"Não tenha medo de fazer a coisa certa", pede brasileira que salvou criança de abusos em Orlando

Por Arlaine Castro

Flaviane Carvalho usou um bilhete para se comunicar com a criança.

No primeiro dia de 2021, Flaviane Carvalho estaria de folga. Mas ela precisou ir trabalhar e nem imaginava que seria um "anjo" ao salvar um garoto de 11 anos que sofria abusos e maus-tratos do padrasto.

Gerente do restaurante brasileiro Mrs. Potato em Orlando, Flaviane disse que "foi das mãos de Deus" ela estar no momento certo e na hora certa para ajudar o garoto. A família estava sentada em uma mesa e ela percebeu que somente o garoto não estava comendo nada. Além disso, era o único que também não conversava, não falava e não parecia alegre como as outras crianças na mesa.

Ela disse que, quando perguntou se havia algo de errado com a comida, o padrasto, Timothy Wilson II, disse que o menino iria jantar em casa mais tarde.

Foi quando ela notou hematomas no rosto e nos braços do menino. "Pude ver que ele tinha um grande arranhão entre as sobrancelhas. Alguns minutos depois, vi um hematoma no lado do olho. Então, senti que havia algo realmente errado".

Ela então escreveu um bilhete perguntando se o menino precisava de ajuda e esperou a resposta. Quando ele fez que sim com a cabeça, ela chamou a polícia.

Em entrevista especial ao Gazeta News, Flaviane, que é natural de Goiânia e mora nos EUA há 13 anos, contou detalhes, falou sobre a importância das pessoas se preocuparem com seus semelhantes e mandou um recado para a comunidade brasileira.

Gazeta News - O que passou pela sua cabeça ao perceber que se tratava de uma criança numa situação de violência?

Flaviane Carvalho - Só me passava que eu tinha que ajudar aquela criança, que eu tinha que fazer alguma coisa para tirá-lo daquela situação, que eu não podia ficar quieta. Como uma mãe deixa o padrasto fazer o que fez com o filho, como que ninguém percebeu isso antes. Ele era torturado, ele realmente estava correndo risco de vida. Mas graças a Deus, os dois, tanto o homem quanto a mulher estão presos agora. Acho que não dá pra chamar de mãe ou pai quem faz uma coisa dessa. Vão ficar por muitos anos e o menino está bem. Isso que importa.

GN - Quanto tempo durou desde o momento em que percebeu e até terminar tudo, até a polícia chegar?

FC -Acredito que do momento em que eu percebi e até a polícia chegar foi em torno de 1 hora, 40 minutos.

GN- Já passou por alguma situação parecida antes?

FC -Nunca passei como situação como essa. Foi a primeira. Já aconteceu de eu chamar a polícia algumas outras vezes, mas para ajudar pessoas em outras situações, como por exemplo, um bêbado que estava cambaleando pela rua, para avisar sobre um acidente que eu tinha acabado de presenciar, coisas desse tipo.

GN- Que aprendizado você tira dessa experiência pessoal?

FC- De que a gente nunca erra em querer ajudar o próximo. A gente nunca erra em querer ajudar alguém a sair de uma situação de perigo, de risco. É melhor errar, pecar pelo excesso, por uma preocupação que não tem fundamento e ter que pedir desculpa para a pessoa que eu exagerei do que não fazer nada e dormir com a culpa de que eu poderia ter feito algo para ajudar alguém e não fiz nada, me calei, fui omissa.

GN- Quase 700 mil crianças sofrem abusos nos EUA a cada ano, segundo a National Children Alliance org. Como você acha que esse número pode diminuir?

FC - Esse número pode diminuir com alguma atitudes, como por exemplo, de as pessoas se importarem sim umas com as outras, de quererem fazer o bem, de observarem as situações. Acho que quando se trata de um ser humano, principalmente criança, cada um tem a obrigação sim de prestar atenção, de fazer tudo o que puder para ajudar, mesmo que isso signifique interferir. Eu não falo em bisbilhotar ou ser inconveniente, mas no cuidado, no amor ao próximo, de ter um olhar de carinho, de atenção.

Outra forma de diminuir a violência contra as crianças é prestar atenção nos pais. Infelizmente, hoje a gente vê muitas famílias desestruturadas, pais desestruturados, que muitas vezes vieram de uma situação de abuso na própria infância. Então, é questão de educação, de saúde, de Deus, acho que engloba tudo. Deus é amor e a pessoa quando ela conhece o amor, ela conhece a Deus, dificilmente ela vai abusar de alguém.

 

GN- Qual sua mensagem para a comunidade brasileira?

FC- Não se deixe prender, se você pode fazer alguma coisa, faça. Não titubeie, chame a polícia, chame algum órgão de proteção à criança, mas faça alguma coisa. Não tenha medo de fazer a coisa certa. Quero ressaltar que meu objetivo ao falar sobre o ocorrido é servir de alerta e exemplo para que as pessoas não deixem de denunciar, de ajudar alguém.

GN- Sua atitude foi louvável e digna de orgulho para os brasileiros que moram tanto na Flórida quanto em outros estados nos EUA. Disseram até que você merece ganhar a cidadania. Há essa real possibilidade? Foi falado isso pelas autoridades?

FC- Não sei dessa possibilidade e também não procurei. Acho que esse não é o ponto. O principal é que através do que aconteceu, a vida de uma criança foi salva, uma criança teve a oportunidade de ter uma vida melhor, de ter uma vida normal porque a situação em que ela vivia era muito triste.

 

*O casal tinha outros filhos menores que agora estão também sob os cuidados do Departamento de Crianças e Família da Flórida.

Se você suspeitar que uma criança está sendo abusada ou negligenciada, ligue para 1-800-649-5285 para denunciar - 24 horas por dia, 7 dias por semana. Se uma criança estiver em perigo imediato, ligue primeiro para o 911 ou para a polícia local.

Acesse https://www.myflfamilies.com/service-programs/abuse-hotline/ para fazer uma denúncia online.

Flaviane Carvalho - Flaviane Carvalho e a proprietária do Mrs. Potato

Flaviane Carvalho - Flaviane Carvalho e a proprietária do Mrs. Potato