Ataques soam como advertência ao mundo

"De fato, a democracia não se limita ao momento do voto. Ela se manifesta, também, no respeito aos direitos fundamentais de todos, inclusive das minorias."

Por POR | ARLAINE CASTRO

Os ataques em Brasília continuam recebendo ampla cobertura na imprensa internacional. Nos veículos de comunicação franceses, os principais programas de debates na televisão, tanto em canais da TV aberta quanto a cabo, entrevistaram analistas sobre a depredação nas sedes dos Três Poderes em Brasília.

Na opinião de vários especialistas, as imagens chocantes de manifestantes tiveram o objetivo de abalar os alicerces da democracia brasileira e transmitir a imagem de que o sistema democrático pode ser vilipendiado. Três jornais - Libération, Le Monde e La Croix - chegaram às bancas na terça-feira (10) chamando a atenção para a fragilidade da democracia brasileira.

O portal de notícias France Info, o maior do país, entrevista um especialista que monitora redes conspiracionistas em vários países, uma das "armas" dos movimentos de extrema direita fortalecidos nos últimos anos. Segundo o pesquisador Tristan Mendès France, colaborador do Observatório do Conspiracionismo, os golpistas de Brasília vivem de fato em uma "bolha", que foi continuamente alimentada pela retórica do ex-presidente Jair Bolsonaro contra as instituições, o voto eletrônico e a suposta ilegitimidade do sistema eleitoral brasileiro.

O francês ressalta que militares próximos de Bolsonaro deram eco a essa narrativa, incorporando teses conspiratórias surgidas nos Estados Unidos, no movimento QAnon, muito popular entre os apoiadores de Donald Trump. Uma delas foi vista em uma enorme faixa que os vândalos abriram no Congresso, na qual lia-se a frase em inglês "We want the source code", queremos o código-fonte em português, uma mentira disseminada nas redes bolsonaristas depois da vitória de Lula.

Essa fake news faz parte do manual do "complotismo eleitoral" que prega o combate às "elites globalistas", com o pretexto de que elas teriam uma agenda para destruir as soberanias nacionais e estabelecer uma nova ordem mundial. São pessoas que vivem num mundo paralelo e veem os militares como os únicos capazes de salvá-los, explicou o pesquisador francês.

O jornal Le Monde acompanhou uma manifestação de apoio à democracia na Cinelândia, na noite de segunda-feira, no Rio de Janeiro. Milhares de brasileiros enfrentaram chuva forte para pedir a prisão de Bolsonaro e a revogação da lei da Anistia. Um professor de história disse à reportagem que estava lá para lembrar que o terrorismo foi uma das estratégias de conquista do poder do fascismo, desde os tempos do ditador italiano Benito Mussolini e dos nazistas na Alemanha.

Já o Libération diz que diante da destruição em Brasília, Lula tem uma oportunidade única de enfraquecer a extrema direita. O petista, que tinha planejado manter uma certa tolerância em relação às Forças Armadas, tem o dever agora de afastar todos os militares pró-bolsonaristas de seu governo. "Ele sabe que nunca deverá baixar a guarda. E com ele, todos os chefes de Estado democratas e progressistas" do planeta.

O Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) diz que, de fato, a democracia não se limita ao momento do voto. Ela se manifesta, também, no respeito aos direitos fundamentais de todos, inclusive das minorias. Os derrotados no processo político majoritário não perdem a condição de sujeitos de direito e de participantes do processo político-social. Além disso, a democracia atual é feita de um debate público contínuo, que deve acompanhar as decisões políticas. Um debate aberto a todas as instâncias da sociedade, o que inclui movimento social, imprensa, universidades, sindicatos, associações, cidadãos comuns, autoridades etc.

Com referências de textos da RFI e CEBRI.