo.

O órgão então identificou outra pessoa de mesmo nome, data e local de nascimento, o verdadeiro William Ericson Ladd. Foi aí que a investigação começou. Ao pesquisar a vida de Guedes, encontraram uma série de laços com o Brasil –como o fato de ter ido ao país em mais da metade das 40 viagens que fez ao exterior naquele 2020.

Nas redes sociais dele, o governo americano identificou uma brasileira que parecia, pelas fotos e publicações, ser sua mãe. O Consulado Geral dos EUA no Recife foi acionado, e bases de dados apontaram que ela tinha um filho, nascido no Brasil, com mais ou menos a mesma idade do suspeito.

Os americanos, então, compararam as impressões digitais que o governo brasileiro tinha coletado, nos anos 1990, do filho da mulher e confirmaram que Ricardo César Guedes e aquele que se apresentava como William Ericson Ladd eram a mesma pessoa. O passo seguinte foi consultar a família Ladd, que confirmou a morte do menino em 1979 e disse que nunca havia visto a pessoa que se passava por ele.

Depois de quase um ano de investigações, Guedes foi preso em 22 de setembro de 2021, no aeroporto George Bush, em Houston. Os agentes o encontraram no portão de embarque e o levaram até uma sala privada, onde ele se identificou como William Ericson Ladd e apresentou o passaporte.

No interrogatório, ele foi alertado: é crime mentir a um agente federal, e o governo sabia de sua identidade verdadeira. Ele respondeu que nasceu nos EUA, mas foi criado por pais missionários no Brasil.

O processo que tramita na Justiça do Texas relata que um policial afirmou que tinha uma certidão de óbito do verdadeiro Ladd, o que fez Guedes se calar. As autoridades ainda mostraram uma foto do túmulo da criança morta, no Alabama. O brasileiro então invocou seu direito de ficar calado e foi detido.

Na prisão, quando a polícia foi colher suas impressões digitais, Guedes perguntou qual nome deveria preencher no formulário. Segundo o processo, ao ouvir que deveria escrever seu nome verdadeiro, assinou "R. Cesar Guedes".

Com um mandado de busca e apreensão, autoridades encontraram na casa dele, em Houston, duas cópias da certidão de nascimento de Ladd e um cartão com seu nome verdadeiro. Na ocasião, o marido disse aos agentes que o conhecia desde a infância, no Brasil, e que sabia que ele não era quem dizia ser. Segundo a acusação, o parceiro deveria perder a autorização para viver nos EUA, já que entrou com o processo na imigração com base no casamento com um falso cidadão americano. Com informações do Houston Chronicle e AFP.