Morte de brasileira demonstra falhas no sistema de proteção a vítimas

Por Marisa Arruda Barbosa

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A diretora do Harbor House da Flórida Central, considerado um dos melhores programas para prevenir e procurar ajuda em casos de violência doméstica, Carol Wick, disse que a morte da brasileira Jorgete Acarie, 43 anos, a tiros em sua casa, na região de Orlando, no dia 26 de agosto, foi uma falha do sistema.

“Ela fez tudo que era possível para se proteger e proteger seus filhos. Infelizmente o sistema tem falhas.

Aqui vemos o caso de uma pessoa que violou a condicional várias vezes, violou a tornozeleira de monitoramento da polícia e ainda estava solto nas ruas”, disse Wick ao “MSNBC”. Mas ela disse ainda que não adianta ficar apontando o dedo para as falhas da agência. Ele já tinha que estar preso para que ela fosse protegida.

Dono de um longo histórico de violência doméstica contra Jorgete, que trabalhava como massoterapeuta, seu ex-namorado e pai do filho do casal de dois anos, que presenciou o crime, Kristofer Gould, de 33 anos, é o principal suspeito do homicídio e foi acusado formalmente no dia 31. Ele foi encontrado na praia de Daytona e inicialmente preso por outras acusações.

O ex-namorado de Jorgete chegou a ser preso por perseguir a brasileira e teve a liberdade provisória revogada na semana anterior ao crime, que aconteceu na madrugada do dia 26, por quebrar a janela da casa dela. A massoterapeuta chegou a telefonar para o 911 para denunciar o americano. O relatório sobre o caso mostra que a polícia foi chamada à casa dela 56 vezes em dois anos por causa de ameaças e agressões. A última vez foi no dia 20, quando ele jogou uma pedra pela janela de seu banheiro e gritou pedindo para entrar na casa.

Jorgete já havia pedido duas liminares contra Kristofer, que no entanto foram negadas ou rejeitadas. No dia 24, dias antes de ser morta, ela tentou registrar outra liminar, mas foi informada por funcionários judiciais que ela perdeu o prazo por cinco minutos e teria que voltar na segunda-feira, dia 27.

Em uma ordem de restrição contra ele, Acarie descrevia com suas próprias palavras que tinha medo dele, que segundo ela a ameaçava de morte e cometia atos de violência doméstica.

A psicóloga Karina Lapa adicionou, entretanto, que em muitos casos a ordem de restrição é apenas um papel, e em casos como esse, em que o agressor estava determinado, ele não parecia ter medo da lei.

Irmã se diz aliviada com prisão de suspeito A irmã de Jorgete, Viviane, disse a uma TV local, no dia seguinte à prisão de Kristofer, que se sente aliviada por ele estar preso, uma vez que ela se sentia ameaçada. Viviane disse ainda que o filho do casal, que tem um pouco mais de dois anos, sinaliza que viu o crime acontecer.

“Em português ele disse algo, ‘Papai pum pum mamãe dodói’, o que quer dizer que ele viu o pai matando a mãe”, disse Viviane.

De acordo com sua irmã, Jorgete tinha quatro filhos e uma neta, que criou sozinha. Nos últimos tempos Jorgete vivia muito apreensiva e tensa.

Outro caso recente

No início de agosto, um caso parecido aconteceu em Broward, quando a brasileira Rosa Hirsch, de 63 anos, foi morta a tiros, no dia 10, por seu namorado, Francisco Javier Rodriguez, de 54 anos, com quem vivia. Ele está preso sem direito a fiança em Broward. O Gazeta não obteve informações, até o fechamento desta edição, se o casal tinha algum histórico de violência doméstica.

Violência doméstica

A cada dia, três mulheres são mortas nos Estados Unidos por seus namorados ou maridos. No ano passado, no sul da Flórida, mais de 38 mil casos de violência doméstica foram denunciados.

A definição de violência doméstica é abrangente, e envolve qualquer agressão, violência física, abuso sexual, perseguição, assédio, ameaças, e outros, entre pessoas que residam juntas, que tenham um filho juntas, sem necessariamente viver na mesma residência, o que foi o caso de Jorgete.

Nesses casos de agressão, o encarceramento dura três dias para depois o acusado poder pagar fiança, mas se for grave, não há fiança. Quando há ameaças e perseguição, é feito um “restraining order” ou “injunction”, para impedir que um se aproxime do outro.

“Basicamente, uma restraining order (ordem de restrição) é uma ordem judicial que proíbe uma pessoa de cometer alguns atos contra outra pessoa. Quem não cumpre essa ordem, pode responder civil e criminalmente”, explicou Karina Lapa. ”Na Flórida, quando se dá entrada em uma petição de ‘restraining order’, imediatamente ela vai à frente a um juiz. Se o juiz acredita que existem evidências suficientes para manter a ordem de restrição, ele a garante temporariamente, caso contrário, não mantém”.

Karina ainda explica que, para que uma pessoa possa pedir uma “restrainig order”, é necessário que comprove quatro elementos na corte: suspeita, ou razão suficiente em achar que a ameaça sofrida é real, estar sendo irreparavelmente prejudicada pela ameaça do agressor, a extensão de que, por conta do agressor, a vítima pode sofrer danos irreparáveis, interesse público em manter a ordem.

Algumas formas de buscar ajuda em caso de Violência Doméstica:

“Caso a pessoa acredite estar sendo vítima de uma iminente agressão, ela pode se dirigir ao departamento de polícia da sua cidade, ou ir direto à Corte, e dar entrada na ordem de restrição. Não é preciso contratar advogado nem pagar taxas na corte”, disse Karina Lapa.

Harbor House: (407) 886-2856. Domestic Violence Horline de Broward County: 1-800-500-1119. Women in Distress: (954)761-1133.

* com colaboração