Imóvel alugado já estava em foreclosure

Por Gazeta Admininstrator

Por: Letícia Kfuri.

Já havia sido retomado pelo banco o imóvel localizado no condomínio Rivie-ra, em Coconut Creek, quando foi alugado a um grupo de três brasileiros, em 28 de abril deste ano, pela corretora Elaine Tarantino, da imobiliária The Realty Branch, em Coconut Creek. Conforme informado pela reportagem do Gazeta, na semana passada, 20 dias após ocuparem o apartamento, os inquilinos foram despejados, mesmo tendo pago todos os valores devidos. A imobiliária eximiu-se de qualquer responsabilidade.

De acordo com os public records (registros públicos), o apartamento 311 locali-zado na Lyons Road 3874, em Coconut Creek, voltou a ser propriedade do financiador, a Wells Fargo & Company, em 12 de março de 2008. O contrato de aluguel foi efetuado em 28 de abril de 2008, portanto, 47 dias após a retomada do imóvel.

A unidade 311 aparece nos públic records em nome de Ana M. Martin que, de acordo com os locatários, e com informações da própria imobiliária, seria irmã de Carlos Guerra. Guerra figura no contrato como locador e, em favor dele, os locatários afirmam ter pago todos os valores referentes ao aluguel do imóvel.

- Nós mobiliamos tudo novo. Um dia cheguei do trabalho e não tinha mais nada. Tinha móveis lá fora jogados e o pessoal estava catando. A gente até agora não está acreditando na situação – disse na ocasião Fábio Maciel de Freitas, que está há menos de dois anos nos EUA, e trabalha em um serviço móvel de lavagem de carros.

Freitas alugou o apartamento junto com Anderson Júlio Moraes e um terceiro amigo, que preferiu não se identificar. Eles pagaram o primeiro mês de aluguel, no valor de $1.350, além de $450 referentes à primeira parcela do depósito, no valor total de $1.350, que foi dividido em três vezes.

A imobiliária recusou-se a assumir a responsabilidade pela devolução dos valores pagos pelos locatários. A corretora, inicialmente, disse à reportagem ter sido enganada. “Nós checamos e o imóvel não aparecia em foreclosure (processo de retomada do imóvel por falta de pagamento do financiamento). Eu procurei um advogado e ele me explicou que isso é public record. Algumas vezes, o corretor checa e não está em foreclosure e dois dias depois checa e está. Me sinto tão enganada quanto eles” , disse, na ocasião, a corretora à reportagem do Gazeta.

Novamente procurada pela reportagem, Tarantino disse apenas que se fosse de seu conhecimento que o imóvel estava em foreclosure ela não teria alugado. Ela afirma ter enviado, por correio, cópia da reportagem do Gazeta a Carlos Guerra (provável procurador da proprietária), solicitando que ele tomasse providências quanto ao despejo de seus clientes.

O broker e responsável pela imobiliá-ria, Adilson Chagas, disse entender que sua empresa não tem qualquer responsabilidade pelo despejo. “Ela (Tarantino) alugou o imóvel, disse que tinha checado, apesar de que não somos obrigados a checar (os public records). Não sei se ela desconfiou. Entendo que não temos ne-nhuma responsabilidade de ressarcir inquilinos.

Se realmente eles querem recuperar alguma coisa, têm que ‘dar um sue’ no dono (processá-lo). Me informei com advogados, e disseram que não somos obrigados a checar (os public records)”, disse Chagas, que não informou o nome dos advogados que lhe prestaram tal informação.

O advogado Max Whitney, especiali-zado em direito internacional, e há mais de 10 anos atuando também nas áreas civil e criminal, considerou, no mínimo, “surpreendente”, que algum advogado tenha prestado tal informação. “Se alguém aluga ou vende um carro alienado, no mínimo, o que está cometendo é uma fraude, por não se certificar da disponibilidade do bem. O mesmo acontece com um imó-vel. O agente imobiliário não representa o comprador, representa o vendedor e, por isso, é óbvio que tem que se certificar que o bem está disponível para negociação. Esse argumento de ‘eu não sabia’, não vale para a lei. Pela lei, não vale o que você sabe, mas sim o que deveria saber”, resume Whitney.

Ele esclarece que, legalmente, podem ser responsabilizados o locador (proprie-tário) e o agente (corretor). “Do ponto de vista do locador, em um caso como o descrito, cometeu fraude, apropriação indébita e roubo civil. Pode ser processado e a vítima receber até três vezes o valor do prejuízo, incluindo custos da corte e honorários advocatícios. A mesma coisa vale para o agente imobiliário. Os dois são processados simultaneamente.

Whitney afirma ter recebido em seu escritório, recentemente, reclamações semelhantes. “Mais uma vez, oriento que, antes de assinar qualquer documento aqui nos EUA é necessário, primeiro, consultar um advogado”. Ele orienta, também, que pessoas que estejam enfrentando o mesmo problema, podem entrar com uma ação em conjunto. “A ação conjunta reforça porque, quando chegar na hora de prestar depoimentos, apresentar testemunhas, o juiz vai analisar: ‘Está todo mundo mentindo sobre a mesma coisa?’. A ação conjunta é mais sólida na fase de apresentação de provas”, explica.

Mais
Ana M. Martin, de acordo com os pu-blic records é proprietária de, pelo menos, três imóveis no mesmo condomínio, todos levados a foreclosure. Carlos Guerra também aparece como proprietário des diversos outros imóveis no mesmo condomínio. Nenhum deles consta como estando em processo de foreclosure. Ambos foram procurados pela reportagem do Gazeta e não foram localizados.

Após a publicação da reportagem da semana passada, a faxineira Suzi Reis procurou a reportagem do Gazeta afirmando também ter enfrentado problema semelhante, seis meses após ter alugado um apartamento, no mesmo condomínio, por intermédio da mesma corretora, e da mesma imobiliária. Ela alugou a unidade 303 localizada no número 3844 da Lyons Road, por $950 mensais. Um dia, chegou em casa e a fechadura havia sido trocada. “Foi uma humilhação muito grande. Graças a Deus estava para vencer o outro mês e eu tinha o dinheiro do aluguel em mãos. Eu liguei para ver a posição do Carlos (Guerra). Ele disse que não sabia o que estava ocorrendo, que deveria ser um erro a troca da fechadura”, conta.

A corretora diz não conhecer a locatária. “Eu nunca ouvi falar dessa Suzi. Por intermédio da imobilária, que eu me lembre, isso não chegou ao meu conhecimento”, disse a corretora.

Chagas, responsável pela imobiliária, diz não lembrar exatamente do caso de Suzi Reis. “Houve uma pessoa que me ligou, talvez o marido dela. Mas, uma vez que alugamos, o que acontecer com o imóvel no futuro foge ao nosso controle”, disse.

No caso da unidade alugada por Suzi, no entanto, a informação que consta nos registros públicos é que a decisão final da justiça para retomada do imóvel aconteceu em 5 de fevereiro de 2008. O contrato de locação foi firmado em dezembro de 2007.

A atribuição de responsabilidades, em casos como esse, de acordo com especialistas ouvidos pelo Gazeta, pode ser discutida na justiça.