No Texas, menina não conseguia provar sua existência

Por Jamil Hellu

alecia

Parece um conto de ficção, mas não é. Aconteceu na vida real e aqui, nos Estados Unidos.

A história de Alecia beira o inacreditável. Se tivesse sido inventada por um romancista alguém ia dizer que era inverossímil. Segundo o poeta italiano Luigi Pirandello, a realidade pode ser bem mais inverossímil do que a ficção. Nesse caso, por exemplo, o mundo real produziu uma pessoa incapaz de comprovar a própria existência.

O parto de Alecia Faith Pennington foi na casa da família, no Texas. Os pais jamais registraram a menina, que cresceu basicamente confinada numa fazenda – nunca foi sequer ao médico e ao dentista. A educação também era feita em casa. Ou seja: nem para a escola ela ia. Os pais também não deixavam que ela fizesse praticamente nada, quanto menos namorar.

Até que, aos 19 anos, ela decidiu dar um basta e sair de casa. Foi quando chegou ao mundo real que Alecia descobriu sua inexistência. Aos olhos do Estado ela simplesmente nunca tinha nascido. Ela queria tirar carteira de motorista, viajar, continuar os estudos. Mas, não podia fazer nada disso, porque não tinha qualquer documento. E até para conseguir uma certidão de nascimento ela precisava provar que existia – que em algum momento seu nome ficou marcado numa ficha de um médico, algo assim. Mas ela não tinha nada.

A burocracia americana não tinha como saber se ela não era uma fugitiva querendo trocar de nome. Ou uma imigrante querendo se passar por nativa. E, simplesmente, negava-se a dar um documento para alguém que, aparentemente, tinha surgido do nada.

A situação dela chamou a atenção quando Alecia, desesperada, foi ao YouTube. Gravou um vídeo de um minuto e meio contando a sua história e que hoje já foi visto por 1,4 milhão de pessoas. Muita gente quis ajudar, embora ninguém soubesse exatamente como. Até que se encontrou uma brecha legal e ela conseguiu, enfim, ser cidadã. Mas, por incrível que possa parecer, houve gente que condenou Alecia por tentar conseguir seus documentos. Eis o quão inverossímeis podem ser os fanáticos ideológicos. Segundo alguns radicais, o que a menina do Texas estava fazendo era abrir mão de uma dádiva que seus pais haviam legado a ela – a dádiva de não poder ser controlada por um Estado, de ser soberana.

Um programa de rádio americano entrevistou Alfred Adask, um dos que tentaram convencer a garota a permanecer como estava. “Ela quer ser súdita. Ela não quer ser livre. É uma escolha dela”, disse ele, afirmando que se ela quisesse, ela podia ser escrava. “Existem consequências em abandonar esse estado de liberdade que ela tem”.