O Bypass Espiritual

Por Adriana Tanese Nogueira

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O bypass espiritual acontece quando a prática espiritual, no lugar de ajudar a integrar as limitações humanas, se torna um substituto para evitar enfrentar as questões psicológicas, relacionais ou concretas não resolvidas. Agostino Famlonga A religião, diz Ken Wilber, pensador e criador da Psicologia Integral, é “espiritualidade codificada”. Temos tantas religiões quantas formas de codificar a espiritualidade, dependendo do tempo histórico, da cultura e da realidade social dos grupos humanos que produzem uma certa religião. Como sabemos, ter uma espiritualidade não quer dizer aderir a uma religião. Há muitos caminhos para viver e desenvolver a espiritualidade tanto dentro das religiões como fora delas. E hoje, mais do que no passado, é possível encontrarmos opções criativas e inovadoras para descobrir a dimensão da espiritualidade. Entretanto, é preciso discernimento para que ao abraçar a espiritualidade não fujamos de nossa humanidade. Esta prática, muito difundida, é chamada de “Bypass Espiritual”. Bypass em inglês quer dizer contornar, desviar, evitar, buscar uma atalho. Um bypas espiritual ocorre quando a espiritualidade é buscada para evitar alguma outra coisa. Ela é usada como um mecanismo de defesa psicológico para desviar das questões atuais, pessoais e eminentemente psicológicas que nos perturbam. O bypass espiritual inibe o processo de crescimento tanto psicológico como verdadeiramente espiritual. Segundo o psicólogo Augusto Famlonga, tudo começa de uma sensação de carência e da busca por se sentir melhor e fazer algo para se sentir melhor. O passo seguinte é o de enveredar por um caminho interior de crescimento e de conscientização. Mas, nesta jornada a saída mais fácil é a de querer encontrar uma orientação de fora, que possa ter uma garantia soberana e absoluta, que possamos aplicar às nossas vidas sem necessariamente precisar investigar e explorar nossa interioridade. O caminho espiritual, assim, se perfila como o mais imediato. Esta é uma dinâmica comum e sutil, que permeia o comportamento de muitas pessoas bem-intencionadas e que por isso é difícil de reconhecer. Podemos definir o bypass espiritual como uma transcendência prematura: um querer se elevar acima de nossa humanidade, de nossa psicologia e de nossas questões íntimas e complexas, antes de ter integrado e conhecido esta mesma realidade interior. Portanto, o bypass espiritual corresponde ao uso, mais ou menos consciente, de ideias e práticas espirituais para evitar enfrentar os problemas psicológicos abertos, as questões emocionais não resolvidas, as feridas que não foram curadas e as etapas do desenvolvimento psico-social que não foram completadas. Este mecanismo pode ser observado por todo canto e se apresenta de muitas formas. Como sempre, conhecer o funcionamento dessas dinâmicas é o primeiro passo para ir além e abrir o caminho da própria evolução. A espiritualidade não pode ser reduzida a um “valium” metafísico-existencial. Espiritualidade não é para nos acalmar mas para nos impulsionar no caminho da evolução da consciência. Nesse sentido precisamos:
  1. Evitar criar separações entre verdades consideradas absolutas e verdades relativas, vinculadas ao nosso momento concreto de vida.
  2. Evitar criar um ego que se sente o dono da razão e representante das verdades absolutas na terra, porque assim nos desumanizamos e perdemos contato com os demais humanos que formam nossa família terrena.
  3. Explorar nossos processos psicológicos com os meios adequados para que então possamos desenvolver uma espiritualidade autêntica.
A espiritualidade deve brotar de dentro para fora para que seja libertadora. Somente assim, ela resplandece como um sol interior contribuindo positivamente não só para nossa vida como para aquela dos que nos rodeiam, sem que precisamos sequer verbalizar nossas crenças.