Indocumentados enfrentam caminhadas geladas para chegar ao Canadá

Por Gazeta News

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[caption id="attachment_137531" align="alignleft" width="300"] Fronteira entre EUA e Canadá: migrantes caminham horas por florestas nevadas. Foto: divulgação[/caption]

É cada vez maior o número de indocumentados que se arriscam a atravessar a floresta nevada na fronteira não protegida entre EUA e Canadá para chegar à cidade de Emerson, já do lado canadense, e, assim, escapar da possibilidade real de serem deportados em função das novas políticas migratórias que o governo do presidente Donald Trump vem implementando desde o último dia 20 de janeiro.

Não que os 700 habitantes de Emerson – uma pequena cidade agrícola de onde se enxerga a fronteira nevada com o Dakota do Norte e o Minnesota - estejam assustados ao ver "atravessadores da fronteira". Ao contrário. Frequentemente são os moradores que oferecem carona até o escritório da Agência Canadense de Serviços da Fronteira. Mas, até então, nunca os viram chegar em número tão grande como nos últimos 3 meses.

De acordo com a Agência Canadense de Serviços da Fronteira, nos últimos dois anos algumas poucas pessoas vêm atravessando a fronteira dos EUA em Manitoba para pedir asilo no país. Entretanto, pessoas que trabalham com refugiados em Winnipeg, a capital da província, dizem que o número de migrantes teve um aumento considerável desde o outono do ano passado para cá.

E o Conselho Interreligioso de Imigração de Manitoba, conhecido localmente como Welcome Place (Lugar de Boas-Vindas), reafirma esta informação. A entidade, que anualmente dá assistência a entre 50 e 60 candidatos a asilo, segundo sua diretora executiva, Rita Chahal, desde abril de 2016 já tiveram 300".

Travessia para lá de arriscada

Saindo de Emerson, os candidatos a refugiados geralmente vão de táxi até Winnipeg, cerca de 110 km de distância, onde dão entrada formal em pedidos de asilo, assistência jurídica e de bem-estar social. As audiências geralmente são marcadas para dentro de dois a três meses, mas não há garantias. Em 2015 o Conselho de Imigração e Refugiados aprovou 57,7% dos 16.521 pedidos de refúgio feitos em território canadense.

Casos como o de Bashir Yussuf, que viajou para Noyes, Minnesota, de onde partiu à noite para Emerson, e enfrentou três horas de caminhada e muita neve, tem se tornado mais comuns do que se imagina. "Eu entendi o que estava por vir", explicou o migrante de 28 anos, que escapou de seu país, a Somália, em 2013 para fazer uma viagem tortuosa de cinco meses até San Diego, onde pediu asilo, mas teve seu pedido rejeitado. "Sabia que Trump ia me deportar". Yussuf se preparou para o trajeto até Emerson e pagou $600 dólares a um guia para levá-lo até perto da fronteira. Mas, nem todos tem essa “estrutura”.

Outros candidatos a asilo não estavam adequadamente preparados para a travessia invernal. Um homem, Zurekaneni Issah Adams, usava apenas uma jaqueta jeans fina e luvas de marceneiro. Sua travessia levou sete horas. "Tivemos sorte. Deus nos salvou", disse Adams, 36 anos, que deixou Gana em 2014 e foi ao Brasil, de onde partiu a pé, de ônibus e de barco até a fronteira da Califórnia. Depois de passar 16 meses detido, disse Adams, seu pedido de asilo nos Estados Unidos foi recusado. No Canadá, ele tinha uma audiência de asilo marcada para a semana passada, mas ela foi adiada. "Tenho sonhos grandes", ele disse. "Não vou perder a esperança."

Para se ter uma ideia de como está essa situação, na manhã antes da chegada de Yussuf com outro somali, na noite do domingo, 5, outros 19 africanos já tinham chegado no lado canadense da fronteira, esfomeados e gelados depois de passar a noite atravessando campos agrícolas cobertos de neve. O número era tão grande que não cabia na pequena sala da agência de fronteira, por isso o salão comunitário foi usado para que os recém-chegados pudessem se aquecer, cochilar e fazer um lanche com chá, café e sanduíches de pão com Nutella.

O Canadá não fala sobre a quantidade exata de pessoas que pede o status de refugiadas depois de ingressar ilegalmente no país, mas uma brecha nas regras que regem os candidatos a asilo leva alguns a caminhar por até oito horas no meio da noite, em paisagens nevadas e sob o frio cortante das pradarias, para chegar a Emerson. Isso porque, quem consegue entrar no lado canadense e então apresentar-se aos guardas de fronteira têm esse direito.