Muita festa, pouco civismo

Por Gazeta Admininstrator

A partir desta semana iniciamos um longo processo de celebrações diversas do que se convencionou chamar de “mês do Brasil”, em função do 7 de Setembro ser a nossa data nacional. Nada por ser mais importante ou gratificante para nós brasileiros do que termos uma oportunidade de celebração nacional, especialmente para quem está fora do país.

As festas podem ser megas – como o Brazilian Day em New York - ou modestas, ainda em sua primeira edição, como o Utah-Brazilian Festival, em Salt Lake City.

Contabilizamos na verdade cerca de 20 eventos que poderiam ser considerados de médio a grande porte, e quase uma centena de outros em clubes, associações, entidades religiosoas ou comunitárias.
Brasil sempre rimou e vai rimar com festa. Festa é importante porque é um reflexo puro e pleno do que somos como povo brasileiro: alma aberta, bom humor, celebração constante, mesmo que a Nação esteja imersa num de seus períodos mais “azedos” dos últimos tempos, com a sucessão de escândalos políticos que sacodem Brasília e entristecem toda o país.

Mas se a festa é fundamental, importante e tradutora da alma brasileira, há que se tocar num ponto raramente abordado: a distância cada vez maior que nosso povo tem do verdadeiro sentido de civismo e patriotismo. E não é culpa do povo não, muito pelo contrário.
A responsabilidade é e sempre será das lideranças. Sejam de que setores forem.

Cabe aos líderes brasileiros, no Brasil e fora dele, ressaltar esse importante aspecto de afirmação nacional que é o patriotismo.
Muita gente confunde patriotismo com patriotada. Não sabe a clara distinção que existe entre celebrar a Pátria e a Nação, com a atitude – geralmente plena de ignorância & bravatas – de “defender o país”. Aqui nos Estados Unidos essa confusão é tão grande que praticamente divide o país ao meio, em termos de opinião pública.
No Brasil, as celebrações cívicas ainda são aquelas que mais parecem uma comédia clonada dos desfiles soviéticos. Paradas militares totalmente desinteressantes e que nada mais evidenciam que não somos uma nação com vocação bélica – graças a Deus.

Fui aluno do Colégio Militar na Bahia por longos 10 anos, toda a minha formação básica foi feita lá e, óbviamente, participávamos das duas grandes “paradas” que celebravam a nossa Independência: a de 2 de Julho (Independência da Bahia) e 7 de Setembro (Grito do Ipiranga).

O que mais acho curioso, ao refletir sobre tais eventos atualmente, é que a parada do 2 de Julho era muito mais criativa e interessante. Enquanto no 7 de setembro nossas instituições militares desfilavam numa rotina burocrática e carente de qualquer brilho ou interesse que motivasse a população, a do 2 de Julho, que contava com participação das escolas públicas e privadas, artistas e muitas entidades, com carros alegóricos e inúmeros atrativos que transformavam o desfile num “happening cívico”. Muito mais interessante, portanto.

Aqui nos Estados Unidos, onde o patriotismo do brasileiro aflora em função da distância de casa e necessidade de afirmação étnico-nacional em relação às demais comunidades que dividem (e disputam) o mesmo território, as celebrações da independência têm contornos variados, mais freqüentemente com muita música mais ao estilo das festas de rua do Brasil. Tudo muito válido, tudo muito bom.
Mas não faria mal algum se as lideranças que põem de pé esses eventos pudessem dar algum realce cívico a esses eventos. Os nossos filhos, nascidos aqui, pouco ou nada sabem sobre o Brasil. E cada vez saberão menos se a única referência que tiverem da pátria de seus pais for a cada quatro anos uma maratona em frente à TV na Copa do Mundo e anualmente uma festa onde a referência máxima de Brasil – para eles – será a nossa bandeira hasteada ou colocada em algum ponto do evento.

Sei que esse tipo de “sacerdócio” é via de regra inócuo. Nós, brasileiros adultos que estamos fora do Brasil, estamos quase que 101% preocupados única e exclusivamente com o projeto individual de sobrevivência e sucesso. Há quase nenhum espaço para a reflexão sobre a importância do coletivo sobre o individual.

Embora esteja repleta de falhas e incoerências, a sociedade norte-americana, entretanto, ainda que eu venha perdendo um pouco a coesão nessa área, tem sabido mostrar ao mundo o valor do conceito de coletividade, quando se trata de identidade nacional e Pátria.
Nesse ponto, as demonstrações (sinceras ou não) dadas pelo mar de bandeiras norte-americanas espalhadas por todos os cantos, são um atestado eloqüente de orgulho, respeito e unidade em torno de um símbolo.

É algo assim que, creio, seria necessário, para que nós brasileiros, nas muitas festas que vamos viver a partir do próximo final de semana para celebrar o Brasil, conquistássemos um pouquinho mais de auto-estima, que nos ajudaria, e muito, a lutar por espaços mais dignos e reconhecimento mais efetivo de nossa presença na América.