Crianças trazidas para morar nos EUA sem autorização: quando o ato se torna sequestro?

O sequestro internacional é o ato de transferência ou retenção ilícita da criança em país diferente da residência.

Por Arlaine Castro

As autorizações de viagem internacional não constituem autorizações para fixação de residência no exterior.

Menores brasileiros são frequentemente trazidos para os Estados Unidos sem o consentimento de um dos pais ou somente com a autorização de viagem internacional, mas não para moradia. Tal ato configura subtração internacional infantil.

A subtração internacional de crianças (ou sequestro internacional) é o ato de transferência ou retenção ilícita da criança em país diferente daquele em que a criança detinha residência habitual, sem o consentimento de um dos genitores (pai ou mãe), responsáveis legais ou autorização judicial, explica o Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil.

De acordo com o órgão, além da alteração unilateral do país de residência da criança, também é considerado ilícito reter uma criança em um país sem o consentimento do outro genitor (ou autorização judicial), após um período de férias, por exemplo. Isso ocorre mesmo que o pai/mãe/juiz tenha autorizado o período de férias.

Para a advogada Rizzia Froes, especializada em direito internacional, mesmo que um genitor exerça a guarda de forma exclusiva e seja separada judicialmente, "os pais exercem o poder familiar, então a regra é que os dois deverão decidir sobre o lugar de residência da criança- salvo se o juiz do país de residência da criança autorizar o contrário".

Convenção de Haia

O conceito de subtração internacional de crianças está presente na Convenção de Haia de 1980 sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças e também na Convenção Interamericana de 1989 sobre a Restituição Internacional de Menores.

O objetivo maior desses tratados é o de proteger o bem-estar das crianças que vivem em situação de ruptura familiar e que foram deslocados de forma abrupta de seu país de residência habitual ou que estejam sendo retidas sem autorização de um dos pais em outro país, buscando seu retorno imediato e seguro ao seu país de residência habitual, sendo este o país em que a criança encontrava-se residindo imediatamente antes de seu traslado ou retenção ilícita.

No caso de crianças levadas irregularmente do Brasil para outros países que sejam Estados-Parte da Convenção da Haia ou da Convenção Interamericana, cabe à Autoridade Central Administrativa Federal (ACAF)encaminhar pedido de retorno ou visitas à Autoridade Central do país em que a criança se encontra retida ilicitamente.

Froes explica que o mesmo ocorre com autorização de viagem internacional. “Ela é válida por um determinado período. Essa autorização permite apenas viagens temporárias e não concede o direito para mudança definitiva de residência. Sem a autorização de viagem, o pai poderá denunciar a mãe à Autoridade Central por sequestro internacional do menor, e a Autoridade Central no Brasil acionará a Interpol para encontrá-la juntamente com a criança”.

Violência doméstica

Apesar de ser uma questão delicada para a família, a maioria dos casos envolve violência doméstica ou abuso por algum dos pais ou responsáveis. A outra parte se muda buscando proteção para si e para os filhos.

No entanto, a advogada Rizzia Froes ressalta que, em caso de violência doméstica, é importante que a mulher tenha provas contundentes de que sofreu violência por parte de seu companheiro no Brasil para comprovar a mudança de país. “As provas podem ser: registro de ocorrência policial, medidas protetivas, atendimento em serviços de apoio a vítima de violência doméstica, acompanhamento por psicólogos, testemunhas, fotos, documentos, gravações, mensagens, etc”, afirma. Mesmo assim, há todo um processo judicial que deve ser feito para resolver legalmente a situação.

“Não sou uma sequestradora, sou mãe”

Em um vídeo no Youtube, a brasileira Denise Fait diz que há um impacto desproporcional dos casos analisados como sequestro internacional para as mulheres e pede para que as mães e as crianças sejam ouvidas pelas autoridades.

"Somos mais de 2000 casos sendo julgados por subtração internacional da atualidade. As mães são acusadas de sequestradoras em 7 de cada 10 casos. As estatísticas não metem: há um impacto desproporcional da Convenção de Haia em mulheres. Eu não sou uma sequestradora. Eu sou uma mãe. Tudo que pedimos é que o relato do meu filho seja escutado em justiça por seus profissionais competentes. Escute a minha história, escute meu filho. Escutem as crianças", pede no vídeo. 

Dois lados

Em um caso recente de uma denúncia recebida pelo Gazeta News de uma possível abdução de uma criança brasileira pela mãe, o pai alega que assinou autorização para a filha de 8 anos fazer uma viagem à Disney, porém, elas viajaram em outubro e não retornaram ao Brasil.

A mãe também foi ouvida e disse que o pai não era uma pessoa presente na  vida  da filha, não contribui com a pensão alimentícia da filha e que fazia ameaça psicológica.  Por isso, resolveu sair do país com a filha para os EUA e já contratou advogado para resolver  o caso.