Flórida debate o direito ao aborto – brasileiras da comunidade opinam

Programada para entrar em vigor em julho, nova lei que proíbe o aborto após 15 semanas enfrenta pedidos de bloqueio.

Por Arlaine Castro

Quase 80.000 mulheres fizeram abortos em 2021 na Flórida, informa a Florida Agency for Health Care Administration.

A decisão da Suprema Corte Federal de derrubar o direito constitucional das mulheres ao aborto, no histórico caso Roe v. Wade, de 1973, deu aos estados a abertura para restringir ou manter a proteção do direito de interrupção da gravidez.

Na Flórida, o debate sobre os direitos reprodutivos está concentrado em um tribunal de Tallahassee, que desde a segunda-feira, 27, discute pedidos de bloqueio da nova lei que proíbe o aborto após 15 semanas (com algumas exceções) sancionada pelo governador Ron DeSantis em abril e programada para entrar em vigor em 1º de julho.

O juiz do caso, John Cooper, disse que anunciará sua decisão na quinta-feira, 30, sobre a possibilidade de interromper a lei temporariamente à medida que o caso avança pelo sistema judicial.

Contra a nova lei, organizações como a Planned Parenthood of America, o Center for Reproductive Rights e a American Civil Liberties Union processaram o governo estadual pedindo à justiça seu bloqueio. Os grupos argumentam que a lei da Flórida que proíbe abortos após 15 semanas de gravidez sem exceções para estupro ou incesto viola o direito à privacidade consagrado na constituição do estado.

Quase 80.000 mulheres fizeram abortos no ano passado na Flórida de um dos 55 provedores. Isso inclui cerca de 5.000 mulheres de outros estados que viajaram para a Flórida e receberam o procedimento no estado.

Fatos da nova lei

- Abortos serão completamente proibidos após 15 semanas de gravidez, a menos que dois médicos certifiquem por escrito que interromper a gravidez é necessário para salvar a vida da mulher.

- Um provedor também pode realizar um aborto para evitar um sério risco de comprometimento físico substancial e irreversível de uma função corporal importante da mulher “que não seja psicológica”, ou se o feto não tiver alcançado a viabilidade.

- Antes de um aborto, em caso de menor de idade, os pais ou responsáveis devem ser notificados primeiro.

- A nova lei se aplica a mulheres que desejam financiar publicamente os custos do aborto e mulheres que usam o Affordable Care Act para obter assistência. As mulheres que pagam mais para ter benefícios adicionais em seu plano de saúde são uma exceção a essa regra. Caso contrário, os abortos devem ser pagos sem assistência financeira. Os abortos podem custar até milhares de dólares, dependendo de quão avançado está o desenvolvimento fetal e do tipo de procedimento.

Comunidade brasileira

Como é um assunto polêmico porque envolve decisão pessoal, mas também importante e que impacta a vida de brasileiras e outras mulheres no geral, o Gazeta News pediu opinião de brasileiros atuantes da comunidade no estado sobre a decisão da Suprema Corte e a nova lei da Flórida.

“A reversão da lei baseada no caso Roe vs Wade serviu para mostrar a nós, mulheres, o quanto ainda somos muito frágeis. Do contrário, a sociedade estaria priorizando outras discussões em suas cortes. Se alguns (muitos) são realmente a favor da vida, por que escolheram desenterrar uma lei que foi aprovada há 49 anos ao invés de outra que foi aprovada recentemente e que liberou a venda indiscriminada de armas, as mesmas armas que agora são usadas por doentes mentais que matam crianças nas escolas? O futuro nos reserva surpresas ainda mais desagradáveis, já que o nosso ativismo se limita a escolher mandatários que apontam juízes que são aprovados por bancadas movidas apenas por dinheiro e poder”, salienta Vera Schäfer, diretora do Rotary Boca Raton West, BBG - Brazilian Business Group e da Fundação Vamos Falar Português, e fundadora do Brasileirinho.com.

“Eu acho essa nova lei uma derrota para todas as mulheres. Tenho minhas questões pessoais e profissionais contra ela, mas resumo da seguinte maneira: Como vão fazer as mulheres que descobrem com 20 semanas que o seu feto está malformado ou tem uma doença genética? Como vão reagir aquelas que são agredidas sexualmente, e depois do estupro descobrem que o estuprador a engravidou? Como vão fazer aquelas outras que finalmente decidiram deixar os seus companheiros abusivos, e agora descobriram que estão grávidas dele? Como vão reagir as adolescentes que estavam transando com seus namorados mas a camisinha rompeu, e agora ela não sabe se deve ser apenas uma adolescente ou uma mãe adolescente? Como fazem as outras mulheres que não podem física, emocional ou financeiramente terem mais um filho? Como faz a menina de 11 anos e sua família ao descobrirem que uma pessoa da família na qual ela confiava a engravidou? E por aí vai! Não sou pró-aborto, mas sou pró escolha e pró- vida. E principalmente a vida das mulheres, que são tão massacradas por essa cultura opressora machista”, ressalta a psicóloga Karina Chernacov.

“Vivemos a era da informação e do acesso ao conhecimento científico. A consequência natural é repensarmos muitos conceitos, um deles é o conceito de ser vivente. Quando é que estabelecemos que dentro do útero a vida se inicia? A nova Lei, que proíbe o aborto na Flórida após 15 semanas é um ato a favor da vida em formação, protege o direito à vida e possibilita esse novo ser vivente ter o direito a sua própria existência. Na Flórida, não foram abertas muitas exceções, permanecendo duas, no caso de risco à vida da mãe ou no caso de a criança estar com o risco de uma doença fatal. Deixando de fora o direito ao aborto por gestações que ocorreram por abuso sexual. A nova Lei não é um retrocesso aos Direitos da Mulher, a Lei tira das mãos das pessoas o poder de decisão de quem mereça viver ou não. Estabelece o maior direito que todos nós possuímos, o Direito à Vida. A lei julga a favor da vida dessa criança que dentro do útero, possui o direito de se defender, mas não tem sua voz ouvida, a lei lhe assegura esse direito, o direito de nascer”, opina Naides Brum, Conselheira da organização cristã sem fins lucrativos House of Protection e diretora do programa de atendimento emocional a falantes de Língua Portuguesa no Sul da Flórida.