Brasileiras nos EUA: vítimas de tráfico humano e prostituição?

Jovens mudaram comportamento e cortaram ligação com familiares após envolvimento com "guru" brasileira.

Por Arlaine Castro

Familiares de Letícia Maia Alvarenga (esq), 21 anos, e Desirrê Freitas (dir), 26, suspeitam que as jovens tenham sido aliciadas.

O tráfico internacional de mulheres brasileiras para prostituição é uma realidade principalmente em países da Europa e para os Estados Unidos. Mas o caso de duas jovens brasileiras supostamente vítimas de uma seita e traficadas reacendeu o alerta.

Em um mistério que está sendo investigado por autoridades brasileiras no Brasil e nos EUA, a mineira Letícia Maia Alvarenga, de 21 anos, dada como desaparecida nos Estados Unidos desde abril deste ano pela família, aparece em um site de prostituição que oferece o serviço de acompanhante em Austin, capital do Texas.

Segundo o pai, que mora em Perdões, no Sul de Minas Gerais, a filha estava na cidade de Leander, Texas, onde foi morar e para trabalhar como Au pair desde 2019.

Em nota à imprensa, a Polícia Civil de Minas Gerais confirmou que "há registro de desaparecimento de Letícia, e os pais dela foram ouvidos". Ainda segundo a instituição, a Polícia Federal foi consultada e reportou que existe registro de desembarque da jovem no Aeroporto Internacional de Houston em 14 de maio deste ano, quando ela retornou após vir ao Brasil pegar documentos com a família e agiu de forma estranha.

Além de Letícia, Desirrê Freitas, de 26 anos, natural de São Paulo, também está desaparecida nos EUA após se envolver com a guru.

Guru Kate A Luz

Diante das incertezas do que aconteceu com as jovens, pais, familiares e amigos travam uma batalha em busca de respostas. Ambas sumiram após envolvimento com a influenciadora digital Kat Torres, popularmente conhecida como Kate a Luz, que desativou as contas das redes sociais após o escândalo. Natural do Pará, atualmente ela afirma que reside em Nova York.

Letícia mantinha contato normal com a família após a mudança para os Estados Unidos, mas, após conhecer Kat, ela cortou laços com os familiares, segundo eles.

Em vídeos publicados no Instagram, Letícia confrontou a família e acusou o próprio pai de abuso sexual. "Quando eu era criança fui abusada pelo meu pai. Minha mãe sempre ia para a roça e eu ficava com meu pai. Então, era nesse tempo que tudo acontecia. Ele abusava de mim sexualmente. Minha mãe chegava em casa, eu falava o que aconteceu e ela deixava para lá", afirmou a jovem, acrescentando que encontrou apoio em Kat para lidar com a situação.

Na última terça-feira (18), ela apareceu em vídeo afirmando que havia escapado de um cativeiro e citando até a modelo Yasmin Brunet como chefe de rede de tráfico de brasileiras no exterior. A modelo nega e disse que já acionou advogados no Brasil e nos EUA.

Os familiares de Desirrê também encontraram fotos da jovem na internet com a oferta de serviços sexuais.

Em nota, o Ministério das Relações Exteriores, por meio do Consulado-Geral do Brasil em Houston, informou que tem conhecimento da situação e está em contato com as "autoridades policiais norte-americanas" que fazem a investigação do caso.

Tráfico de pessoas para prostituição nos EUA

O tráfico de pessoas faz 40 milhões de vítimas ao redor do mundo. As Nações Unidas classificam como um dos maiores desafios do século 21. As duas finalidades mais comuns para este tipo de tráfico são a exploração sexual e a do trabalho. O problema é tão grave e as vítimas submetidas a práticas tão violentas que o crime é frequentemente chamado de escravidão contemporânea.

O Departamento de Justiça e o Departamento de Segurança Interna promovem investigações bilaterais e processos contra empresas transnacionais de tráfico que operam na fronteira EUA-México, facilitando a troca de pistas, inteligência e conhecimentos entre os EUA e autoridades mexicanas de combate ao tráfico e apoio às autoridades estaduais mexicanas e forças-tarefa de tráfico de pessoas.

Estados com mais casos

Segundo o site World Population on Review, em 2019, os Estados Unidos relataram 11.500 casos de tráfico de pessoas. O tipo mais comum de tráfico foi o tráfico sexual (8.248).

A Califórnia tem consistentemente as maiores taxas de tráfico de seres humanos nos Estados Unidos, com 1.507 casos relatados em 2019. 1.118 desses casos foram casos de tráfico sexual, diz o site. Ela é seguida pelo Texas com 1.080 casos, Flórida com 896 e Nova York com 454.

Esses quatro estados com as maiores taxas de tráfico humano têm as populações mais altas nos EUA, o que pode explicar por que seus números de casos são significativamente maiores do que outros estados e populações de imigrantes muito altas.

Prostituição de imigrantes

Naides Brum é Diretora do Programa de Aconselhamento em Português da House of Protection desde 2015. Responsável por reuniões de Empoderamento de mulheres brasileiras no evento chamado Portuguese Connection no sul da Flórida, consultada pelo Gazeta News, ela diz que as estatísticas de prostituição entre brasileiros imigrantes é um problema que tem crescido assustadoramente.

"Propostas de empregos fantásticos e enriquecimento instantâneo são algumas das principais propagandas que enganam mulheres e homens na rede de prostituição. Trabalhos como cuidadora de crianças, ou modelos de agências imaginárias também têm atraído a atenção de brasileiros. Como precaução, busque informações na internet ou no site do consulado sobre tais agências empregadoras. As vítimas são obrigadas a 'pagar' pela passagem, comida, habitação através da prostituição", destaca.

Citando casos de prostituição entre imigrantes já atendidos, Brum conta como mulheres vulneráveis emocional e financeiramente se tornam alvos fáceis.

"Dei atendimento em 2015, 2017 e 2018 para algumas mulheres brasileiras adultas que foram para a prostituição a convite de namorados que eram usados como olheiros de mulheres brasileiras com potencial para prostituição. São mulheres vulneráveis, que em muitos casos, entraram pelo México, sozinhas e com dificuldades para conseguir um trabalho para se sustentar, o discurso do falso empoderamento é usado para convencer essas pessoas de que podem se prostituir pois o corpo é delas".