Mãe, Esse Bicho De Sete Cabeças

Por Adriana Tanese Nogueira

Todos amamos nossas mães, mesmo quando elas não são as mães que gostaríamos de ter. Mas acontece algo em nossa psique que vai além de as amarmos ou não. Uma mãe permanece uma autoridade na vida do filho que mesmo os mais intelectualmente desenvolvidos podem não perceber. A mãe coloca um freio. Sempre e de alguma forma. Um freio do qual, geralmente, precisamos uma hora nos livrar. Se não for um freio, será algum tipo de limitação. Há quem, na tentativa inconsciente de se libertar, assuma os valores contrários aos da mãe, mas isso não quebra seu feitiço. Vejamos o que acontece. Uma mãe é em primeiro lugar uma mulher. Ela era uma simples mulher antes de “a conhecermos”, com sua vida, escolhas e valores. Encontrou o homem que chamamos de pai. Os dois namoraram, fizeram sexo, partilharam risos e choros. Viviam por eles mesmos, sem ter que cuidar de ninguém. Aí um dia ela engravida. E um dia ela tem um bebê. E a criatura só conhece essa mulher no papel de Mãe. Mãe é mais e é menos de uma mulher. Queiramos ou não, saibamos ou não, Mãe significa algo de puro e intocável. Mexer com mãe é quase que insuportável. Com os anos, podemos questionar a mãe, criticá-la e desaprová-la. Mas quantas das “verdades” que sabemos continuam caladas em nosso peito? Quantas palavras que comunicamos a amigos ou diários foram verbalizadas para a Mãe? A faca é de dois gumes. Mães e filhos, encarnam, uns para os outros, arquétipos, ou seja, figuras transpessoais, tanto imanentes como transcendentes, muito além da mera realidade particular das criaturas em jogo. Por um lado, a Mãe se esquece com triste frequência que ela é uma pessoa, um simples indivíduo que faz o seu melhor e que tem uma história de vida, uma cultura de origem, crenças e inevitáveis limitações que os filhos não precisam necessariamente engolir. Enquanto se percebem, sem perceber, como potências incansáveis que tendem à perfeição não importa o custo, veem sua cria como um vaso de cristal chinês que vai quebrar ao mínimo desvio de nosso precioso e divino cuidado. A cria precisaria de constante orientação e proteção, sendo mantida na cúpula sagrada de nosso amor – que muitas vezes resulta claustrofóbico. Por outro lado, o filho nasce de uma mulher que, pelas características que a Natureza essa sim perfeita, gerou se apresenta a ele como divina. Um ser que provê proteção, nutrição, cuidados, calor, embalo. Um ser que está sempre disponível, um ser que entende o que precisamos quando nós mesmos não saberíamos dizer. Um ser que não entendendo o que precisamos não abre mão de nós e continua tentando até acertar... Mãe é Deusa! Crescemos com a Deusa, a mãe e a mulher. E confundimos as três, assim como ela se confunde entre as três. Não é de se espantar que quando é hora de se distinguir da totalidade divina da qual viemos nos encontramos num labirinto sem o fio de Ariadne para nos guiar porque nele nascemos. Sair é o primeiro ato de independência, o grito de liberdade que, porém, nos custa perder a Deusa. Aceitar o sacrifício da Deusa-Mãe significa aprender a ver e sentir, sobretudo sentir, a mãe como uma mulher-mãe. Isso nos causa um profundo sentimento de culpa. E então descobrimos que por trás da Deusa-Mãe há uma mulher-mãe que usou a capa de Deusa para talvez elevar sua autoestima... Nos descobrimos não queremos que ela descubra suas limitações. Tememos que no momento em que ela perceber que nossas ideias são o fruto do indivíduo adulto ela caia espatifada no chão tendo perdido sua função...