O Globo, a crise e os mitos

Por Gazeta Admininstrator

Muito tem se falado, desde novembro de 2007, na existência de um momento particularmente “crítico” para os imigrantes brasileiros que vivem nos Estados Unidos.

Tomando como base o retorno de brasileiros intimidados com a recessão econômica norte-americana ou cansados de esperar por uma solução imigratória que vem demorando muito mais do que se antecipava, reportagens na mídia impressa e TV têm tratado o assunto sob, o hoje costumeiro, foco do “sensacionalismo-quase-tragédia”.

A editoria de Economia do jornal “O Globo” , um dos mais importantes e influentes do Brasil, publicou, na semana passada, uma reportagem intitulada “Crise desespera brasileiros que vivem nos Estados Unidos”.

É mais uma abordagem que, levando em conta apenas situações setoriais e específicas de nossa comunidade, atinge de forma danosa toda a presença brasileira na América.

É preciso que nós, da imprensa comunitária brasileira nos Estados Unidos, nos posicionemos para esclarecer pontos que estão sendo até irresponsavelmente deixados de lado por órgãos de comunicação do Brasil, ao alardear uma onda que adoram classificar como “Pânico Brasileiro nos States”.

Por conta de atuarmos de forma intensa e direta com a comunidade brasileira em quase todo o território norte-americano, desde 1989, posso garantir que há uma dose imensa de exagero e desinformação em quase tudo que vem sendo publicado ou reportado acerca da “Crise que desespera brasileiros nos Estados Unidos”.

Da mesma forma que nos Estados Unidos persiste um enorme grau de desconhecimento do que é o Brasil, do que somos como Nação e Povo, da parte dos brasileiros que vivem no Brasil, e a imprensa apenas reflete ou corrobora esse pensamento, existe um abismo entre o que se pensa ou especula sobre os Estados Unidos, e o que eles realmente são.

Desde 1982, quando foram detectados os primeiro sinais de crescimento da saída de brasileiros para os Estados Unidos, ciclos se repetem. Momentos de explosão na chegada de imigrantes (legais e ilegais) se alternam com ciclos de retorno de segmentos que, por “ene” razões desistem de ficar. Perdem o interesse, não seguem dispostos a fazer sacrifícios ou simplesmentes não enxergam mais vantagem em tentar uma outra vida fora do Brasil.

Após o confisco da poupança promovido por Zélia Cardoso de Mello no governo Collor, houve uma explosão de brasileiros chegando. Com a paridade da moeda, grandes segmentos da comunidade optaram pelo retorno ao Brasil. A cada momento de “desânimo” vivido no Brasil, uma leva de brasileiros se aventura a sair. Ao primeiro sinal de que, no Brasil, as coisas estão “melhorando”, uma leva de brasileiros decide voltar.

O que a imprensa não fala - e porque talvez não tem nenhum interesse em fazer uma investigação a respeito - é que, apesar desse vai-e-vem, a quantidade de brasileiros que decide permanecer no país, desde 1982, não pára de crescer. Nunca parou.

Quem conhece o fenômeno migratório brasileiro para os Estados Unidos – e nós temos um longo e intenso trabalho dedicado a isso – sabe disso.

Devemos reconhecer que a “química explosiva” que resultou da combinação dos fatores recessão-ilegalidade-crise imobiliária-notícias positivas vindas do Brasil, exerceu e seguirá exercendo, por algum tempo, uma pressão “extra” na motivação para que muitos brasileiros decidam retornar.

Por isso, a percepção desse tão propalado “êxodo” aparenta ser extraordinariamente incomum. Uma consulta precisa, detalhada e sem nenhuma “fome de sensacionalismo” revelará que nenhum dado estatístico irá re-ferendar a tese do “desespero” e muito menos ainda a do “êxodo em massa”.

Quem prestar atenção, poderá conferir isso dentro de alguns meses.

Imediatismo nunca foi uma receita confiável para avaliar fenômenos sociológicos.

Por outro lado, a forma como setores da imprensa têm tratado o tema, como se fosse “a tragédia da semana”, tem prestado um grande desserviço aos brasileiros que vivem, residem, têm famílias e vivem nos Estados Unidos. A palavra espalhada de que estamos numa “crise” e vivendo um “êxodo em massa”, interrompe e estressa todo um processo econômico, social e cultural.

Enfim, já é tempo do Brasil (que como genialmente Jobim disse que, “não conhece o Brazil”) deixasse preconceitos e ressentimentos de lado e entendesse que somos todos brasileiros e que a realidade da comunidade brasileira nos Estados Unidos é irreversível.

Melhor entender e se beneficiar disso do que simplesmente tratar o assunto com leviandade.