E A NAÇÃO SEGUE (MUITO) DIVIDIDA

"A América foi brutalmente dividida desde sempre e o que acalma os ânimos de tempos em tempos é a riqueza geral e a sensação de privilégio e bem estar."

Por POR | CARLOS BORGES

Escrevo este editorial para o Grupo Gazeta, a convite da Editora-Chefe Fernanda Cirino, em meio a sentimentos confusos. Não sabemos, com precisão, qual o resultado e oficial das eleições norte-americanas deste ano, até o fechamento desta edição. Não apenas as atuais margens de vitória previstas para Joe Biden são muito pequenas, mas também o arrastão de processos, recontagens e outros recursos jurídicos que Donald Trump tem à mão, nos indicam que, com certeza mesmo, talvez só tenhamos um novo (ou velho) presidente lá para meados de dezembro.

Algumas lições, entretanto, já podem ser tiradas, independente de quem seja declarado vencedor. Seja ele o presidente ou não, eu sempre achei Joe Biden a escolha mais frágil no âmbito dos Democratas para enfrentar um personagem galvanizador e incendiário como Trump. Não importa qual seja o perfil dos que adoram e seguem Trump, o fato é que o atual presidente tem essa capacidade de apaixonar seus seguidores, mesmo que eles não parem um minuto para refletir sobre as reais motivações por trás de tal paixão.

Isso me faz crer que Joe Biden, com certeza, não terá capacidade de "unir" um país que sempre foi desunido e até teve uma sangrenta Guerra Civil para que uma parte "progressista" impusesse sua vontade sobre outra parte "escravagista". A América foi brutalmente dividida desde sempre e o que acalma os ânimos de tempos em tempos, é a riqueza geral e a sensação de privilégio e bem estar que a grande maioria dos norte-americanos sempre sentiram.

O "mapa" dessas eleições revela uma acentuação ainda maior dessa bipolaridade. Se antes era uma divisão entre estados azuis e estados vermelhos, agora há a divisão entre porções azuis e vermelhas dentro da maioria dos estados.

Ainda que perca a eleição, Trump sai, na minha opinião, fortalecido. Mais ainda a ideia do "Trumpismo", que é alçado à condição de "Partido" dentro do Partido Republicano. Que ninguém se surpreenda se Donald Trump "culpar" o Partido Republicano por sua eventual derrota e usar esse discurso de "traição" como trampolim para o seu mais sonhado projeto: seu próprio Partido o "MAG" (Make America Great), no qual ele seria senhor absoluto. Aliás, ser senhor absoluto das situações é um desejo nunca disfarçado por ele.

A "outra" eleição, que temos ainda não esteja completamente resolvida, aponta para um quadro ainda mais complexo. Um "empate" de cadeiras no Senado, que faria da Vice-Presidente Kamala Harris ou do Vide Presidente Mike Pence, o "Voto de Minerva". Caso a vitória de Biden seja confirmada e o empate no Senado sacramentado, teremos um governo democrata com maioria total, no Executivo, Senado e Câmara de Representantes. Isso dá uma certa tranquilidade para Biden tentar reconstruir parte do que Trump implodiu. Mas com uma Suprema Corte com 6 conservadores x 3 progressistas, o impasse segue vivo.

Sacudida por racismo, violência, economia claudicante e uma devastadora pandemia, a nação Norte-Americana teria razões de sobra para ter derrotado Trump de forma inequívoca. Por que não o fez? Por pura e simples competência dos articuladores políticos "trompistas"? Ou será que esta mesma sociedade há muito já não "cabe" no modelo político que lhe é oferecido há quase 240 anos?

Há uma mescla de entusiasmo e cansaço, esperança e frustração para muitos que desejavam um país definitivamente pendente para um lado ou para o outro. Mas o fato é que seguiremos tendo um país inflamado pela intolerância e consumido por ignorância e medo.

Nessa eleição que está longe de acabar, o mais significativo é saber como Donald Trump irá utilizar seu capital político.