Jovens indocumentados no limbo: após 10 anos, qual o futuro do DACA?

Criado por ordem executiva, o programa já beneficiou mais de 700 mil jovens imigrantes, mas enfrenta um "limbo".

Por Arlaine Castro

Um dos jovens beneficiados pelo programa, Flávia de Souza, 23, conseguiu entrar na universidade de Massachusetts graças ao DACA.

Os Estados Unidos têm atualmente em torno de 700.000 jovens imigrantes que não são nem residentes permanentes, nem cidadãos americanos. Eles são beneficiários do DACA (Deferred Action for Childhood Arrivals), podem estudar e trabalhar e estão temporariamente protegidos da deportação.

Na quarta-feira, 15 de junho, o DACA completou 10 anos. Nesse período, de acordo com o Migration Policy Institute, milhares de jovens que foram trazidos para os EUA de forma ilegal quando crianças, foram beneficiados. Mas a política criada em 2012 por meio de ordem executiva do governo Obama permanece com seu futuro incerto.

Atualmente, 611.470 pessoas (5.780 deles, brasileiros) possuem o status de DACA, de acordo com os Serviços de Cidadania e Imigração dos Estados Unidos (USCIS). No entanto, o programa não fornece um caminho para a residência permanente ou a cidadania dos EUA e os jovens que completam 21 anos ficam em um limbo em seu 'status' imigratório.

Batalhas judiciais

Desde a sua criação, o DACA tem sido objeto de inúmeros processos judiciais. O ex-presidente Donald Trump tentou encerrá-lo em 2017, mas a Suprema Corte decidiu contra o governo por motivos processuais.

Agora, o programa está enfrentando um novo desafio judicial. Em 6 de julho, o Tribunal de Apelações do 5º Circuito dos EUA ouvirá argumentos em uma ação do Texas que contesta a sua legalidade. Em 16 de julho de 2021, o Tribunal Federal para o Distrito Sul do Texas concluiu que o DACA é ilegal.

Com isso, o Departamento de Segurança Interna ficou impedido de aprovar novos pedidos a partir de 16 de julho de 2021.

Qual o futuro do DACA?

Após a decisão do Texas, o secretário do DHS, Alejandro Mayorkas, anunciou uma regra proposta para manter o programa na regulamentação federal. Espera-se que o governo publique uma regra final do DACA nos próximos meses, mas os defensores da imigração disseram que também é provável que esta enfrente desafios legais.

Por isso, a menos que o Congresso interfira com uma solução legislativa, a legalidade final provavelmente acabará novamente na Suprema Corte.

"Se não houver alguma solução através do Congresso, uma lei que seja direcionada ao DACA, não tem muito o que fazer. O DACA vai ter que ser algo feito através de legislação porque, como ordem executiva, nunca vai dar uma solução definitiva para esses jovens. Eles precisam de uma legislação, de uma reforma imigratória que atenda os pontos do DACA. Fora isso, eles estão nesse limbo. Não há outra alternativa, a não ser também pela Suprema Corte, mas não creio que isso vá acontecer. Tem que ser por uma legislação do Congresso", explicou ao Gazeta News a advogada de imigração, Ingrid Domingues.

Quem são os beneficiários?

Alguns beneficiários do DACA chegaram legalmente, mas suas famílias ultrapassaram seus vistos; outros chegaram cruzando sem autorização a fronteira entre o México e os EUA. Eles estão agora na faixa dos 20 aos 30 anos e vêm de todo o mundo.

Os atuais destinatários ainda estão protegidos contra deportação e podem trabalhar. Eles devem renovar suas solicitações a cada dois anos, e o USCIS continua processando solicitações para aqueles que atendem aos requisitos originais e não deixaram o país desde a última renovação.

Para atender aos requisitos do programa, o candidato precisa estar matriculado no ensino médio, ter um G.E.D ou um diploma ou servir nas forças armadas dos EUA. Aqueles com antecedentes criminais – um crime, uma contravenção grave ou três contravenções – não são elegíveis para o DACA. Eles também tinham que ter menos de 31 anos em 15 de junho de 2012, se mudaram para os EUA antes de completar 16 anos e vivem continuamente nos EUA desde 15 de junho de 2007.

Bênção

Para a estudante brasileira Flávia de Souza, 22 anos, que mora com a mãe em Medford (MA), o fato dela ter conseguido entrar para o programa aos 16 anos foi essencial para que ela conseguisse trabalhar e ter acesso à uma boa educação e ensino superior.

“O DACA me ajudou muito porque foi no início da minha jornada de trabalho aos 16 anos. Foi num momento propício da nossa necessidade porque me permitiu ter o ‘permit work’ e o ‘social security’. Acho que essa lei deveria beneficiar também os pais e não somente as crianças, porque eles estão aqui há mais de 10 anos pagando impostos e são os mais necessitados porque trabalham, dirigem para todo lado. Se eles fossem beneficiados com carteira de motorista e social, por exemplo, daria mais segurança para manterem a família e estudar os filhos”, analisa a estudante, que cursa atualmente Designer em Summerville (MA).

"Na nossa vida, considero o DACA uma bênção de Deus porque abriu as portas para o que eu vim buscar nos Estados Unidos, que é a educação e formação da minha filha. Ela conseguiu o 'social security' e entrou para o programa logo no final da high school. Com isso, ela foi aceita na Universidade porque o programa dá essa chance, permite que imigrantes estudem em boas escolas. Ficou mais fácil para eu também conseguir financiar o estudo dela", ressalta orgulhosa a mãe, Keila Rhavena. Dedicada, Flávia, que chegou aos EUA com três anos de idade, ganhou inclusive quatro meses de cursos de qualificação em Harvard, segundo a mãe. "Ela é muito dedicada e sempre foi boa aluna, mas sem o DACA, ela até poderia conseguir estudar, mas não seria tão bom e importante como está sendo hoje, uma realização de vida", ressalta Keila. Para a família que veio do Brasil há 16 anos, o DACA é motivo de agradecimento.

"Nos favoreceu muito nesses anos. Ela tem mais tranquilidade para viajar, para conseguir um trabalho melhor. Ela foi como convidada para assistir a posse do presidente Donald Trump e foi sem problema nenhum porque pode viajar dentro do país. Tudo isso conta", acrescenta. Na iminência de não ser aprovado pelo Congresso nem pela Casa Branca, a brasileira lamenta. "Vai fechar as portas para muita gente boa e não só para as crianças, mas para os adultos também. É bom para o país ter jovens com acesso a boas universidades que vão fazer a diferença", finaliza.