Brasileiros acumulam prejuízos pela restrição de entrada nos EUA

Com quase cinco meses, a restrição afetou brasileiros que moram, trabalham ou visitam a Flórida regularmente

Por Arlaine Castro

Pagando aluguel na Flórida, a mineira Tania Monken está com as malas prontas desde maio.

Por causa da pandemia do novo coronavírus, muitos governos fecharam as suas fronteiras a fim de evitar maior proliferação da Covid-19, principalmente de países com maior número de casos. Desde 29 de maio, os Estados Unidos vetam a entrada de brasileiros e qualquer outro viajante estrangeiro que tenha estado no Brasil, incluindo em trânsito, durante os 14 dias anteriores à chegada no país.

Quase completando cinco meses de restrição, a medida, que somente tem exceção para residentes permanentes, cidadãos americanos e alguns outros, ainda não tem data definida para acabar. Existe a alternativa de entrar nos EUA depois de ficar 14 dias em algum país que não possui a restrição no momento, como o México, mas que demanda riscos e mais gastos.

"Afeta financeira e psicologicamente"

Em Belo Horizonte (MG) e com apartamento alugado em Deerfield Beach desde o início de março, a empresária Tania Monken se diz um pouco "revoltada" com a situação. As malas estão prontas desde maio, mas com a restrição, ela não conseguiu embarcar e a passagem comprada já foi remarcada diversas vezes. 

"Tenho visto de turista e vou duas ou três vezes ao ano para ver meu filho e minha neta de dois anos. Meu filho é meu apoio emocional e só tenho essa netinha. Quando vou, tomo conta dela também", afirma.

Bastante frustrada com a situação, além do lado emocional, Monken contabiliza prejuízo financeiro. "Afetou financeiramente, pois gasto $1.700 dólares/mês com aluguel, Comcast e FPL. Isso em reais é em torno de R$ 10 mil reais!", relata.

Questionada sobre ir para o México e de lá entrar nos EUA, ela conta que acha arriscado e disse que um amigo tentou, mas pediram uma carta do consulado para ele poder ficar no México, como não tinha, teve que voltar.

"No meu caso, acho que um teste constando negativo, cartão de vacina em dia (inclusive da gripe), poderiam dar o direito de entrar no país, principalmente por ter um filho cidadão americano", finaliza.

Na quarta-feira, 22, Monken remarcou novamente a passagem para novembro. "Espero que até lá tenha acabado", salienta.

"Ou fecha para todo mundo ou para países que estão piores"

Deixar de ver a família no Brasil, cancelar passagem, adiar tratamento de saúde dos filhos foi o que aconteceu com a paranaense H.M. (nome não identificado a pedido), que mora em Orlando e é estudante de mestrado. Ela conta que o marido também tem o visto de estudante, mas trabalha no Brasil e precisa ir de vez em quando. "Ele foi em maio, mas logo depois veio a medida restringindo a entrada. Ele ficou 4 meses sem poder voltar, só conseguindo depois que fez a quarentena no México", conta.

Segundo a estudante, ela iria ao Brasil ver os pais já idosos e depois o irmão com a esposa e filhos voltaria junto e eles iriam fazer um passeio em família que estava marcado há mais de um ano. "Tá bem complicado. Tem muito tempo que não os vejo e tivemos que adiar os planos. Tenho também vários amigos que viriam e tiveram que cancelar a viagem ou fizeram a quarentena no México", relata.

"É complicado opinar, mas o fechamento de fronteira para países como o Brasil, onde a situação está menos pior do que aqui, não é justo. Ou você fecha para todo mundo ou você fecha para países que estão piores. O risco maior é da pessoa vir pra cá e pegar e não trazer a doença. Existem outras alternativas para monitorar isso, como testes rápidos e recentes na hora do embarque. Tem muita gente que está com a vida parada porque não pode vir, mas tem casa e bens parados aqui e fazem a economia girar e estão somando prejuízos", encerra.

"Todo mundo aguardando"

Com uma agência de turismo em Salvador (BA) voltada para passeios em Orlando, especialmente nos parques temáticos, a carioca Jaqueline Gois de Souza, viu seu negócio baixar muito nos últimos meses.

"A medida me afetou completamente porque eu trabalho exclusivamente com turismo em Orlando e eu não pude mais viajar. Fiquei em Orlando até junho e retornei. Além disso, o público também caiu bastante. Tive vários cancelamentos de viagens e muita gente que está esperando a fronteira reabrir para poder ir fazer compra ou passear de modo mais seguro", conta Souza, que gerencia a Planeje Orlando.

Souza conta que, desde março, o setor de turismo ficou muito ruim. "Não temos mais o salário como era antes. O dinheiro não está entrando em caixa porque as pessoas ficaram impossibilitadas de viajar. Inclusive com reembolso de 100% de clientes que já haviam pago, devolvendo até mesmo a comissão que já tinha recebido. Agora, só estamos aguardando liberar", finaliza.

O que dizem as autoridades 

Em contato com o Itamaraty em agosto, o Gazeta News foi informado pelo órgão que "o governo brasileiro está em permanente contato com as autoridades norte-americanas em busca de soluções para esses e outros casos decorrentes de restrições migratórias e sanitárias impostas durante a pandemia de COVID-19. É necessário, porém, compreender que, em todo o mundo, a autorização de ingresso em território de país estrangeiro é competência exclusiva e soberana das autoridades imigratórias do respectivo país".

No início desta semana, o GN entrou em contato novamente com o órgão que respondeu que mantém contato com as autoridades americanas, "mas a autorização de ingresso em território de país estrangeiro é, contudo, competência exclusiva e soberana das autoridades imigratórias de cada país."

O Consulado-Geral do Brasil em Miami também foi procurado e disse que não há nenhuma informação nova a respeito do assunto.

O embaixador brasileiro em Washington, Nestor Forster, disse na última terça-feira,20, que o fim da restrição de entrada de viajantes do Brasil nos EUA depende da redução da pandemia de coronavírus no Brasil.

"Essas medidas devem ser abrandadas assim que os números no Brasil melhorarem", disse Forster, em entrevista a correspondentes brasileiros nos EUA. "Não é uma decisão política de amizade com esse ou aquele país. É levada em conta a evolução do quadro geral da pandemia."

Dessa forma, brasileiros contabilizam seus prejuízos tanto financeiros quanto emocionais. Seja trabalho perdido ou reencontro com familiares que não aconteceu este ano, a restrição tem trazido dor de cabeça para muita gente.