Maternidade real

Por Adriana Tanese Nogueira

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A primeira coisa que vem à mente quando pensamos na palavra “mãe” é a imagem de uma mulher sorridente, bondosa, generosa, disponível, atenta, presente, nutridora, alegre, protetora e acalentadora. Para quem não sabe, essa é a descrição do arquétipo materno positivo, da Grande Mãe, um concentrado da linfa vital do que é ser mãe destilado ao longo das inúmeras gerações de mulheres-mães por toda história. Portanto, a descrição acima é a da mãe ideal, daquela mãe que toda criança gostaria de ter.

Quem é esse ser que tudo dá toda vez que precisamos? Para o bebê, esse ser é como uma Deusa: Ela tudo dá, tudo provê, tudo compreende, tudo perdoa, tudo pode, portanto, é onipotente, e sempre está presente (basta chorar que ela aparece) e por isso, também é onipresente. Isso equivale para o bebê a receber amor incondicional. Não é assim que a cristandade entende Deus? Eis, a Mãe. Mas o arquétipo não é a realidade humana, pessoas não são deuses. Apesar disso, o transe é mais forte, o desejo pela proteção, amparo, salvação da Grande Mãe continua ao longo dos anos de vida adulta. Afinal, quem não gostaria de ter à disposição uma figura que está sempre pronta a amparar, consolar, encorajar e suportar?

E aqui começa o grande engano. A mulher de hoje, quando se torna mãe, vive uma realidade esquizofrênica, dividida como está entre valores, tarefas e objetivos em contradição entre si. O fato dela geralmente não ter consciência do conflito interior mantém a esquizofrenia em vida e o preço que ela paga se reflete tanto em sua saúde mental e emocional como em sua relação com filhos e marido. O sentimento de culpa faz com que ela mantenha a crença que ela deve ser e os outros a querem a encarnação mais fiel da Grande Mãe.

Por um lado, temos a realidade do trabalho. A mulher se afirmou ao preço de ser como os homens, se transformou num “homem de saias”. O mundo do trabalho nunca incluiu ou mesmo se preocupou com maternidade (e paternidade!), bebês, cuidados, amamentação, dor de barriga de filhos, escolinha e tarefas – como também não inclui empatia, muito menos sensibilidade.

Por outro lado, a propaganda da mídia investe no arquétipo da Grande Mãe mostrando mulheres que estão sempre bem maquiadas, sorridentes, descansadas e elegantes com bebês dentro da barriga ou no colo, mulheres que se divertem, despreocupadas, comprando esse produto ou aquele. E não é de se esquecer o marido, pois a mãe ideal é também a esposa ideal. Além de descansada, ela é, portanto, também sensual e cativante, numa improvável contínua disponibilidade sexual. Sua realidade de pessoa com tripla jornada de trabalho que lhes tira o sono, a saúde e a alegria não é reconhecida. Quando ela tenta dizer algo a respeito é tachada de “egoísta”.

Acrescenta-se a esta situação a muito comum a realidade de um casamento insatisfatório. A grande maioria dos homens se torna coleguinha de brincadeira de seus filhos, enquanto as mães mantêm a direção da casa, sendo as responsáveis por rotinas, horários, necessidades, alimentação, sono, etc. A realidade das mães está assim moldada num ideal inalcançável. Amar significaria estar à disposição do outro, conforme cada um precisa no momento em que cada um pede.

Por estarem tomadas por tantos questionamentos sem respostas, as mulheres se apresentam contraditórias, tímidas ou chorosas, agressivas ou alienadas. E eis que são chamadas de “loucas” por seus maridos, companheiros e familiares. Diz o ditado popular das culturas pré-industriais que “é preciso uma aldeia inteira para criar uma criança”. Cadê a aldeia? As mães estão só.