A justiça deve prevalecer sobre leis antiquadas e ineficazes - Via Legal

Por Jamil Hellu

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Recentemente, a presidenta Dilma manifestou que  “o Brasil é um país diferente”.   Ao nosso ver, oportuna e correta afirmação. Principalmente quanto a sua diversidade religiosa, cultural e social.  Incontáveis segmentos com diferenças beirando o radicalismo. A atualidade convivendo com a antiguidade. Um grande abismo entre a riqueza e a pobreza. O obsoleto  sobrepondo ao moderno. Esta última se fazendo, ainda, valer em leis que regem o destino de 190 milhões de brasileiros.

O Brasil tem aproximadamente 185 mil normas legais, segundo um levantamento recente feito pela Casa Civil da Presidência. E ninguém sabe ao certo quantas delas já foram revogadas e quantas ainda estão em vigor, causando grande confusão não apenas a juízes, advogados, mas também a todos os seus cidadãos. E prejudica os cidadãos. O resultado é um estado de frequente insegurança jurídica. As pessoas se tornam completamente incapazes de resistir a um princípio básico do direito: ninguém pode alegar em sua defesa o desconhecimento da lei.

Incontáveis normas caducaram e perderam completamente o sentido. Outro tanto se tornaram inócuas ou ineficazes.

Todavia, se o cipoal de leis não se reduz ou novas leis não são feitas em sintonia com os novos tempos, os nossos julgadores começam a julgar e decidir, fundamentados nos costumes e circunstâncias atuais e ao contrário do que a legislação prevê, ou não.

E o STJ - Superior Tribunal de Justiça, principalmente na área de família, que tem decidido e firmado jurisprudência sobre o tema, com julgados que inovam nessa área do Direito de Família, decidiu que é possível acrescentar o sobrenome do cônjuge ao nome civil durante o período de convivência do casal. A opção dada pela legislação, de incluir o sobrenome do cônjuge não pode ser limitada à data do casamento, podendo perdurar durante o vínculo conjugal.

Em outro julgado, no qual o prenome causava constrangimento a uma mulher, a Terceira Turma autorizou a sua mudança. A mulher alegou que sofria grande humilhação com o prenome “Maria Raimunda” e, assim, pediu a sua mudança para “Maria Isabela” .

O STJ entendeu que não se tratava de mero capricho, mas de “necessidade psicológica profunda”, e, ademais, ela já era conhecida em seu meio social como Maria Isabela, nome que escolhera para se apresentar, a fim de evitar os constrangimentos que sofria.

No direito brasileiro, a regra predominante é a da imutabilidade do nome civil. Entretanto, ela permite mudança em determinados casos: vontade do titular no primeiro ano seguinte ao da maioridade civil; decisão judicial que reconheça motivo justificável para a alteração; substituição do prenome por apelido notório; substituição do prenome de testemunha de crime; adição ao nome do sobrenome do cônjuge e adoção.

Também, em decisão inédita, o STJ definiu que uma pessoa pode mudar o seu nome, desde que respeite a sua estirpe familiar, mantendo os sobrenomes da mãe e do pai. Os ministros do colegiado entenderam que, mesmo que vigore o princípio geral da imutabilidade do registro civil, a jurisprudência tem apresentado interpretação mais ampla, permitindo, em casos excepcionais, o abrandamento da regra.

No caso, a decisão permitiu que uma menor, representada pelo pai, alterasse o registro de nascimento. Ela queria retirar de seu nome a partícula “de” e acrescentar mais um sobrenome da mãe (patronímico materno).

Em outro caso, em homenagem aos pais de criação também já foi motivo de pedido de retificação dos assentos constantes do registro civil de nascimento de uma mulher. Em seu recurso, ela alegou que, não obstante ser filha biológica de um casal, viveu desde os primeiros dias de vida em companhia de outro casal, que considera como seus pais verdadeiros. Assim, desejando prestar-lhes homenagem, pediu o acréscimo de sobrenomes após a maioridade. O STJ autorizou a alteração, ao entendimento de que a simples incorporação, na forma pretendida pela mulher, não alterava o nome de família.

Outra decisão marcante do STJ, foi a de que se a intenção é atender ao melhor interesse da criança, a filiação socioafetiva predomina sobre o vínculo biológico. Decidindo que o registro civil de uma menina deveria permanecer com o nome do pai afetivo .

Em outra decisão inédita, o STJ, o transexual que tenha se submetido à cirurgia de mudança de sexo pode trocar nome e gênero em registro sem que conste anotação no documento. Determinando, ainda, que o registro de que a designação do sexo foi alterada judicialmente conste apenas nos livros cartorários, sem constar essa informação na certidão.

Espera-se  que esses novos ventos que sopram sobre os nossos julgadores, soprem também sobre os nossos legisladores, para que façam valer a máxim, a de que o importante é a qualidade e não a quantidade de leis.