Brasil volta a ser o epicentro global da Covid-19

Essa aceleração foi construída pouco a pouco desde dezembro de 2020, quando as festas de fim de ano tiveram muita aglomeração. Como se não bastasse, em fevereiro, teve quem decidisse aproveitar o carnaval.

Por POR | ARLAINE CASTRO

O Brasil voltou a ser o epicentro global da Covid-19 - o país já tinha ocupado esse posto em maio do ano passado, apesar de ter tido tempo para se preparar para a chegada da pandemia por aqui. Agora, o aumento na quantidade de novas infecções e de mortes é um dos principais motivos: ambos os índices cresceram muitos nas últimas semanas.

Essa aceleração foi construída pouco a pouco desde dezembro de 2020, quando as festas de fim de ano tiveram muita aglomeração. Como se não bastasse, em fevereiro, teve quem decidisse aproveitar o carnaval. Essas ações intensificaram o espalhamento da variante brasileira P.1 - descoberta em Manaus, ela é mais transmissível do que o novo coronavírus original e as mutações anteriores.

Esses fatores fizeram o Brasil ter, na semana passada, um recorde de novos infectados em 24 horas. Foi na quarta-feira (17), quando 90.830 pacientes foram diagnosticados com Covid-19 em um único dia - o maior número diário desde o início da pandemia. Na mesma data, foram registradas 3.149 mortes pela doença - mais um recorde negativo. Além das festas de fim de ano e de carnaval, a adesão cada vez menor ao distanciamento social também contribui para a disseminação da doença.

Com o espalhamento descontrolado do novo coronavírus, o surgimento de novas cepas ganha força. Um exemplo de país que passou por isso é o Reino Unido, que viveu situação semelhante no fim de dezembro de 2020: uma nova linhagem do novo coronavírus começou a se alastrar mais rapidamente por lá e o número de casos diários passou dos 50 mil.

A solução adotada pelos britânicos foi o lockdown. E os resultados vieram. "Hoje, depois de mais de dois meses, com cerca de 30% da população vacinada, já há uma mudança significativa no cenário", comenta José Rocha, professor da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Por aqui, entretanto, a medida é evitada pela maioria dos governantes.

Cidades que adotaram o fechamento rígido das atividades conseguiram conter, ainda que de forma limitada, o avanço da contaminação. Só que essa solução pode ser inútil se adotada de forma errada. Na capital paulista, por exemplo, a prefeitura programou um superferiado para o fim de março. A ideia é manter os paulistanos em casa.

Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Brasil passa atualmente pelo maior colapso sanitário e hospitalar de sua história. Em todo o país, as taxas de ocupação de leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) no Sistema Único de Saúde (SUS) ultrapassam 80% - e os números aumentam diariamente. Na rede privada, a situação não é melhor: alguns hospitais particulares recorreram ao SUS em busca de leitos.

O colapso evitado em boa parte do Brasil com o distanciamento social no início da pandemia, em 2020, agora atinge o país de forma praticamente homogênea. "Em janeiro, falei para um amigo: Manaus é o Brasil amanhã. Era muito claro. Sem as medidas de restrição, não há como controlar a disseminação da doença. Qualquer conduta diferente traz um agravamento do cenário", destaca Rocha, da PUC-PR.

A Fiocruz ressalta que, se na primeira onda foi possível remanejar pacientes para outras regiões, agora a doença cresce de forma simultânea no país. "Um dos efeitos diretos desse processo é a impossibilidade de remanejamento de pacientes não só para atendimento de Covid-19, mas para outras causas também", diz o relatório da entidade.

Com o sistema de saúde próximo do esgotamento, não é possível atender a todos os pacientes que precisam de cuidado médico especializado.

Texto: O Globo