Adriana Nogueira: Mãe conectada consigo, bebê feliz

Por Adriana Tanese Nogueira

Entre os diversos prejuízos da cultura patriarcal, há um que é tão forte quanto sorrateiro, algo que sequer se entende ser patriarcal e cujos efeitos nocivos são também difíceis de perceber. Isso porque fazem parte da cultura atual. Chama-se pensamento abstrato.

O pensamento abstrato é este que funciona desconectado da realidade. Todos conhecemos aqueles discursos sobre como deveria ser um casamento, ou um parto natural, ou uma amizade, ou uma vida e todos já tentamos fazer o “download” do tal pensamento abstrato na realidade, sem averiguar o que seria possível, do que a realidade precisa e até “o que ela quer”.

Na maternidade, esse fator se manifesta já na gestação, quando se presta mais atenção nas “coisas” do que naquilo que se sente, que é, afinal, a realidade verdadeira da gestante. Se o que ela sente não for real, então o que é? O quartinho de grife?

No parto, o pensamento abstrato se expressa nas fantasias sobre o parto perfeito e na ilusão de que basta informação (e a doula e a parteira das tantas) para acontecer. Nada mais longe da realidade. Ninguém faz o parto para você. Essas mulheres que buscam fora de si a garantia de que vão superar o teste são como o aluno que leva Einstein para a prova... vai resolver? Não vai. O teste é só seu.

Aí chega o filho. E com ele se espatifam no chão muitos discursos abstratos (e esperamos que todos) e as idealizações. Um neném é real, não é uma palavra, uma ideia, uma evidência científica, um discurso bonito. Ele é algo bem-bem concreto que funciona do jeito dele. Maternidade não vem com manual, e por isso se você quiser aprender como se faz vai precisar jogar fora todos os supostos-manuais que havia armazenado para lhe dirigirem e ajudarem.

Comece do zero. Comece com você. Aprenda a observar, com olhos límpidos, com verdadeira atenção. Curiosa. Relaxe. Confie em você. Vai dar certo. Abra os olhos bem abertos e observe. Aprenda a se conectar consigo e verá que será mais fácil se conectar a seu bebê. Aprenda a olhar para o que sente, a acolhê-lo, a elaborá-lo. Pés no chão, no seu chão, no seu corpo, na sua alma. No que acontece dentro de você. Desenvolva seu bom senso. Desenvolva sua intuição. Teste, observa, re-teste.

Não há receitas. Só precisa saber para onde quer ir, como chegar lá são outros quinhenhos – que você terá que descobrir ao longo do caminho. Caminho que, inclusive, muda. Pode mudar a cada dia. Por isso você precisa ser muito viva, estar alerta, olhos abertos na estrada. Não há GPS que possa guiá-la. Não há receitas. Há referências, exemplos, modelos. Mas, não copie. A dupla você-bebê nunca existiu antes na face da Terra. É no trabalho diário de (auto)conhecimento que você poderá encontrar seu caminho.

Cuidado, portanto, com as modas, os “must” de uma filosofia ou da outra. Cuidado com suas próprias crenças – seu filho poderá derrubá-las. E entre uma ideia e a felicidade do bebê, joga-se fora a ideia, certo?

Maternidade é assim, é ter a flexibilidade de dançar conforme a música. E se não souber os passos, improvise – poderá até divertir-se. Seja livre. Seja responsavelmente atrevida. Atreva-se a libertar-se dos dogmas, do passado, das falas de internet, das fantasias cor de rosa.

Maternidade é enveredar junto a seu bebê por um caminho totalmente desconhecido, mas cheio de conquistas e boas surpresas. Quando se torna muito difícil é porque você perdeu a conexão com você mesma. Se você está perdida, seu bebê ficará apavorado. Linke-se com você. Reencontre-se e seu bebê voltará a sorrir.