Por Letícia Kfuri
A Procuradora-Geral do estado de New Jersey, Anne Milgram, considerou que a polícia local agiu inapropriadamente e violou uma lei estadual ao questionar a situação migratória do fotógrafo brasileiro Geraldo Carlos e do editor do jornal Brazilian Voice, Roberto Lima, ao ser chamada pelos dois para registrar a localização de um cadáver, no mês de setembro, em Newark. Na ocasião, os jornalistas tiveram as fotos do local apreendidas, a fim de que não fossem publicadas, e foram detidos pela polícia.
A legislação estadual de New Jersey proíbe, expressamente, que agentes policiais questionem a situação migratória de qualquer vítima ou testemunha de crime que solicite auxílio policial. Milgram recomendou que o policial responsável pelo caso sofra uma ação disciplinar, e que todos os policiais de Newark sejam submetidos a treinamento sobre o tema imigração.
O jornalista Roberto Lima criticou duramente a atitute da polícia local, e alertou para o risco de distanciamento entre a comunidade imigrante e as autoridades policiais. “As autoridades têm que se preocupar com o fato de que os crimes precisam ser denunciados. Eu creio que com esse tipo de postura, vários tipos de crimes vão aumentar, roubos contra imigrante, todo tipo de violência contra imigrantes. As pessoas vão apanhar e não vão denunciar, vão ser assaltadas e não vão dar queixa. O maior calcanhar de Aquiles do americano é o terrorismo, e esse medo vai ficar maior ainda porque se um imigrante vir um terrorista colocando uma bomba em um prédio, esse imigrante não vai chamar a polícia. Acima de tudo é preciso que o governo desse país resolva o problema da imigração, para que barbaridades e truculência policial parem de acontecer”, alertou Lima.
Ele considerou a atitude arrogante e desrespeitosa. “Na verdade, toda essa confusão é fruto da arrogância e desrespeito do vice-diretor de polícia da cidade de Newark. Eu me prontifiquei a dar-lhe cópias de todas as fotografias. Mas isto não lhe bastou.”, disse Lima, na época, em entrevista ao Gazeta.
Lima afirma que o episódio de sua prisão deixou marcas que não serão apagadas. “Eles tiraram uma coisa de mim que não podem dar de volta. Pegaram um homem que nunca foi preso e tiraram a liberdade dele. Isso não podem me devolver. Como vou explicar para a minha filha de 4 anos, que o pai foi preso e algemado, por pura truculência da polícia, por pura necessidade de afirmação?”, questionou o jornalista.
A decisão da Procuradora ocorreu após investigação feita pela Divisão Criminal de Justiça. A investigação concluiu que o policial DeMaio, que esteve no local onde foi encontrado o corpo, de fato, questionou os dois brasileiros sobre sua situação migratória no País. “Nossa investigação concluiu que a conduta de DeMaio violou as normas. É responsabilidade de todo agente policial no estado assegurar que qualquer testemunha ou vítima que necessite de auxílio policial possa solicitar sem medo de ser questionado sobre seu status migratório. A segurança pública é prejudicada se os indivíduos acreditarem que não podem denunciar um crime ou cooperar com o cumprimento da Lei”, disse Milgram.
Ameaças
O jornalista afirma ter sido ameaçado e, por isso, ter medo do que ainda possa acontecer. “Eu fui ameaçado na ocasião da minha prisão. Um detetive me disse que se eu não conhecesse pessoas em certos luga-res, eu não conversaria com ele daquela maneira. E eu estava apenas defendendo ferrenhamente o meu direito de liberdade de expressão e de imprensa. A polícia é uma entidade muito forte, muito politizada, e tenho medo que possa haver algum tipo de perseguição. Mas eu não viveria bem com a minha consciência se não enfrentasse a situação da maneira que enfrentei. Não ficaria bem comigo mesmo”, concluiu Lima.
Medidas disciplinares
Lima considera a decisão da Procuradoria uma vitória, mas não deu o caso por encerrado. “Não considero encerrado esse caso. Ainda tem muita coisa para acontecer daqui pra frente. A procuradora-geral deu sete dias para o departamento policial se pronunciar sobre medidas disciplinares. Vamos acompanhar de perto, eu e os meus advogados”, disse.
O relatório confidencial sobre a investigação realizada pela Divisão de Justiça Criminal foi encaminhado ao diretor da polícia de Newark, Garry McCarthy pelo diretor da Divisão Criminal de Justiça, Gregoy A. Paw. Paw solicitou que Mc Carthy, em um prazo de uma semana, avalie, apropriadamente, as medidas disciplinares a serem tomadas, de acordo com o código de conduta do departamento. Ele solicitou também, que o departamento de Newark inicie um programa obrigatório de orientação sobre temas de imigração. A intenção das autoridades do estado é que o programa seja estendido a todos os departamentos de polícia de New Jersey.
A diretriz que trata do assunto foi pu-blicada em 22 de agosto pela Procuradora-Geral do estado, com o objetivo de estabe-lecer normas iguais para todo o estado, a serem adotadas por oficiais de polícia do estado, condados e municípios, em qualquer atividade que envolva temas de imigração. A diretriz ressalta que a aplicação das leis de imigração é de competência federal, mas detalha circunstâncias na qual agentes locais poderiam interagir com a esfera federal sobre o tema.
A norma prevê que o status migratório poderá ser determinado por agentes esta-duais, após realizada uma prisão por crime ou delito sujeito a sanção penal e, particularmente, por flagrante de direção sob efeito de álcool. “O status migratório de um indivíduo é relevante para definir seus laços com a comunidade, a probabilidade de que ele aparecerá em corte para responder às acusações, e o interesse do governo federal em investigar tal indivíduo”, concluiu Milgram.

