Mulheres-Macho - Viver Bem

Por Adriana Tanese Nogueira

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A segunda coisa que menos gosto depois dos machões que batem os punhos na mesa ordenando comida ou sexo, são as mulheres-macho. Vamos esclarecer logo uma coisa: eu não sou uma mulher boazinha não (vide: Mulheres boazinhas vão ao céu, as más vão à luta), não acho que “mulher é doce” e “homem é forte”, muito menos sou a favor do sistema de gênero tradicional ou de qualquer coisa que faça da injustiça nas relações uma condição aceitável. Digo isso porque já fui acusada de apoiar a cesárea porque não me unia aos slogans irados das pseudofeministas da humanização do parto em 2005. Para mim, essa acusação era tão burra quanto acusar um peixe de ser contra a água. Eu, uma das pioneiras do parto domiciliar no Brasil... (www.ongamigasdoparto.com). Mas é assim que funciona: quando mulheres submissas despertam para sua condição sem o senso crítico necessário, se tornam raivosas, se tornam machonas.

Mas não vamos equiparar as mulheres macho com as feministas da década de 70 e 80. Estas tinham agenda política, objetivos maiores do que dar vazão a sua revolta pessoal. Elas estavam abrindo um caminho que parecia ser impossível de ser conquistado e que, entretanto, foi conquistado. À elas, nossa eterna gratidão. As feministas bravas dos primórdios são tão diferentes das mulheres-macho do século XXI quanto um ativista do Greenpeace o é de um mafioso siciliano. Naquela época, gritar alto e forte era uma necessária estratégia política, psicológica e social. Hoje, não há necessidade alguma de ser macho fora ocultar um desequilíbrio psicológico embaraçoso.

O machismo não é uma condição masculina. É uma dimensão histórica humana que tem raízes no mundo animal. Os gorilas não batem no peito, não têm várias fêmeas? Pois é, essa característica foi passada aos humanos e, hoje (finalmente), está em decadência. Mas, como os sábios sabem, esses processos duram gerações e gerações e gerações. Enquanto isso, vivemos em todo tipo de violência simbólica e real.

Um dos aspectos dessa lenta passagem a uma nova ordem de valores é que há algumas mulheres que quando feridas por um homem (que pode ser pai, namorado, marido, irmão, chefe) revidam vestindo a armadura do gorila e batem os punhos no peito bradando ameaças. Já Jung havia apontado para essa confusão feminina quando falou na “mulher dominada pelo animus”. O que ele queria dizer é que há mulheres que fazem da crítica e do julgamento suas principais armas no relacionamento, falam demais e não atinam para o fato que suas ideias são geralmente a repetição - a crítica não refletida da mídia, da sociedade de consumo, do padre, do guru, enfim, da mentalidade estereotipada. Nada de original, nada criativo, ou mesmo, útil.

Agora, a mulher macho é uma figura mais adiantada da mulher dominada pelo animus, pois a macho “ataca”, manda no pedaço, domina e se faz respeitar na base do mesmo método do homem macho: pela intimidação. Intimidam suas filhas que se creem leais quando, na verdade, são submissas e intimidam os homens, geralmente aqueles bons, aqueles que não as feriram e não querem feri-las. Fácil descarregar em quem é pacífico, não?

Acontece que as mulheres têm mil e uma razão para reclamar de suas feridas, mas nenhuma para usá-las como esteroides para crescer músculos. Feridas se curam. Quando não curadas, supuram, formam pus, são fedorentas, poluem o inteiro organismo e infeccionam o ambiente. A brabeza da mulher-macho é o grito de dor suprimido na garganta. Suas lágrimas não choradas se tornam gestos agressivos, e a suposta injustiça sofrida é usada como justificativa para uma suposta justiça imposta.

Mulheres-macho não percebem que são tão machistas e tão desagradáveis quanto o que querem combater ou do qual querem se proteger. Entretanto, elas ganham aliadas entre mulheres que, como elas, estão feridas, mas não querem ou não podem enfrentar sua dor e curar-se. Mulheres que preferem inchar o peito e cuspir verdades não têm, como seus modelos masculinos, a humildade de reconhecer a “fraqueza” que vem do simplesmente sentir. Saber sentir é uma arte. Saber sentir dor anda junto com saber sentir amor. Ser capazes de sentir dor, ficar com a dor e cuidar da dor é uma das pontes que levam para o salto de consciência do qual precisamos.

Entendo a figura da mulher macho como uma transição entre uma ordem e outra. Para fomentar essa passagem, para acelerar os já lentos tempos, é preciso tomar atitude contra toda forma de machismo, que de qualquer lado venha. De brinde, essa situação paradoxal tem o efeito colateral positivo de empurrar a todos na direção da superação da visão homem-mulher tradicional e olhar para as atitudes. Sair dos estereótipos e aprender a ser gente.

*Adriana Tanese Nogueira é psicanalista e life coach www.ATNHumanize.com